DINHEIRO ? O Fator foi o banco contratado para comandar o processo da fusão da Varig e da TAM. O sr. ainda acredita na possibilidade desse projeto sair do papel?
Manoel Horácio Francisco da Silva ? Ainda acredito sim. Há a possibilidade de racionalizar os ativos e as operações das companhias. É justamente nisso que estamos trabalhando hoje. Trabalhamos com a idéia de formar uma terceira companhia que ficará concentrada na gestão e que deverá, possivelmente, ter mais desdobramentos numa segunda etapa. Iremos separar a parte de gestão da atividade operacional. Dessa forma, valorizamos o que há de melhor dentro de cada uma das duas companhias.

DINHEIRO ? O projeto do economista Paulo Rabello de Castro ganhou espaço nas discussões com o governo.
HORÁCIO ? Primeiro, vamos deixar claro algumas coisas: o único banco com mandato da Varig para estudar as condições para a reestruturação das companhias é o banco Fator. Me parece, não sei se estou errado, que o Paulo Rabello tem contrato apenas com a Apvar, que é aquela associação dos pilotos da Varig. O Paulo Rabello não tem contrato com a Varig nem com a TAM. Não vou fazer comentários sobre o plano dele. Mas acho que no seu plano falta conhecimento sobre a operação e sobre as condições financeiras das duas companhias. Não acredito que o plano dele seja vencedor. Nós somos especialistas nessas transações. Somos prestadores de serviços em soluções financeiras.

DINHEIRO ? Na opinião do sr., o contrato do Rabello com a Apvar não é um documento importante?
HORÁCIO ? É importante, porém a Apvar representa apenas os pilotos da Varig. A Apvar não é uma associação que reúne todos os funcionários da Varig. Sendo assim, é um contrato limitado. Há em torno desse assunto tem muita fofoca e pouco fato. Tem gente querendo entrar nessa história, principalmente porque está dando muita visibilidade. Muita gente cria histórias apenas para tentar ganhar com a reestruturação do setor aéreo. Tem aparecido muita boabagem. Todo mundo está tentando encontrar fórmulas para resolver o problema. Repito, o único banco que tem respaldo legal para solucionar o problema é o Fator.

DINHEIRO ? Na avaliação do sr., a atual crise da Vasp pode acelerar a reestruturação do setor aéreo?
HORÁCIO ? Acredito que a quebradeira da Vasp irá exigir uma resposta mais rápida do governo. Porém, eu acho que o governo precisa do seu tempo. Se eu fosse do governo também levaria todo o tempo necessário para estudar bem as alternativas apresentadas pelo mercado. O governo não pode jogar dinheiro a fundo perdido. É preciso saber como e quando irá ocorrer o retorno do dinheiro investido no setor de aviação.

DINHEIRO ? O prazo para o governo tomar uma decisão está chegando ao fim?
HORÁCIO ? Após as eleições deverá ser apresentada uma solução. E os dois projetos estarão no páreo. Acho ainda que, na realidade, o governo busca não só uma solução para a Varig e a TAM, mas uma reestruturação do setor em geral. Vale lembrar que o setor de aviação enfrenta uma crise mundial, não é um caso isolado no Brasil. A solução é difícil no mundo inteiro. O mercado nacional não precisa de duas companhias, é muito pequeno. O fundamental é reduzir custos, para tornar o serviço aéreo eficiente e saudável.

DINHEIRO ? Entre os projetos de fusão estudados pelo Fator, existe algum com data marcada para acontecer?
HORÁCIO ? Hoje, avaliamos 20 projetos nessa área, mas temos contratos de sigilo. Só divulgamos depois de concluído. O mais importante ainda é o da Varig. Porém, na minha opinião, uma nova onda de fusões e aquisições de empresas irá acontecer a partir da primeira metade de 2005. Hoje, o empresário optou por adotar uma posição bem mais cautelosa. Ele não vai mais investir apenas porque o governo falou que o País irá retomar o crescimento econômico. Primeiro, ele espera os resultados do crescimento da economia. O empresário quer checar os indicadores de desempenho e certificar-se de que o crescimento é sustentável, para depois fazer os investimentos. As experiências nos últimos anos foram traumáticas. Tivemos alarmes falsos. Os empresários se apressavam para investir e a demanda não se confirmava. Agora, o empresariado age como um gato escaldado que tem medo de água. O intervalo entre a confirmação da expansão econômica e os investimentos irá variar entre seis e doze meses.

 

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“Paulo Rabello de Castro não representa a Varig. Fala apenas pelos pilotos”

 

DINHEIRO ? Quais os setores produtivos que estão prontos para iniciar esses
novos investimentos rumo à expansão?
HORÁCIO ? As empresas médias são os primeiros alvos, porque a demanda para aumentar a capacidade produtiva já existe em todas as esferas. Na soma de um processo de compra, muitas vezes uma companhia mais uma companhia rende muito mais do que duas. O resultado pode ficar em duas e meia ou até mesmo chegar a três. As vantagens nos ganhos de escala e na redução de custos podem se multiplicar.

