Ele cabe na palma da mão, mas essa pequena pedra, cujo tamanho é igual ao de uma noz, tem status de gigante. Com 55.232 quilates e uma coloração branca de pureza ímpar, o diamante Sancy, diminutivo do francês sans similitude (sem igual), passou de mão em mão ao longo de seis séculos. Teve mais de 26 donos, diga-se de passagem, donos que protagonizaram os destinos do continente europeu de 1389 a 1967. Extremamente cobiçado, assistiu ao florescimento das cidades? Estado na Itália, as disputas pelo trono francês, o surgimento de Portugal como potência marítima, a deposição do rei inglês Carlos I, o auge de Louis XIV ? o rei Sol ?, a Revolução Francesa, o 18 Brumário de Napoleão, a queda de reis espanhóis e a gênese do capitalismo americano. Essas e outras histórias são reveladas no recém-lançado livro O Diamante Maldito (editora Record ? 406 páginas – R$ 49), da historiadora britânica Susan Ronald. ?A história do Sancy é fundamentalmente de poder e cobiça?, diz a autora.

 

Extraído das minas de Golconda, na Índia, não se sabe ao certo como ele chegou à Europa. Sabe-se, contudo, que o seu primeiro dono europeu foi Gian Galeazzo di Visconti, o poderoso duque de Milão, no século XIV. Descobre-se também o quanto a pedra preciosa esteve envolta pela superstição. Dizia-se que o Sancy seria uma fonte de mal para aqueles proprietários que não autenticassem a sua procedência. Para os que chegassem ao diamante de forma honesta, ele aumentaria a prosperidade e o poder do proprietário. ?Esta é a base da maldição do Sancy e explica por que alguns de seus proprietários encontraram um fim cruel e sangrento, enquanto outros permaneceram ricos e saudáveis?, diz Susan Ronald. ?Embora eu pessoalmente não acredite em maldições, esta explicação corresponde à verdade ao longo de toda a história do Sancy.?

 

Todos queriam ter o Sancy para demonstrar poder e, de certa forma, como um amuleto. Entre os donos do Sancy encontram-se personalidades como Dom Manuel I, o rei de Portugal, Henrique IV e Louis XIV, ambos reis da França, Jaime I e Carlos I, os dois também reis da Inglaterra, Maria Luisa de Parma, rainha da Espanha, José Bonaparte, irmão de Napoleão, e, nos últimos anos, William Waldorf Astor, o bilionário americano do setor imobiliário. Ao longo da história, a gema foi usada como dote de casamento entre reis e rainhas, foi perdida em batalhas, vendida por mercadores e, acima de tudo, usada como garantia para financiar guerras. Foi dessa forma que o Sancy serviu para custear a primeira grande batalha de um jovem general francês chamado Napoleão Bonaparte. Como a França vinha da Revolução, estava em guerra e tinha altos custos, decidiu-se penhorar o Sancy em troca de dinheiro para pagar as despesas. A justificativa era a de que mesmo aquelas jóias históricas precisariam ser perdidas pela ?glória? da França. Fez-se, então, a vontade dos governantes franceses.

Em 1796, com cavalos espanhóis comprados com o dinheiro do penhor do Sancy, Napoleão Bonaparte venceu a batalha de Marengo, na Itália, e despontou no exército. Três anos depois, ele daria um golpe de Estado e assumiria o poder. Bonaparte tentou recomprar a pedra que havia lhe trazido sorte. Esta, porém, já tinha sido vendida para a rainha espanhola Maria Luisa de Parma. Depois, como de costume, o Sancy passou nas mãos de empresários russos, de um indiano e, após permanecer com a milionária americana Nancy Astor, foi repassado para seu filho Bill. Em 1967, o Sancy, enfim, repousou ao ser vendido por cerca de US$ 7,6 milhões para o Museu do Louvre, em Paris. Um valor, relativamente, ?minúsculo? diante de sua grandeza.