Trump ordena bombardeio de instalações nucleares do Irã. Entenda como ocorreu a operação, as armas empregadas, as reações e a origem do conflito.Os EUA realizaram neste fim de semana um ataque contra instalações nucleares do Irã, entrando diretamente na campanha militar que Israel vem executando contra o regime de Teerã desde a semana passada.

O ataque americano marcou uma nova escalada de tensão na região. O Irã confirmou que suas instalações foram atingidas, mas tentou minimizar os efeitos. Já o presidente Donald Trump afirmou que o ataque destruiu “completamente” três complexos nucleares e o Pentágono mostrou imagens de satélite que indicam danos.

O ataque também provocou reações internacionais, que variaram entre apoio, preocupação e condenação.

Veja o que se sabe sobre o ataque dos EUA:

Quais foram os alvos atacados?

O ataque foi anunciado por Trump na noite de sábado (21/06) em Washington, quando já era madrugada de domingo no Irã. Segundo anunciou o presidente americano, as forças dos EUA agiram contra três instalações nucleares iranianas: Fordo, Natanz e Isfahan.

As duas últimas já haviam sido alvo de ataques israelenses nos últimos dias, mas Fordo seguia aparentemente intacta até a intervenção americana, de acordo com a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Os olhos de estrategistas militares se concentravam especialmente em Fordo por causa da complexidade que um ataque militar ao local demandaria.

Construído sob o solo numa remota região montanhosa do Irã, Fordo era considerado impenetrável pelo aparato militar de Israel e especialistas apontavam que apenas os EUA contavam com uma bomba capaz de atingir a instalação.

Foi em Fordo que, em 2023, a AIEA anunciou ter encontrado partículas de urânio enriquecido a um grau de 83,7% de pureza – próximo dos 90% necessários ao desenvolvimento de armas nucleares.

Ao contrário das demais instalações, acredita-se que Fordo tenha sido construída 100 metros abaixo do solo, a partir de uma estrutura de túneis usados pela elite da Guarda Revolucionária Islâmica, pilar de sustentação do regime.

Ao menos 3 mil centrífugas de enriquecimento de urânio teriam sido dispostas no subterrâneo, distribuídas em dois túneis principais. Imagens de satélite mostraram que acima da superfície havia apenas um edifício de apoio e seis entradas subterrâneas. Embora Fordo fosse considerado um complexo menor do que Natanz, ele teria sido projetado para produzir graus mais puros de urânio, o que o tornava militarmente mais significativo.

Quais armas foram usadas?

No domingo, o comando das Forças Armadas dos EUA forneceu detalhes sobre o ataque, apontando que a operação ocorreu na madrugada de domingo no horário iraniano e empregou bombardeios estratégicos B-2 e dezenas de mísseis disparados a partir de submarinos. Trump disse que os americanos não sofreram nenhuma baixa durante a operação. Segundo o Pentágono, as defesas aéreas do Irã não parecem ter detectado a ofensiva.

No caso do ataque à instalação nuclear de Fordo, os EUA empregaram sete bombardeios B-2, que lançaram 14 bombas GBU-57, conhecida como “destruidora de bunkers”. Segundo o governo dos EUA, essa foi a primeira vez que a bomba foi usada em combate.

Além disso, dezenas de mísseis de cruzeiro Tomahawk foram lançados a partir de submarinos contra os complexos de Natanz e Isfahan.

As bombas GBU-57,, que existem apenas no arsenal dos EUA, pesam mais de 13 toneladas cada e só podem ser lançadas a partir dos bombardeios B-2, que tem capacidade stealth para diminuir a detecção por radar e podem percorrer 11 mil quilômetros sem reabastecimento – distância que pode ser aumentada ainda mais com reabastecimentos em pleno ar.

Ao longo da semana, especialistas apontaram que um eventual ataque poderia ser lançado a partir da base aérea de Diego Garcia, uma ilha remota do Oceano Índico, que faz parte da nação das Ilhas Maurício. No entanto, o Reino Unido, que administra a base em conjunto com os EUA, negou que os aviões tenham partido de lá.

