gradiente1.jpg

STAUB, O DONO: ele diz que mercado em baixa afetou resultados da companhia

 

Na manhã da terça-feira 4, Eugênio Emílio Staub, o presidente da Gradiente, esteve reunido em São Paulo com Manoel Amorim, presidente do Ponto Frio, e diversos executivos de empresas do setor eletrônico. Era um encontro corriqueiro, para falar de negócios. Staub, sempre bom de conversa e de presença marcante, entrou mudo e saiu calado. A postura, entretanto, não surpreendeu quem estava lá. Há meses o empresário adotou a tática do silêncio quase sepulcral, inclusive entre os colegas, e se fechou dentro da empresa numa busca por saídas para a Gradiente, uma das últimas fabricantes nacionais remanescentes em um segmento dominado por grupos multinacionais. A empresa enfrenta uma aguda crise financeira, com dívidas em alta e balanço no vermelho, numa situação delicada que já afeta a linha de produção ? o coração da companhia ? e se estende até o final da cadeia, atingindo o consumidor. A área de televisores de tubo da marca, por exemplo, ficou parada nas primeiras três semanas de agosto e 266 empregados, sem ter o que produzir, entraram em banco de horas. Já houve atrasos nas entregas de mercadorias a alguns varejistas. E até mesmo o gasto da empresa com a devolução de peças e produtos com defeito não parece querer ceder tão fácil. Analistas temem que novos gargalos na produção castiguem ainda mais o canal de vendas, arranhando a credibilidade da marca. ?Há seis meses recebo produtos com atraso. Às vezes, lotes chegam na data, mas é minoria?, diz um diretor de uma rede de eletrônicos.

Staub e seu filho, Eugênio Staub Filho, ambos no comando do grupo, vêm lutando contra a crise há meses no front interno. No ano passado eles começaram a implantar um doloroso plano de reestruturação, que prevê cortes de pessoal, revisão do portfólio de produtos da marca e renegociação de dívidas com credores. As dificuldades extravasaram os muros da Gradiente no final de agosto, quando a companhia anunciou seu primeiro grande passo dentro desse plano: a venda da marca Philco, por R$ 22 milhões, para investidores asiáticos. O segundo movimento virá da venda de uma das três fábricas de Manaus. Há diferentes propostas na mesa e a fabricante de motocicletas Honda tem interesse no ativo, com valor estimado em R$ 30 milhões. Logo após a venda da Philco, surgiram notícias de demissões.

 

gradiente3.jpg

gradiente2.jpg

gradiente4.jpg

FÁBRICA EM MANAUS, STAUB FILHO E A LINHA DE TVS DA MARCA: empresa precisou dar folga de três semanas a funcionários da unidade

 

A companhia fala em cerca de 30 trabalhadores da área administrativa. Já o sindicato dos metalúrgicos de Manaus diz que, desde janeiro, foram dispensadas 443 pessoas das fábricas na cidade.

A gestão das dívidas é outra emergência na agenda de Staub. DINHEIRO apurou que há débitos já vencidos com fornecedores de componentes, como a Samsung SDI, uma das maiores fabricantes de cinescópios do País. Sem peças em estoque, não há como colocar mercadorias na praça e a empresa perde vendas. Foi exatamente por isso que outra decisão já foi tomada, na lista de medidas para salvar o grupo. A Gradiente optou por fechar o seu Fundo de Investimento em Direitos Creditórios, ou fundo de recebíveis da empresa, que chegou a ter valor captado de R$ 105 milhões no final de 2006. Na prática, com vendas minguadas em 2007, não havia muito mais duplicatas a negociar. Nos últimos três anos, a Gradiente registra vendas líquidas em expansão, mas só teve lucro em 2005, graças a créditos tributários. O último balanço publicado pela companhia de capital aberto traz prejuízo de R$ 114,5 milhões e neste ano, a empresa ainda não divulgou seus resultados, embora seja obrigada por lei. Já foi notificada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e, em função dos atrasos, paga multa diária à autarquia.

