05/04/2013 - 21:00
O rato que ruge (The mouse that roared) é uma comédia inglesa de 1959 que merece ser vista. Um pequeno país europeu, o ducado de Grand Fenwick, passa por uma grave crise econômica e resolve declarar guerra aos Estados Unidos. A estratégia é inteligente: perder a guerra e conseguir ajuda econômica. No entanto, o impensável acontece: o minúsculo exército local, comandado por um impagável Peter Sellers, consegue chegar a Nova York e capturar uma bomba com capacidade para destruir o mundo, tornando-se uma improvável potência nuclear. Vale a pena rever. Provando que, como dizia Oscar Wilde, a vida imita a arte, o ditador norte-coreano Kim Jong-un emulou um Peter Sellers improvável nos primeiros dias de abril.
Elevando drasticamente o tom da retórica invariavelmente belicosa do país perpetuamente em crise, o estado-maior do Exército da Coreia do Norte disse que “o momento da explosão se aproxima rapidamente”. O rechonchudo Kim – provavelmente um dos únicos norte-coreanos acima do peso – também ordenou a mobilização e a movimentação de tropas, o transporte de mísseis e o fechamento de uma fábrica em seu território operada em conjunto por trabalhadores das duas Coreias. O impacto dos rugidos do rato sobre os mercados foi forte e imediato. As bolsas desabaram, não só na Ásia, mas também nos Estados Unidos e na Europa, com os investidores tentando calcular o impacto de um ataque nuclear.
Segundo Kim, os mísseis poderiam atingir ilhas americanas como Havaí e Guam, e até mesmo chegar ao território dos Estados Unidos. Japão e Coreia do Sul, claro, seriam os alvos preferenciais. A reação internacional não demorou. Linhas de ajuda humanitária foram cortadas, afetando ainda mais a combalida economia nacional e submetendo o povo a uma dose suplementar de privações. Apesar da preocupação, os analistas militares da Coreia do Sul avaliam que não é caso de perder o sono. A princípio, os mísseis que foram movimentados não são os mais perigosos do arsenal de Pyongyang.
O impedimento do acesso dos trabalhadores sul-coreanos à fábrica também é mais retórico do que prático: sem crédito e sem exportações, Kim Jong-un não pode abrir mão de uma de suas únicas fontes de moeda forte, por isso é bastante provável que essa barreira seja reaberta rápida e discretamente. Como explicar, então, os rugidos do rato? Simples: desde que assumiu o poder, no fim de 2011, Kim Jong-un está em guerra. Não contra a Coreia do Sul, mas contra seu Exército e contra opositores dentro de seu próprio governo. Aos 30 anos, Kim é jovem para os padrões de governo asiáticos. Ao contrário de Kim Jong-il, seu pai e antecessor, ele não tinha experiência de governo nem ascendência sobre o Exército ao ser guindado ao poder.
Sem a representatividade das urnas e sem a aura de seus antepassados, sua manutenção no poder depende de convencer seus subordinados e o povo de que ele é capaz de assustar os antigos inimigos – Coreia do Sul e Japão – e manter em xeque os Estados Unidos, ao mesmo tempo que não compromete a inestimável ajuda econômica da China, sem a qual o país teria entrado em colapso há décadas. No entanto, enquanto joga para a própria torcida, Kim eleva a tensão no mercado internacional e testa a paciência dos outros. Seus riscos são elevados: se for longe demais, Kim poderá ter de colocar seu hipertrofiado Exército em ação, o que provará que seus rugidos são, de fato, os de um rato.