Neste domingo, o Pentágono detalhou que os sete B-2s decolaram a partir de uma base no território continental dos EUA, percorrendo mais de dez mil quilômetros até o Irã e depois retornando.

Qual foi o resultado?

A mídia estatal do Irã tentou minimizar eventuais danos. O governo da Alemanha avaliou “que grande parte do programa nuclear iraniano foi afetada pelos ataques aéreos”.

Ao anunciar que havia ordenado o ataque, Trump disse que suas forças haviam “totalmente e completamente obliterado” as três instalações nucleares. Ele destacou a ação contra Fordo. “Uma carga completa de bombas foi lançada no local principal, Fordo”, disse Trump.

Já o comando das Forças Armadas dos EUA foi mais comedido nas afirmações. “Sei que os danos de batalha são de grande interesse. [A avaliação] dos danos finais de batalha levará algum tempo, mas as avaliações iniciais dos danos indicam que os três locais sofreram danos e destruição extremamente graves”, disse o general Dan Caine, chefe do Estado-Maior Conjunto dos EUA.

Os americanos também exibiram imagens de satélite que mostram seis enormes crateras na área montanhosa do complexo nuclear de Fordo.

As autoridades iranianas minimizaram a alegação, afirmando que os danos não foram decisivos e dizendo que não havia perigo para os moradores que vivem perto das instalações nucleares atingidas pelos ataques. A rede catariana Al Jazeera informou que uma autoridade iraniana disse que Fordo havia sido “evacuada há muito tempo e não sofreu nenhum dano irreversível”.

Nas horas seguintes ao ataque ao Irã, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) da ONU disse no que não detectou nenhum aumento nos níveis de radiação nas imediações das principais instalações nucleares.

O que Trump disse ao anunciar ataque?

“Nosso objetivo era destruir a capacidade de enriquecimento nuclear do Irã e deter a ameaça nuclear representada pelo principal Estado patrocinador do terrorismo no mundo”, disse Trump em um breve pronunciamento. “Esta noite, posso relatar ao mundo que os ataques foram um sucesso militar espetacular.”

Além de afirmar que os EUA destruíram as instalações, Trump fez uma série de advertências ao Irã, exigindo que o regime se submeta a um acordo para encerrar seu programa nuclear.

“Dito isso, isso não pode continuar. Haverá paz, ou haverá uma tragédia para o Irã muito maior do que a que testemunhamos nos últimos oito dias”, disse. “Lembrem-se, ainda há muitos alvos. O desta noite foi o mais difícil de todos, de longe, e talvez o mais letal. Mas se a paz não chegar logo, perseguiremos esses outros alvos com precisão, velocidade e habilidade. A maioria deles pode ser eliminada em questão de minutos”, acrescentou Trump, que estava acompanhado no pronunciamento pelo vice-presidente J.D. Vance, pelo secretário da Defesa, Pete Hegseth, e pelo secretário de Estado, Marco Rubio.

Como o Irã reagiu?

Horas após o anúncio do ataque, mísseis iranianos atingiram áreas no norte e no centro de Israel, deixando pelo menos 23 feridos, de acordo com a imprensa israelense.

Além de tentarem minimizar os efeitos dos bombardeios, o Irã lançou ameaças contra os EUA. O ministro das Relações Exteriores do Irã, Abbas Araghchi, alertou em um post na rede X que os ataques dos EUA “terão consequências duradouras” e que Teerã “se reserva todas as opções” para retaliar.

“Os Estados Unidos, membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, cometeram uma grave violação da Carta das Nações Unidas, da lei internacional e do (Tratado de Não Proliferação Nuclear) ao atacar as instalações nucleares pacíficas do Irã. Os eventos desta manhã são ultrajantes e terão consequências duradouras. Todo e qualquer membro da ONU deve estar alarmado com esse comportamento extremamente perigoso, ilegal e criminoso. Em conformidade com a Carta da ONU e suas disposições que permitem uma resposta legítima em autodefesa, o Irã se reserva todas as opções para defender sua soberania, seus interesses e seu povo.”

