13/06/2014 - 20:00
Se o Vale do Silício espirra, o mundo da tecnologia pega gripe. Essa área de cerca de mil quilômetros quadrados na Califórnia, nos Estados Unidos, influencia o planeta graças a empresas inovadoras que surgiram de garagens improvisadas, como são os casos de HP e Apple, ou de projetos universitários, a exemplo do Google. Assim como esses gigantes que ganharam o mundo, há centenas de startups que, neste exato momento, estão desenvolvendo uma nova grande ideia que tornará os seus empreendedores bilionários, como o ucraniano Jan Koum, que vendeu o WhatsApp para o Facebook por US$ 19 bilhões.
Esse celeiro de empresas iniciantes não surge por geração espontânea. Elas conseguem prosperar em razão de um ecossistema quase único, que reúne investidores de capital de risco e universidades formando mão de obra qualificada e voltada a empreender. Dá para copiar esse modelo? São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Recife fazem uma saudável competição para atrair empreendedores digitais e ganhar o rótulo de “Vale do Silício” brasileiro. Quem saiu na frente foi a capital pernambucana.
Em 2000, o professor da Universidade Federal de Pernambuco, Silvio Meira, deu início a um plano de revitalização dos bairros de Recife Antigo e Santo Amaro, estimulando a instalação de empresas de tecnologia por lá. A iniciativa foi batizada de Porto Digital. “Estamos em busca de um modelo próprio de desenvolvimento, pois as condições que deram origem ao Vale do Silício são muito particulares daquele momento e lugar”, disse à DINHEIRO Francisco Saboya, atual CEO do Porto Digital. Hoje, 250 empresas de tecnologia com faturamento somado de mais de R$ 1 bilhão estão instaladas na região.
Para atrair os candidatos a Steve Jobs brasileiro, o Porto Digital oferece um incentivo fiscal que reduz o ISS de 5% para 2%. Neste ano, novas estratégias foram criadas para atrair empresas ao polo. Saboya também abriu uma representação do Porto Digital na capital paulista. “Precisamos ir constantemente a São Paulo, que é o lugar onde a maioria dos clientes está”, afirma Diego Garcez, diretor de negócios da Joy Street, startup especializada em jogos, baseada no Porto Digital. Outra novidade é a abertura, em algumas semanas, de uma aceleradora de empresas.
A Jump Brasil nascerá de uma parceria com o Grupo Jereissati e o Instituto Talento Brasil, com a promessa de investir R$ 35 milhões em cinco anos. Nesse quesito, no entanto, o Porto Digital não é o pioneiro. Belo Horizonte já conta com uma aceleradora operando na região conhecida como São Pedro Valley (“vale”, com a grafia em inglês mesmo). O governo de Minas Gerais criou o Seed, programa que dá de R$ 68 mil a R$ 80 mil em capital semente para as startups. Não há contrapartida de participação acionário, para receber o investimento.
O governo apenas exige que os empreendedores disseminem seus conhecimentos e sua experiência por meio de palestras no Estado. “Muito além de desenvolver apenas uma ideia, precisamos acelerar os empreendedores”, diz André Barrence, presidente do Seed. “Queremos estimular as pessoas a se tornarem empreendedores como opção de vida”. O primeiro passo do Seed foi dado no fim do ano passado, quando as 40 primeiras startups foram selecionadas. Elas trabalham em um escritório compartilhado no São Pedro Valley e recebem mentoria de especialistas em tecnologia e administração.
Além do Seed, outra iniciativa do governo estadual é o apoio do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) para fundos que investem em startups. O mais recente aporte, anunciado na semana passada, foi de R$ 5 milhões no Fundo Brasil Aceleradora de Startups, criado em março pela Microsoft Ventures, braço de investimento da criadora do Windows, pelo Banco Espírito Santo Ativos Financeiros (Besaf) e pela fabricante de processadores para celular Qualcomm. Os alvos são startups com faturamento entre R$ 120 mil e R$ 3 milhões ao ano.
AQUELE ABRAÇO Um pouco mais ao sul, porém, está o eixo Rio-SP, onde grande parte do PIB mantém escritórios. O governo carioca resolveu correr atrás e elevar o nível dos investimentos. Parecido com BH, foi criado o programa Startup Rio, parceria público-privada lançada no fim do ano passado que dá até R$ 100 mil para 50 ideias de empreendedores selecionados. “Queremos fazer a ignição desses projetos, pois essa é a fase mais carente de investimentos”, afirma Tande Vieira, secretário de Estado de Ciência e Tecnologia.
As empresas ocuparão no mês que vem um casarão na rua do Catete, na zona sul da cidade, que já foi sede da UNE (União Nacional do Estudantes) e da faculdade de direito da Uerj. Vieira aposta no “fator Rio” como um diferencial para a colaboração entre os selecionados. “Logo na apresentação das turmas surgiram propostas de corrida à beira-mar entre os desenvolvedores”, diz Vieira. São Paulo não conta com um programa do governo estadual de aceleração de empresas iniciantes, mas o fato de a cidade concentrar 11,5% do PIB nacional é um argumento e tanto para a atração de empreendedores.
“Por mais que Recife, BH e Rio tenham saído na frente, é inegável que SP tem as grandes empresas de tecnologia e conta com infraestrutura, logística e capital humano de qualidade”, afirma Alan Leite, da aceleradora itinerante Startup Farm. A capital paulista não tem um bairro ou região que se destaque como concentradora de startups. Porém, há uma alta densidade desse tipo de empresa no condomínio Villa-Lobos Park, na zona oeste da cidade.
A maioria das mais de 20 empresas lá instaladas é do fundo alemão Rocket Internet, conhecido por adaptar fórmulas de negócio de empresas para as necessidades locais (ou copiar na cara dura, diria alguém não muito simpático à empresa). A empresa de caronas Tripda e o serviço de delivery Hello Food são algumas dessas startups que ocupam o prédio. “Por mais que a internet corte distâncias, a presença física ainda é essencial para a colaboração”, diz Rodrigo Sampaio, presidente da Rocket para a América Latina.
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