Quando assumiu como CEO da Qualicorp, em novembro de 2019, o executivo Bruno Blatt tomou algumas decisões com o objetivo de modernizar as operações de uma empresa que já tinha 22 anos de mercado. Embora bem-sucedida do ponto de vista de geração de caixa, Blatt considerava que a companhia estava acomodada no quesito aquisições e ainda muito dependente de uma operação analógica. As mudanças foram radicais e imediatas. A principal delas – e talvez a mais difícil – foi trocar 60% da diretoria da empresa para oxigenar o mindset e incorporar novas estratégias ao negócio, principalmente àquelas voltadas para a digitalização. Agora, a Qualicorp anunciou um novo passo nessa jornada: a compra de uma fatia da startup de tecnologia Escale.

A negociação demorou quase um ano para ser finalizada e incluiu a compra de 35% da Escale Health, braço da startup focado no setor de saúde, e 5% da Quinhentos, holding que é dona da Escale Tecnologia e tem sede nos Estados Unidos. O investimento total é de R$ 132,6 milhões. Antes do acordo com a Qualicorp, a Escale já havia captado R$ 100 milhões de fundos internacionais, incluindo a Kaszek Ventures, Global Founders Capital (GFC) e Redpoint eventures.

O negócio faz sentido? A Qualicorp afirma que faz. A Escale utiliza a tecnologia e a análise de dados para atrair clientes com maior probabilidade de contratar uma assistência médica. Faz isso por meio de uma solução que usa modelos mais convencionais, como os adwords do Google, e um formato que chama de ativos digitais. São sites proprietários que oferecem, por exemplo, um comparativo de planos de saúde. O consumidor faz a busca e coloca alguns dados na plataforma que vão contribuir para uma recomendação mais direcionada. A Escale também desenvolve variações desses sites com foco em cada perfil de cliente. Há um voltado para o público com mais de 60 anos. Outro, para um consumidor jovem.

Essa tecnologia vai reforçar a atuação do time de vendas off-line, composto por 43 mil corretores parceiros que trabalham para a Qualicorp em um modelo de baseado em comissão. “Discutimos sobre o papel da Qualicorp do futuro. Decidimos inverter a lógica off-line e oferecer uma experiência digital desde a prospecção”, afirmou Elton Carluci, vice-presidente Comercial, de Inovação e Novos Negócios.

As próximas movimentações da Qualicorp já estão desenhadas. Além das grandes operadoras de saúde, como Bradesco, SulAmérica e Amil, nos últimos meses a empresa fechou parcerias com outras companhias regionais, como a Samp, do Espírito Santo, e a CCG, que atua em Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Agora, são 102 operadoras dentro do ecossistema da Qualicorp. O objetivo é diversificar o portfólio de produtos e oferecer opções específicas, com preços variados. “Mais da metade dos produtos disponíveis hoje foram lançados no último ano ou são versões renovadas”, afirmou Carlucci. Dentre os lançamentos está um plano com seguro contra desemprego, feito em parceria com a SulAmérica, que garante a manutenção do contrato por seis meses em caso de demissão ou perda de renda por autônomos.

Até o final do ano, a empresa também vai lançar um aplicativo que funcionará como um marketplace para esses novos produtos, que devem incluir ainda opções com foco em PMEs e seguros atrelados à contratação de um plano de assistência médica. “Queremos ser o maior hub de distribuição de produtos que dê acesso à saúde privada”, afirmou Blatt. “E nosso aplicativo será o one stop shop para planos de saúde.”

MERCADO Conhecida principalmente pelos planos coletivos por adesão, a Qualicorp pretende manter o foco nesse tipo de contratação, em que profissionais se reúnem, por meio de entidades de classe, e têm acesso a negociações com valores específicos. Dos 47,6 milhões de brasileiros que têm planos de saúde privados, apenas 6,3 milhões fazem parte do modelo coletivo.

Nesse cenário, a Qualicorp tem um papel relevante. Do total de 2,6 milhões de clientes da empresa, 1,5 milhão aderiram ao formato. “O segmento de planos coletivos por adesão tem um grande potencial para crescer”, afirmou Jeff Plentz, presidente do fundo Tech- tools Ventures, focado em empresas de saúde. “Mas a briga será acirrada, e essa disputa será feita no campo da tecnologia.”