Araghchi também apelou ao Conselho da AIEA para que condene os bombardeios. “Eles [americanos] traíram a diplomacia, traíram as negociações. É irrelevante pedir ao Irã que retorne à diplomacia”, disse o ministro.

Qual foi a reação internacional?

As reações internacionais aos ataques americanos variaram entre apoio, preocupação, cautela e críticas.

O premiê israelense, Benjamin Netanyahu, que pressionava Trump a se envolver diretamente no conflito, agradeceu e parabenizou o presidente americano neste domingo (22/06). “Sua decisão ousada de atacar as instalações nucleares do Irã com a força impressionante e virtuosa dos Estados Unidos mudará a história”, disse Netanyahu em uma mensagem dirigida a Trump.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou que a entrada dos EUA representa uma “escalada perigosa em uma região que já está no limite”. A chefe da diplomacia da União Europeia, Kaja Kallas, conclamou todos os lados do conflito entre EUA, Israel e Irã a retomarem negociações, ao mesmo tempo em que insistiu que a segurança internacional estaria ameaçada se o Irã desenvolvesse uma arma nuclear.

Adversários dos EUA, os regimes da Rússia, da China, de Cuba e da Venezuela criticaram a intervenção militar americana no Irã.

Como o conflito começou?

Em 13 de junho, Israel lançou uma campanha aérea contra alvos no Irã, que incluíram bombardeios de instalações nucleares e assassinatos de altos-membros do regime fundamentalista, incluindo diversos generais.

O ataque israelense ocorreu pouco antes de uma nova rodada de negociações entre o Irã e os EUA para a elaboração de um novo acordo nuclear.

Especialistas apontam que o momento escolhido pelos israelenses para atacar ocorreu em uma janela de enfraquecimento estratégico para o Irã. Após a ofensiva terrorista executada pelo Hamas em 7 de outubro de 2023, Israel começou a atacar e enfraquecer grupos apoiados pelo regime de Teerã, diminuindo a capacidade de retaliação dos iranianos.

O primeiro grupo atingido foi o Hamas. Depois, Israel decapitou boa parte da liderança do grupo libanês Hezbollah em bombardeios e uma sofisticada operação de sabotagem. Israel também lançou pesados bombardeios contra os rebeldes houthis do Iêmen. Além disso, o Irã perdeu seu antigo regime aliado na Síria após a queda de Bashar al-Assad.

Com menos aliados operacionais, o Irã se tornou mais vulnerável a um ataque israelense. Há debate sobre o quão próximo e determinado o Irã estava de obter armas atômicas, mas a iniciativa de lançar um ataque militar direto contra instalações nucleares do país era defendido há mais de duas décadas por Benjamin Netanyahu.

Ainda nos anos 2000, quando era ministro no governo Ariel Sharon, Netanyahu defendeu tal ação. Ao retornar ao cargo de primeiro-ministro em 2009, ele pressionou diferentes administrações dos EUA a participarem de uma ação militar. Nesses anos todos, Netanyahu falou em diferentes momentos que o Irã estava próximo de conseguir uma bomba. Em 1981 e 2007, Israel já havia lançado ataques militares unilaterais contra instalações nucleares no Iraque e na Síria, mas o Irã representava um desafio maior.

No entanto, os EUA vinham evitando endossar que os israelenses adotassem esse curso contra o Irã e os “falcões” de Israel tiveram que se contentar nos anos 2010 com operações de sabotagem e assassinatos de cientistas iranianos.

Já a animosidade dos EUA com o Irã remonta há mais de quatro décadas. Antigos aliados, os dois países se tornaram inimigos a partir de 1979, quando o Irã se converteu em um regime fundamentalista islâmico. Nos anos 1980, os EUA chegaram a atacar navios de guerra e plataformas de petróleo iranianas, mas nunca haviam lançado diretamente uma ação militar contra alvos em solo.