Até onde ir? Na guerra na Ucrânia, os países ocidentais avançam por um desfiladeiro, buscando intensificar sua ajuda militar ao governo de Kiev, mas prevenindo-se de uma intervenção direta que os transformaria em co-beligerantes diante da Rússia.

Até agora, com base no direito dos conflitos armados, os países da OTAN não cruzaram esta linha vermelha e isto apesar do incremento do apoio militar, destaca Julia Grignon, pesquisadora do Instituto francês de Investigação Estratégica da Escola Militar (Irsem).

“Financiar, equipar ou treinar forças armadas não é o suficiente para que um Estado entre no conflito armado”, disse essa especialista em direito dos conflitos armados.

“Se for o caso, cada vez que um Estado financia, equipa ou treina forças armadas estrangeiras, então já haveria estourado a Terceira Guerra Mundial há tempos, pois os Estados comercializam entre eles armas, formam militares no exterior, etc…”, acrescenta.

Ao fornecer blindados do tipo “Guepard” (Alemanha), canhões Caesar (França) ou mísseis antiaéreos Starstreak (Reino Unido), os países ocidentais, que anunciaram, na terça-feira (26), um aumento de sua ajuda militar ao governo ucraniano, seguem respeitando, ao menos teoricamente, a regra.

“Apenas o fato de fornecer armas e outros materiais de apoio às forças armadas ucranianas não significa que os Estados que as apoiam façam parte” do conflito armado, diz o professor americano Michael Schmitt, especialista em assuntos relacionados ao direito internacional humanitário e ao uso da força.

O assunto seria diferente se decidissem participar diretamente nas hostilidades enviando tropas ao terreno, algo descartado até agora pelo Ocidente, em primeiro lugar, pelos Estados Unidos. E com razão.

“A partir do momento em que as tropas da OTAN, atualmente estacionadas nos países limítrofes da Ucrânia, ingressem no território ucraniano, aí sim não haveria dúvida” de sua co-beligerância, considera Grignon.

– Co-beligerantes de fato –

O assunto também poderia ser abordado se os países ocidentais participarem do planejamento militar e da supervisão das operações militares, como foi o caso da coalizão internacional na luta contra o Estado Islâmico no Iraque e na Síria.

A respeito do assunto de uma zona de exclusão aérea, descartada pela OTAN, transformaria em co-beligerantes de fato os países que a aplicassem e a respeitassem.

“Se alguns Estados, talvez com fins humanitários, declaram uma zona de exclusão aérea em setores do espaço aéreo ucraniano e utilizam depois a força contra aviões e helicópteros russos para fazê-los respeitar”, estaríamos em um conflito armado “entre eles e a Rússia”, considerou o professor Schmitt em uma nota publicada no início de março.

Após o debate semântico e jurídico, há incertezas sobre a magnitude e a natureza da reação da Rússia que faz ameaças desde o início da invasão em caso de ingerência externa.

“Participar em um conflito armado significa que você pode realizar ataques ofensivos ou ser objeto de ataques defensivos em seu território”, disse Grignon.

Ao falar diante do Parlamento, na quarta-feira (27), o presidente russo Vladimir Putin advertiu contra qualquer intervenção exterior no conflito na Ucrânia, prometendo uma resposta rápida como um “relâmpago”.

Dois dias antes, o chefe da diplomacia russa, Serguei Lavrov, havia denunciado o fornecimento ocidental de armas sofisticadas, veículos blindados e drones de ponta à Ucrânia, no que vê como uma provocação destinada a prolongar o conflito, ao invés, de pôr fim a ele.

“A OTAN em essência se lançou em uma guerra com a Rússia através de um intermediário e também dá armamento a esse intermediário. Isso significa guerra”, declarou, antes de garantir que a Rússia faz de tudo para não recorrer a armas nucleares.