24/02/2018 - 9:00
O economista Armando Castelar, coordenador de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), avalia que a decisão da Fitch de rebaixar a nota de crédito do Brasil não deve trazer impactos no curto prazo. Para ele, porém, o País enfrenta situação fiscal complicada: sem a reforma da Previdência, deve ter dificuldade em cumprir a regra do teto de gastos – que limita o aumento dos desembolsos à inflação do ano anterior. “O governo vai ter problema para acomodar outras despesas do Orçamento”, afirma. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como avalia o novo rebaixamento da nota de crédito brasileira?
A Fitch tinha perspectiva negativa e havia avisado que a reforma da Previdência era uma das condições para não rebaixar a nota do Brasil. Os argumentos da agência e a decisão foram consistentes. Este governo não vai fazer a reforma da Previdência. Se havia dúvidas, agora não há mais. E tudo isso atrapalha porque a Previdência é o maior gasto do governo federal e cresce num ritmo muito forte.
Qual será o impacto do rebaixamento?
No curto prazo o impacto é pequeno porque o custo de financiamento externo das empresas não se altera muito. Obviamente as empresas têm mais dificuldade,
mas o mercado está com muita demanda por ativos de emergentes. Agora, o que está por trás em si da decisão é preocupante.
A postergação da reforma deve atrapalhar o cumprimento do teto dos gastos, por exemplo?
Pela Emenda Constitucional 95 (que limitou os gastos), o governo vai ter problema para acomodar outras despesas do Orçamento. Já está discutindo também a questão da regra de ouro (que impede a emissão de dívida para o pagamento de despesas correntes, como salários). A situação fiscal é complicadíssima e não fazer a reforma da Previdência, além da pressão sobre o total de gastos, vai criar um problema na composição (dos gastos).
A Fitch cita a incerteza do quadro eleitoral deste ano. Como analisa essa preocupação?
A decisão não foi por causa da situação política, porque ela não mudou muito. Mas, sem dúvida, continua incerta. A tendência é um candidato de centro ou centro-direita vencer a eleição, a despeito da popularidade dos candidatos na extrema-esquerda e extrema-direita. Mas, se tivesse um candidato a esta altura já despontando, um candidato comprometido com a reforma da Previdência, talvez esse downgrade não tivesse ocorrido.
O sr. vê mais algum movimento das agências de classificação?
Acho que não deve haver mais nenhum movimento neste ano. Primeiro, porque a Fitch colocou o País com rating estável. Normalmente, primeiro teria de mudar a perspectiva (para negativa) e depois alterar a nota. Segundo, porque não espero nenhum fato novo. A grande expectativa é de qual vai ser o próximo governo, e estamos a sete meses para ter uma ideia melhor sobre isso. É um intervalo curto. Não acho que vai ter nenhum fato para uma mudança.
Haverá uma pressão para que o próximo governo apresente o quanto antes sua proposta para a questão da Previdência?
Acho que não vai ter pressão do mercado para que em janeiro o novo governo já tenha proposta para a Previdência. Agora, de novo, tem a questão do teto, que fica complicada sem a reforma. E o primeiro ano de mandato é a janela de oportunidade do novo governo. No ano seguinte vai ter a eleição municipal. Começa todo o ciclo eleitoral de novo. Como a Previdência é a maior despesa do governo, faz sentido que seja prioridade, se o governo quer ter perspectiva mais longa de que a economia vai continuar crescendo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.