O que o mercado tenta entender agora é como uma marca tão tradicional enfrenta uma crise desse tamanho. Até há pouco tempo, parecia não faltar à Gradiente nem dinheiro nem comando. Em 2000, no mais espetacular negócio celebrado por Staub, a fabricante embolsou US$ 400 milhões com a venda, para a Nokia, de sua participação numa joint-venture com a fabricante de celular. Conhecido não só pela habilidade empresarial, como também pelas relações sempre estreitas com o poder, Staub chegou a ser cotado para o Ministério do Desenvolvimento do governo Lula. Ele foi um dos primeiros empresários a levantar a bandeira pró-Lula, mas nos últimos dois anos andou meio sumido. Parou de falar de política e voltou-se mais para a empresa.

O sumiço não foi à toa. Pelo que analistas e executivos afirmam, as dificuldades enfrentadas pela empresa têm relação direta com decisões estratégicas tomadas lá atrás pelo comando do grupo. A direção da Gradiente não toca nesse assunto. Mas em agosto, em nota enviada à CVM, Eugênio Staub disse que ?a companhia enfrenta os mesmos problemas que a indústria eletrônica de consumo no País, ou seja, demanda reduzida, preços em queda e concorrência exacerbada?. De fato, a Gradiente não é a única no prejuízo. Vira e mexe, um fabricante esperneia dizendo que fechou o mês no vermelho, principalmente após a derrocada nos preços das TVs. No entanto, entre as empresas do setor, a Gradiente foi a única a colocar empregados em bancos de horas em agosto e apenas ela renegocia dívidas com credores.

Dados obtidos nos balanços financeiros de 2005 e 2006 ajudam a mostrar a razão do drama da marca, com vendas anuais de R$ 1,8 bilhão. Nos últimos anos, a empresa fez apostas equivocadas e acabou criando um portfólio de produtos com linhas não rentáveis. A fabricante teve, por exemplo, de abandonar a produção de alguns segmentos da área de áudio porque a venda não estava dando dinheiro. Foi preciso sentar e rever a carteira de mercadorias à venda. Além disso, sem tecnologia própria, a Gradiente fechou acordos com parceiros da Ásia, especificamente os chineses, o que acabou trazendo mais dor-de-cabeça ao grupo.

Diferentes linhas de produtos com peças ?made in Asia? apresentaram falhas no ano passado e os consumidores exigiram o conserto das mercadorias.

 

gradiente5.jpg

CHEGADA DA TV DIGITAL TRAZ ESPERANÇA A STAUB

 

Os gastos com assistência técnica foram aos céus. Gastaram-se R$ 89,6 milhões com troca de peças e mercadorias em 2006. E outros R$ 48,8 milhões em 2005. A empresa, em relatório publicado em junho passado, diz que tomou diversas medidas para melhorar a qualidade dos produtos em 2006, ?entretanto, essas ações não foram suficientes para resolver o problema por completo?. No terreno das finanças, o cenário é bem complicado. As dívidas da Gradiente subiram e boa parcela dos débitos é de curto prazo ? cerca de 70%, segundo dados de 2006. Em dezembro, eram R$ 235,7 milhões em dívidas, 44,5% acima do verificado em 2005. Nos últimos anos, o dinheiro da Gradiente veio, basicamente, do BNDES e da venda de ativos. Entre 2005 e 2006, a Gradiente já pegou R$ 160 milhões com o BNDES, informa o banco.

 

gradiente7.jpg

 

E na lista de bens que podem virar recursos no caixa, já não há muita coisa para ser vendida. Staub guarda, no bolso do colete, fichas para derradeiras apostas. Neste momento, uma saída para injetar capital novo na estrutura seria um acordo com a japonesa Sharp. Há rumores de que Gradiente e Sharp podem vir a fechar um contrato para a produção em regime OEM, com a montagem de produtos da fabricante asiática nas linhas de produção da brasileira em Manaus. A Sharp brasileira, comandada pela família Machline, faliu em 2002. Agora, o grupo japonês busca uma nova parceria para iniciar a produção local até o começo de 2008. Além disso, a Gradiente acredita que pode voltar aos trilhos com o início das transmissões da TV digital no Brasil, em dezembro. Quer sair à frente nesse novo mercado e espera, com isso, reverter o jogo.