Coube ao Brasil, ao menos uma vez em sua história, o papel de noiva cobiçada por mais de um pretendente. Nos anos 1940, por exemplo, o então presidente Getúlio Vargas mostrou astúcia ao perceber esse apelo, em plena Segunda Guerra Mundial, quando os países do Eixo e os Aliados cooptavam apoio militar e político para fortalecer suas posições no conflito. 

 

Vargas fez um jogo sinuoso, ao dar-se conta do papel estratégico do País como base para os dois lados. Negociou ora com a Alemanha, ora com os Estados Unidos, barganhando, em troca, recursos estrangeiros para industrializar o Brasil. 

 

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Foi assim que o governo brasileiro chegou a firmar posição pelos Aliados e obteve o patrocínio do presidente Franklin Roosevelt para construir a primeira estatal de siderurgia do País, a Companhia Siderúrgica Nacional, hoje conhecida como CSN, privatizada na década de 1990. Em troca, o Nordeste tornou-se base das tropas aliadas e os soldados brasileiros seguiram para os campos de batalha na Europa.

 

Hoje o Brasil se encontra novamente entre dois pretendentes de peso. Mas, felizmente, num cenário bem menos beligerante do que a primeira metade do século passado. As maiores economias do globo, Estados Unidos e China, pretendem aprofundar relações bilaterais com o País, em troca de participar do crescimento da economia brasileira e de explorar recursos naturais valiosos, como as commodities agrícolas e o petróleo do pré-sal. 

 

Os mais de 20 acordos bilaterais firmados em Pequim pela presidente Dilma Roussef, há duas semanas, tornam explícita a intenção da China de ficar (ainda mais) perto do Brasil. 

 

Os Estados Unidos já haviam feito uma jogada ensaiada, com a visita do presidente  Barack Obama, em março, quando deixaram registrada, em verso e prosa, a agenda econômica pretendida pelo governo americano. 

 

No meio desse xadrez, o Brasil tem chances de executar uma partida decisiva com os dois países e, nesse sentido, há algo a aprender com a era Vargas. 

 

Naquele tempo, o presidente do Estado Novo jogou a estratégia do tudo ou nada, e a mudança que se seguiu após a guerra torna isso evidente. Investir em siderurgia não era simplesmente uma decisão de garantir capital estrangeiro. A CSN é considerada por historiadores um marco da revolução industrial brasileira.

 

Essa revolução industrial, é certo, chegou com um atraso de mais de um século em relação à europeia. A boa notícia é que o Brasil tem chances,  agora, de recuperar o que perdeu ao não investir numa indústria forte de base tecnológica,  no passado. 

 

De nada vale que empresas como a taiwanesa Foxconn se instalem aqui, se o País se contentar em desempenhar apenas o papel de montador de tablets. 

 

Investimentos vultosos, como os US$ 12 bilhões anunciados pela empresa chinesa, chamam a atenção num primeiro momento, mas num segundo olhar podem ser perigosos, alerta Luis Afonso Lima, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos das Empresas Transnacionais e Globalização (Sobeet). 

 

“O Brasil precisa fazer uma opção clara por desenvolver a indústria local”, diz Lima. “Caso contrário, vamos aumentar a importação de componentes e desequilibrar a balança comercial.” Comprometer o Brasil com o desenvolvimento, por outro lado, pode ser um forte indutor para dar novas bases à educação e à tão sonhada competitividade, de que a indústria atual carece.