Para quem milita em comunicação, o Brasil tem sido um enorme laboratório para profissionais que estudam jornalismo corporativo e um dos seus mais importantes capítulos, o gerenciamento de crise. Em escala global, embora com impacto também local, tivemos há pouco o episódio das baterias de um modelo específico de smartphone da coreana Samsung. Ou o emblemático caso da Odebrecht, para citar somente alguns. Na sexta-feira, 17, o País foi sacudido com a denúncia de que dois dos principais fornecedores de proteína animal do planeta – a JBS e a BRF – estavam envolvidos em malversações.

Notícias que colocavam em xeque a qualidade de seus produtos em um submundo de denúncias. Abstraindo-se o mérito da súbita ação da Polícia Federal e as razões que as motivaram, quais foram os supostos erros cometidos por ambas companhias em sua comunicação, na tentativa de reverter ou ao menos minimizar o problema? Neurolínguística aplicada, vamos a eles:

War Room – A reação sugere que as empresas não dispunham de informações críveis para reagir com rapidez. Grandes conglomerados, no Brasil e exterior, têm manuais de procedimento em casos como esses. Um passo a passo de como agir, quem acionar e estratégias já preconcebidas. Os manuais de trabalho americanos, que são bons nisto, elegem o que se chama de Sala de Guerra (War Room) em campanhas políticas e gerenciamento de crise. Basicamente é o confinamento de todos os envolvidos na crise, em um espaço físico comum, para responder ao tiroteio. Há talvez uma explicação para este fenômeno. São duas holdings, muitas empresas, cada qual com diretores de comunicação e marketing. Não se imaginava um problema tão colossal, que colocasse em xeque todas elas. E ao mesmo tempo.

One Voice (Uma só Voz) – Em crises deste naipe é preciso eleger uma só voz (one voice, no jargão americano). Um rosto, uma cara. Alguém que vá a público esclarecer tudo o que preciso e com a mais profunda transparência. Os demais, segundo os manuais de comunicação corporativa, calam-se. É assim no mundo todo.

Na ausência dessa “voz” e a comunicação reacional feita por comunicados, abre-se o flanco para qualquer tipo de informação de analistas e consultores. O raciocínio é lógico: se a Polícia Federal fala e a empresa se comunica tardiamente com notas oficiais, há um óbvio descompasso informativo desfavorável às empresas.

Garotos propaganda – No imaginário coletivo, a cara da Friboi, Seara e outras empresas do gênero tinha rosto: Tony Ramos, Fátima Bernardes e Roberto Carlos. Todos contratados em algum momento como garotos-propaganda das marcas. O que fazer? O conceito de one voice novamente. Um simples telefonema para estes personagens informando que aguardassem para se manifestar, afinal tinham sido pagos, e bem, para representar a marca.

Mídias Sociais – Com uma comunicação tardia, o efeito nas redes sociais não demorou. Uma estratégia seria assimilar o golpe, embora algo pudesse ter sido feito. Usar canais como Facebook, Instagram entre outros para se comunicar, além do óbvio que era monitorar com precisão cirúrgica de onde brotavam as críticas e “memes”. Lembrando que reagir em mídia social é sempre um risco, mas que pode e deve ser calculado.

Adotou-se inicialmente outro caminho, o de comunicados por vezes confusos e não esclarecedores em mídia paga de TV aberta e jornais e revista. O ponto chave é que a dúvida do consumidor persistia: quais produtos foram afetados e qual o compromisso da companhia em retirá-los de circulação?

Em 1982, um caso emblemático nos Estados Unidos tornou-se um caso de comunicação: o do Tylenol, da Johnson&Jonhson. Em setembro daquele ano, sete pessoas morreram no subúrbio da cidade de Chicago após ingerirem cápsulas do produto Tylenol extra forte. A solução foi transparência com a mídia e assumir os erros quando constatados. O resultado foi que a marca, em vez cair em descrédito, ganhou a confiança do consumidor americano.