04/01/2021 - 11:44
O surgimento no Reino Unido e na África do Sul de diferentes variantes do vírus SARS-CoV-2 preocupa a comunidade internacional já que, segundo os primeiros dados, são mais contagiosas.
– O que são essas variantes?
Todos os vírus sofrem mutações, ou seja, se modificam quando se replicam.
O SARS-CoV-2 já sofreu inúmeras variações desde sua aparição, mas geralmente sem consequências. No entanto, algumas mutações podem favorecer sua sobrevivência, por exemplo, se alcançarem um contágio maior.
A variante B.1.1.7, chamada agora VOC 202012/01, foi detectada em novembro no Reino Unido, após se desenvolver “provavelmente” em setembro no sudeste da Inglaterra, segundo o Imperial College de Londres.
Depois de se propagar rapidamente nesse país, a variante foi detectada em outras dezenas de países, dos Estados Unidos à Coreia do Sul, passando pela Índia, França e Dinamarca.
A maioria dos casos foram importados do Reino Unido, mas alguns não têm nenhuma relação comprovada com esse país, como é o caso da Dinamarca, com 86 pacientes identificados.
A variante 501.V2, agora predominante na África do Sul, foi detectada por lá em outubro e localizada em outros países como Reino Unido e França.
Segundo os especialistas, o número de casos de ambas as variantes está subestimado no momento.
As duas apresentam várias mutações das quais uma, a N501Y, afeta a proteína “spike” do coronavírus, uma ponta que serve para se prender ao receptor ACE2 das células humanas e penetrá-las.
Esta mutação aumenta as capacidades de adesão do vírus ao receptor ACE2. Embora “não exista nenhuma relação claramente estabelecida entre a adesão ao ACE2 e uma maior transmissão, é possível que exista”, de acordo com o Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças (ECDC).
– Mais transmissíveis?
Vários estudos científicos, baseados principalmente em análises de modelos e ainda não avaliados por outros especialistas de acordo com o protocolo científico, concluem que a variante britânica é muito mais transmissível, o que confirma a avaliação inicial do grupo de pesquisadores NERVTAG, que assessora o governo britânico e que estimou a diferença entre +50% e +70%.
Desta maneira, segundo os cálculos da London School of Hygiene and Tropical Medicine (LSHTM), a variante britânica seria entre 50-74% mais contagiosa. Para o Imperial College de Londres, que analisou milhares de genomas do vírus SARS-CoV-2, a capacidade de contágio é entre 50-75% maior e a taxa de reprodução (R) é de entre 0,4 e 0,7 maior que o vírus habitual.
As conclusões preliminares sobre a variante sul-africana também mostram uma maior transmissão, mas há menos dados disponíveis.
Na ausência de resultados conclusivos, alguns especialistas se mostram cautelosos.
“Temos que ser prudentes. A incidência é uma combinação de fatores que leva em conta as características do vírus, mas também as medidas de prevenção e de controle aplicadas” para combater a covid-19, indica à AFP Bruno Coignard, diretor de doenças infecciosas da agência de saúde francesa Santé Publique France.
– Mais perigosas?
“Nenhuma informação disponível indica que as infecções dessas cepas sejam mais graves”, diz o ECDC. Mas o risco “é alto em termos de hospitalizações e mortes”.
Além disso, “um maior contágio equivale eventualmente a uma incidência muito mais forte e, portanto, a uma pressão mais significativa sobre o sistema de saúde, mesmo que a letalidade (das variantes) seja a mesma”, segundo Coignard.
Uma variante do SARS-CoV-2 que fosse “50% mais transmissível representaria um problema maior que uma variante 50% mais mortal”, disse no Twitter o epidemiologista britânico Adam Kucharski, com base em uma evidência estatística: com uma taxa de reprodução de 1,1, uma taxa de mortalidade de 0,8% e 10.000 pessoas infectadas, em um mês haveria 129 mortes. Mas se a taxa de contágio aumentasse para 50%, o número de mortos aumentaria para 978.
Por outro lado, os primeiros estudos da variante britânica sugerem que ela é mais contagiosa do que a cepa habitual entre os jovens com menos de 20 anos, levantando a questão do fechamento de escolas.
O estudo da LSHTM estima, portanto, que as medidas tomadas em novembro durante o confinamento no Reino Unido não seriam eficazes para controlar a epidemia, a “menos que escolas, faculdades e universidades também fossem fechadas”.
– Afetam a eficácia das vacinas?
“Por enquanto, não possuímos informações suficientes para dizer” que essas variantes representam “um risco para a eficácia das vacinas”, estima o ECDC.
No entanto, com os dados disponíveis, “os especialistas acreditam que as vacinas atuais serão eficazes contra essas cepas”, declarou na quarta-feira Henry Walke, do Centro de Prevenção e Combate às Doenças dos Estados Unidos.
O laboratório alemão BioNTech, criador junto com a Pfizer da primeira vacina contra a covid-19 autorizada no mundo, garantiu que, caso necessário, poderia fornecer um novo produto em “seis semanas” para responder a uma mutação.
– Como enfrentar as variantes?
Como não é possível evitar a propagação dessas variantes, o objetivo é “atrasá-las” ao máximo, segundo Coignard.
O ECDC recomenda aos países afetados que tomem medidas semelhantes às do início da pandemia, como a limitação de viagens e os testes em pessoas procedentes de áreas de risco. Pede também o controle da incidência dessas variantes, multiplicando o sequenciamento dos vírus.
Alguns testes PCR também podem apontar a presença da variante britânica para seguir posteriormente ao sequenciamento da amostra, de acordo com o epidemiologista Arnaud Fontanet, membro do conselho científico que assessora o governo francês.
Individualmente, “devemos ser ainda mais rigorosos com as medidas de prevenção”, alerta o doutor Walke, em alusão à higiene das mãos, uso de máscaras, entre outras atitudes.