11/08/2004 - 7:00
Kroll, Jules Kroll. Como bom agente secreto, ele experimentou situações extremas nos últimos meses. Em maio, no dia em que completou 63 anos, Mr. Kroll, personagem cujo nome é sinônimo global de investigação, entrou para a lista dos grandes bilionários. Vendeu uma participação acionária da sua empresa por US$ 1,9 bilhão para a Marsh & McLennan, maior seguradora do mundo. Semanas atrás, no entanto, a Kroll se tornou pivô de um escândalo altamente radioativo no Brasil, ao ser acusada de espionar o governo federal sob ordens da Brasil Telecom ? relatórios com informações sobre autoridades do governo, como Cássio Casseb, do Banco do Brasil, e o ministro Luiz Gushiken, acabaram vazando. Mas mesmo sob intenso bombardeio, Jules Kroll mantém o sangue frio. Casos como o atual, em que a empresa sofre disparos de todos os lados, já ocorreram em vários países. E o desfecho? ?No fim, a verdade aparece e aqueles que nos atacam geralmente são condenados à prisão?, disse Kroll à DINHEIRO, em sua primeira entrevista após a crise. Um de seus mandamentos é uma expressão latina: res ipsa loquitor. Significa ?as coisas falam por si?. E o que isso tem a ver com o caso concreto do Brasil? A Kroll está convicta de que houve uma tentativa de manipulação do governo por parte da Telecom Italia, que disputa o controle acionário da Brasil Telecom com o Opportunity. Mr. Kroll avalia que o caso só ganhou tanta repercussão porque é a primeira vez que uma investigação secreta entre duas empresas privadas vem a público. Seria algo novo na cultura brasileira. Anos atrás, quando a economia era cartelizada e pouco competitiva, não fazia sentido contratar investigações para descobrir os passos e movimentos dos concorrentes. Hoje, diz ele, a prática é comum. A seguir, sua entrevista à DINHEIRO.
Investigar e seguir os passos de um rival é um procedimento ético?
?Se eu estou no negócio de bananas e quero saber o que uma outra empresa do mesmo ramo faz ou planeja fazer, não há nada errado ou ilegal. Isso se chama inteligência competitiva. Investigações assim passaram a existir desde que duas pessoas competiram por um mesmo mercado. A questão é saber de que modo as informações são obtidas, se de forma legal ou não.?
Sua empresa foi acusada de obter grampos e de interceptar mensagens eletrônicas. Isso aconteceu?
?Impossível que algo ilícito tenha acontecido. Nada que contrarie as leis de um país é feito pela Kroll. E quando um cliente pede um serviço ilegal, nós recusamos. O que muitas pessoas não entendem é que nosso trabalho é muito parecido com o dos jornalistas investigativos. A diferença é que nós atuamos para um único cliente, e não para o público em geral.?
Quais são os seus métodos de investigação?
?A primeira coisa que fazemos é desenhar um círculo com todos os indivíduos que possam ter tido acesso a uma determinada informação. Nós conversamos com as pessoas, cruzamos as informações e as analisamos. Também reunimos dados que constam de registros muitas vezes públicos. Num mundo complexo, há casos que envolvem várias jurisdições e nós buscamos os dados onde quer que eles estejam.?
A Kroll já rastreou o dinheiro de vários ?peixes grandes?. Quais foram os casos mais complexos?
?O caso do casal Marcos, das Filipinas, foi relativamente simples. Eles foram
pouco cuidadosos e compraram imóveis nos Estados Unidos sem precauções. Até então, ninguém imaginava que uma empresa privada investigaria um ex-chefe
de Estado. E nós, que fizemos um trabalho voluntário por um dólar, localizamos
US$ 300 milhões, que foram restituídos ao povo filipino. Saddam foi mais com-
plexo porque ele tinha agentes espalhados pelo mundo e muitos de nossos
homens temiam atuar no caso. O resultado do nosso trabalho foi o congela-
mento de US$ 3 bilhões nas contas de Saddam.?
Em 1992, a Kroll foi convocada pelo Congresso brasileiro para recolher dados sobre Paulo César Farias, ex-tesoureiro do presidente Fernando Collor. Como foi o caso?
?No caso PC, a dificuldade foi o prazo. Eram apenas 90 dias. Ainda assim, localizamos imóveis em Paris, contas secretas e aeronaves não declaradas. Depois disso, fizemos muitos serviços para o governo brasileiro.?
Quais foram os episódios críticos, em que a Kroll recebeu ataques semelhantes aos que vem sofrendo agora no Brasil?
?Houve muitos casos polêmicos. No início dos anos 90, um banqueiro italiano,
Roberto Calvi, apareceu morto em Londres, com uma corda em torno do pesco-
ço. Disseram que era suicídio. Nós contestamos essa tese e nos colocamos a investigar. Fomos muito atacados. Passaram-se dez anos e nossa tese se mostrou verdadeira. Há outros exemplos. Nos Estados Unidos, investigamos um grande
player do mercado acionário nos anos 80 chamado Ivan Bosky. Ele também
nos atacou muito, dizendo que sua privacidade havia sido invadida, mas acabou preso. Alguns pensam que a tática de atacar o investigador funciona, mas o
fato é que a verdade sempre prevalece.?
Como o medo de novos ataques terroristas, depois de 11 de setembro de 2001, afetou os negócios da Kroll?
?Muitos acreditam que a segurança é a maior parte do nosso negócio, mas isso representa 6% das receitas da Kroll. Fazemos coisas interessantes, como a segu-
rança de empresas que atuam no Iraque. Mas o que mais nos afetou foi a crise da Enron. Estamos reestruturando a empresa e colocando os seus números em ordem.?
Em 32 anos, a Kroll se tornou um império, presente em 60 países. Por que decidiu vendê-la?
?Porque isso fecha o círculo. Somos uma empresa de gestão de riscos, que se completa perfeitamente com a Marsh. Além disso, a oferta foi muito boa e desde que criei a empresa, a idéia era repartir os ganhos com todos os nossos acionistas.?
Sua primeira investigação foi feita na Marvel Comics?
?É verdade. Havia problemas na compra de vários insumos e eu investiguei o
caso. Devo minha reputação ao Homem-Aranha e ao Capitão América.?
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