Agora, adota um novo paradigma e quer um julgamento exemplar no caso Aracruz, que foi comandada por Carlos Aguiar. Saiba como isso pode disciplinar o mercado. O executivo Carlos Aguiar, ex-presidente da Aracruz e atual presidente da Fíbria, tem um encontro marcado no dia 7 de dezembro. Nessa data, ele terá de enfrentar o julgamento do colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autoridade do mercado de capitais brasileiro. Aguiar presidia a Aracruz durante a crise financeira de 2008, quando apostas desastradas da companhia em derivativos cambiais provocaram um prejuízo de US$ 2,13 bilhões. 

 

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Em circunstâncias normais, a autarquia chefiada por Maria Helena Santana buscaria um acordo com o executivo. No entanto, em uma mudança no seu método de atuação, a CVM rejeitou o pagamento de uma indenização de R$ 400 mil e Aguiar agora enfrenta a possibilidade de ser advertido, multado ou, no caso mais grave, impedido de atuar no mercado financeiro por até 20 anos. 

 

O processo nasceu de uma derrapada de proporções gigantescas. Grande exportadora, a Aracruz sempre teve de se defender da apreciação do real. Um dólar mais barato afetava diretamente seus lucros. 

 

Por isso, a empresa sempre procurou proteção usando derivativos cambiais. Em 2008, quando o dólar vinha caindo aceleradamente, a empresa passou a apostar mais do que o necessário na baixa da moeda americana. 

 

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Pura especulação. Quando veio a crise financeira internacional do segundo semestre, a Aracruz foi pega no contrapé. O prejuízo foi tão grande que forçou a venda da empresa para a concorrente Votorantim Celulose e Papel, formando a Fíbria. 

 

A Aracruz responsabilizou o ex-diretor-financeiro Isac Zagury e preservou Aguiar e os membros do comitê financeiro que, pelo estatuto da empresa, deveriam conhecer e aprovar os riscos dessa estratégia cambial. Aguiar foi promovido, mas não se livrou do processo na CVM. Procurado pela DINHEIRO, recusou-se a comentar o assunto.

 

Os executivos e conselheiros da Aracruz foram chamados a prestar contas aos acionistas minoritários e à CVM. Seguindo a praxe, eles ofereceram compensações financeiras irrisórias em comparação com os valores perdidos – R$ 200 mil a R$ 400 mil. 

 

No entanto, a CVM endureceu o jogo e disse não. Todos serão julgados por falta de diligência e por omissão. “É um caso emblemático, os valores são grandes e a compensação que os executivos ofereceram foi pequena. Por isso, consideramos que é mais conveniente julgar do que fazer um acordo”, diz Roberto Tadeu Fernandes, superintendente-geral da CVM.

 

Uma decisão semelhante deve ser tomada em relação à Sadia. A empresa também apostou erradamente na apreciação do real em relação ao dólar, foi pega no contrapé e amargou uma perda de R$ 2,6 bilhões em 2008. 

 

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Maria Helena Santana, presidente da CVM: caso emblemático pode induzir os

executivos do mercado de capitais a maior responsabilidade

 

A pancada foi tão forte que precipitou a venda à arquirrival Perdigão, que a própria Sadia havia tentado comprar dois anos antes. A expectativa do mercado é de que o ex-diretor financeiro Adriano Lima Ferreira e mais 13 executivos e conselheiros também sejam julgados. Procurados, os acusados informaram por meio de advogados que não comentariam o caso.

 

O superintendente da CVM afirma que, exceto pelos valores elevados, a decisão tomada em relação à Aracruz é igual à dos outros processos analisados pela autarquia. No entanto, até as pedras do calçamento da rua Sete de Setembro, centro do Rio de Janeiro, onde ficam os escritórios da CVM, sabem que a decisão representa um divisor de águas na maneira de o xerife atuar. 

 

Se adotar a mesma postura no processo administrativo da Sadia, que envolve nomes de conselheiros como Luiza Helena Trajano, do Magazine Luiza; Vicente Falconi, do Instituto de Desenvolvimento Gerencial (INDG); e Cássio Casseb, ex-presidente do Banco do Brasil e do Pão de Açúcar, ficará evidente que a CVM quer mandar um recado eloquente ao mercado. 

 

“Ela está demonstrando que fiscaliza e pune se for preciso”, diz o advogado Marcello Klug Vieira, sócio do escritório Salusse Marangoni. “É uma maneira de mostrar que os papéis adquiridos por investidores estrangeiros estarão protegidos de más administrações.”

 

No caso da Aracruz, a inclusão dos membros do conselho de administração, do comitê de auditoria e do conselho fiscal também representa uma mudança importante. Durante muito tempo, os conselheiros das empresas abertas raramente deram conselhos.

 

Tradicionalmente, conselheiro que dura no cargo e desfruta da remuneração e do prestígio tem de comparecer às reuniões, ouvir respeitosamente as opiniões do controlador e, claro, concordar. Essa vida sossegada vai acabar.  

 

O mesmo vale para os diretores. O inquérito da CVM sobre a Aracruz mostra que a empresa possuía um comitê financeiro, responsável por acompanhar a implantação e avaliar as decisões do conselho de administração. 

 

Embora tivessem recebido 16 relatórios em junho de 2008 mostrando as perdas com derivativos, os membros do comitê financeiro não analisaram devidamente os números. “Nada impede que eles sejam responsabilizados por omissão”, informa o parecer da CVM sobre o caso. 

 

Nesse endurecimento, a Comissão mostra que, além das multas milionárias lançadas sobre os peraltas do mercado (veja ao lado), também está se tornando mais dura com eles. “A CVM é o xerife do mercado e não pode ser molenga”, diz José Luís Doles, sócio do Barcellos Tucunduva Advogados.

 

Colaborou Márcio Kroehn