DINHEIRO ? O Banco Fator também planeja continuar a comprar empresas para seguir na trilha do crescimento?
HORÁCIO ? Ainda existem alguns negócios financeiros de pequeno e médio portes interessantes. Temos possibilidade de fazer algumas aquisições; não tiro a possibilidade de crescer por meio das compras. Hoje, concentramos 10% do total do volume dos negócios da Bovespa. Mas a idéia não é ser apenas grande, é ser rentável.

DINHEIRO ? Quando o sr. assumiu o comando do Fator, anunciou a meta de crescer cinco vezes em cinco anos. Após esses dois primeiros anos de gestão, qual o seu balanço?
HORÁCIO ? Essa meta foi resultado dos primeiros três meses de gestão, quando definimos um plano estratégico para a companhia. Nesse momento, eu e o controlador (Walter Appel) verificamos que tínhamos espaço suficiente para crescer. Em 2002, muitas corretoras fecharam as portas porque o movimento de mercado de ações, na Bovespa e na BM&F, tinha diminuído muito. Alguns bancos estrangeiros desistiram dos negócios no Brasil. Concluímos, então, que poderíamos traçar um objetivo ambicioso de crescer cinco vezes em cinco anos. O espaço estava aberto.

 

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“Investidores como Daniel Dantas pagaram muito caro pelas telefônicas”

 

DINHEIRO ? Frente à meta estipulada, qual a posição atual do Fator?
HORÁCIO ? Nós dividimos o crescimento nas nossas três áreas de atuação: corretora, gestão de recursos e fusões e aquisições. Na administração de recursos já superamos a meta. O nosso patrimônio já saltou de R$ 1,2 bilhão para R$ 3,5 bilhões em apenas dois anos. Ampliamos os nossos serviços e montamos uma área de consultoria private, para cuidar da carteira de investimentos dos clientes que possuem entre R$ 300 mil e R$ 500 mil para aplicar. Assim, melhoramos a distribuição de nossos fundos de investimentos. Afinal, os fundos do Fator já eram distribuídos pelos grandes bancos. A corretora também já cresceu cerca de três vezes nesse período. Somos líderes na compra e venda de ações pela internet. A corretora expandiu em função da reavaliação dos processos internos e também com aquisições de três pequenos negócios (Portal Investa, do Itaú, Patagon, do Lemon Bank, e Comercial).

DINHEIRO ? No último ranking do ICC (Índice de Competitividade e Crescimento) do Fórum Econômico Mundial, a posição do País caiu de 54º para o 57º. Sendo assim, há possibilidade de o capital estrangeiro não participar da nova onda de investimentos prevista para 2005?
HORÁCIO ? Esses estudos fazem uma avaliação do passado, não retratam o momento atual. São referentes ao ano anterior. É claro, contudo, que os juros ainda assustam aqueles que pensam em investir utilizando os empréstimos bancários. Os spreads (diferença do custo da captação do banco e a taxa efetiva cobrada dos clientes) ainda são altos, mas os indicadores econômicos já são positivos.

DINHEIRO ? Diante das melhoras econômicas, os bancos têm capacidade para reduzir os spreads?
HORÁCIO ? Não gosto de falar de crédito, porque não atuamos nessa área. Está
fora do nosso foco trabalhar com o crédito. Porém, acredito que se os banqueiros
já tivessem reduzido um pouco as taxas de juros para o cliente final, eles estariam contribuindo para antecipar o ciclo de crescimento da economia. Têm capacidade para reduzir um pouco os índices sem precisar esperar pela queda da Selic (taxa
de juro da economia
).

DINHEIRO ? O sr. teve presença marcante na privatização da Telebrás, assumindo o comando da Telemar. Agora, à distância, como avalia esse processo?
HORÁCIO ? Temos dois lados para comentar. Do ponto de vista do consumidor, o objetivo foi atendido. Acabou a fila de espera pelas linhas. Toda a população foi atendida. Hoje, você tem uma linha fixa ou de celular na hora que quiser. Porém, do ponto de vista de retorno para os acionistas, a situação é outra. Por mais que se fale que as empresas do setor foram praticamente dadas, sabemos que elas foram, na verdade, extremamente caras. Então, não acredito que o Daniel Dantas, por exemplo, tenha conseguido repor os investimentos ou obtido o retorno esperado. O governo vendeu as empresas num momento de euforia dos negócios ligados à tecnologia; após a queda da Nasdaq o valor das companhias desabou. Os controladores apostaram alto e a desvalorização foi rápida. O governo foi feliz no momento da venda, mas os compradores não.

DINHEIRO ? Os minoritários que negociam papéis das empresas de telefônia no pregão têm chance de recuperar as perdas dos últimos meses?
HORÁCIO ? As ações do setor de telefonia estão baratas. Apesar das dificuldades das empresas, os papéis têm chance de recuperação. Mas é um investimento de risco, principalmente porque o desempenho das empresas ainda é muito vulnerável às regulamentações do governo.

DINHEIRO ? Analistas apontam que a venda da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil renderiam cerca de US$ 50 bilhões para os cofres públicos. Para o sr., a continuidade da privatização do setor financeiro é uma boa estratégia?
HORÁCIO ? A área bancária não é uma atividade de governo, seja na Caixa Econômica Federal ou no Banco do Brasil. A privatização é viável, mas isso depende da doutrina do governo.