01/09/2004 - 7:00
A família Vidigal foi um nome onipresente no universo de negócios brasileiro. Não havia um setor sequer da economia no qual o clã não tivesse presença dominante. No mercado financeiro, Gastão Vidigal chegou a ser o maior de todos, com o Banco Mercantil de São Paulo. Não sobreviveu e foi vendido ao Bradesco. Na área comercial, Antônio Carlos Vidigal tornou-se um dos principais engarrafadores de Coca-Cola do Brasil com a Rio de Janeiro Refrescos. Sucumbiu e foi engolido pela própria multinacional americana. No mundo da produção, brilhou o nome de Luís Eulalio de Bueno Vidigal. Ex-presidente da Fiesp, foi responsável pelo crescimento e naufrágio da Cobrasma, uma das maiores me-talúrgicas nacionais. Falida, sumiu do mapa. Mas restou um, apenas um, Vidigal no universo das fábricas. Roberto Vidigal mantém-se à frente da Confab, fabricante de tubos de aço para gasodutos e oleodutos, desde 1977. Vidigal não olha com saudosismo esses tempos de glória. O que ele realmente lamenta é a espera constante e inglória pela volta do crescimento econômico e da indústria de base do País ? o mesmo sentimento que um primo de Vidigal, Chico Buarque, retratou no clássico Pedro Pedreiro, que fica ?esperando, esperando o trem, que já vem? e nunca chega. ?Há 10 anos estamos estagnados?, diz Vidigal. ?Isso foi fruto de uma política absurda do governo Fernando Henrique, com a supervalorização da moeda, o que tornou a competição impossível?, diz. ?Ele detonou a indústria nacional e destruiu milhões de empregos. Foi um crime.? E o governo atual? Melhorou? ?Não comento, pois teria de deixar a presidência da Confab?, diz, com ironia.
Para manter a Confab, Vidigal fez concessões, até abrir mão do controle. Ele era o dono, agora é executivo. Desde 1998, a companhia pertence à italiana Techint, conglomerado familiar de US$ 8 bilhões de faturamento anual. Hoje ele possui 5% do capital total. ?Meu objetivo era perenizar a Confab, mesmo se para isso precisasse vender o controle?, diz ele. ?Éramos pequenos na economia globalizada.?
A chegada dos estrangeiros reforçou uma de suas principais fontes de receita, a exportação. A filial brasileira tornou-se centro de produção mundial para tubulações com costura (ou emendas). Hoje, metade do faturamento vem do exterior. ?O ideal é que 70% tivesse origem no mercado interno?, diz Vidigal. O mais recente golpe contra essa meta veio do Rio de Janeiro. Meses atrás, uma briga entre o governo de Rosinha Garotinho e a Petrobras enterrou o projeto de um gasoduto que cortaria o Estado. A Confab seria fornecedora das tubulações, e o negócio desfeito apareceu no balanço.
Aos 60 anos, esse senhor de humor britânico parece destinado a ser realmente o último Vidigal da indústria. Os filhos seguiram outros caminhos. Ele não parece incomodado. Sua convivência com os primos na Confab foi conturbada. ?Quando venderam sua parte, foi um alívio?, diz. De Luís Eulalio, também não gosta de falar. ?Não tenho boas relações com ele?, afirma. Grandes companheiros, diz ele, são os livros. Um de seus ídolos é o francês Marcel Proust, autor de um monumento literário, Em Busca do Tempo Perdido. A nostalgia estampada no título da obra, aliás, seria adequada para explicar a trajetória de Vidigal, um empresário à espera do crescimento do País.