10/10/2014 - 20:00
A pintura O cambista e a sua mulher, do flamengo Quintino de Metsys (1514), tornou-se uma das primeiras telas a retratar a estreita relação entre arte e economia. Nos dias atuais, com centenas de obras valendo alguns milhões de dólares, não há dúvida sobre a afinidade entre essas atividades, geradoras de oportunidades de negócio. Esse casamento foi o que motivou a formação da Clé, joint venture entre a consultoria brasileira Expomus, especializada na montagem de exposições em museus, e a francesa André Chenue, de logística, para atuar na proteção de obras de arte.
Detalhe: o segredo do negócio é tão preservado que a sede da nova empresa tem seu endereço, em algum local da Grande São Paulo, mantido em absoluto sigilo. Sabe-se, no entanto, que o imenso galpão de 5,5 mil metros quadrados, ocupado pela Clé, com pé-direito de sete metros, está protegido com portaria blindada e vigiado por incontáveis câmeras. Do lado de fora, seguranças armados fazem ronda 24 horas. Tudo isso para garantir a proteção do crescente e valioso acervo brasileiro de obras de arte, como pinturas e esculturas. “Nosso espaço é uma verdadeira fortaleza”, afirma Maria Ignez Mantovani, diretora da Expomus, que divide a presidência da Clé com o francês Christian da Costa Noble.
“Temos até uma estação de bombeiros instalada no local.” Inaugurada no fim de setembro, a Clé é especializada na guarda de obras de arte e de outros bens patrimoniais, para colecionadores ou herdeiros. Além da segurança pesada, ela oferece um ambiente adequado para a conservação das obras. Seu galpão é mantido na temperatura constante de 20ºC e com 50% de umidade relativa do ar. A empresa também tem como cliente museus e até artistas interessados em guardar seus próprios trabalhos. “As obras precisam ser armazenadas e manuseadas com todo o cuidado e temos o know-how necessário para isso”, afirma Maria Inez. São oferecidos à parte os serviços de transporte, seguro, moldura, restauro, avaliação de mercado e até assistência em aeroportos.
“A existência de um modelo de negócios como o nosso favorece a vinda de galerias e exposições internacionais, que precisam de um local de guarda de alto nível para suas obras-primas”, diz a executiva. A parceria entre as duas empresas, que planejam investir R$ 20 milhões no empreendimento nos próximos cinco anos, já é antiga. Desde a sua abertura, em 1981, a Expomus conta com os serviços da André Chenue, que, por sua vez, é a principal provedora logística internacional no mundo da arte, com mais de 250 anos de experiência, e parceira de museus como Louvre e d’Orsay. Juntas, elas já levaram mostras do Brasil para a França algumas vezes, como a exposição Guerra e paz, de Cândido Portinari, que circulou por várias capitais brasileiras até chegar ao Grand Palais, em Paris.
Dessa aliança, afirma Noble, presidente da Clé, surgiu a vontade de abrir um negócio no País. “O Brasil contemporâneo merece um projeto como o nosso”, diz o executivo. “Acredito que será um sucesso e que poderemos abrir filiais em outras cidades brasileiras.” O otimismo com o mercado de arte nacional tem fundamento. Segundo pesquisas feitas por instituições do setor, entre elas a Abact, que representa as galerias de arte, e a Apex- Brasil, agência governamental de estímulo à exportação, 90% das galerias brasileiras informaram ter aumentado o volume de negócios em 2013, com vendas que totalizaram estimados US$ 588 milhões.
Artistas brasileiros, como Vic Muniz, Adriana Varejão, Ernesto Neto e Nuno Ramos, também têm obtido maior reconhecimento internacional, com pinturas sendo vendidas por cifras milionárias, a exemplo de O mágico, de Beatriz Milhazes, e Relief, de Sérgio de Camargo. O mercado de arte no Brasil está em plena expansão, afirma Noble. Prova disso, de acordo com o empresário, é a abertura de grandes galerias internacionais no País, como a White Cube, além do papel crescente de importantes marchands e colecionadores brasileiros no cenário internacional e da influência marcante das feiras SP Arte e ART RIO, já há alguns anos. “É um crescimento tanto em oferta, com presença de grandes museus, de importantes exposições e de galerias de qualidade, quanto em demanda, com a população brasileira com uma sede maior de cultura”, diz Noble.