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Ordem unida: “A fase de diversificação ficou para trás” , diz Emílio

Instalado num pequeno escritório no centro de Buenos Aires, um executivo solitário cumpre neste momento uma missão estratégica para o maior grupo nacional de construção civil. Ele segue todos os lances de uma licitação de US$ 187 milhões para a ampliação do gasoduto San Martín, uma obra de 500 quilômetros com extremos na capital do país e na região de Baía Blanca, ao sul. Fisicamente distante da matriz, em Salvador, na Bahia, na verdade ele representa uma afiada ponta de lança do Plano de Ação 2020, que acaba de ser concluído pela cúpula do Grupo Odebrecht. Ali estão definidos os principais movimentos da organização para os próximos 15 anos. A aventura da diversificação, que levou a companhia a experimentar negócios com celulose, mineração e processamento de alimentos chegou ao fim. A partir de agora, o coração do conglomerado baterá apenas pelo impulso da construtora Norberto Odebrecht e da petroquímica Braskem. Também foi definido o terreno em que ambas terão de crescer ? a América Latina, com suas necessidades de infra-estrutura e possibilidades de associações, daí a importância do tipo de monitoramento feito em Buenos Aires.

Obtido após semanas de deliberações, o resultado é coerente com o desempenho do grupo. Nos últimos anos, a construtora arrebatou praticamente todas as grandes obras de infra-estrutura do continente. A última vitória, semanas atrás, foi anunciada no Peru, onde a Odebrecht ficou com a parte do leão de uma estrada de mil quilômetros, que cortará o país da Amazônia até o Pacífico. Nada menos que 700 quilômetros estarão sob sua batuta, num contrato de US$ 560 milhões. ?Se não tivéssemos tomado o rumo da América Latina, hoje não teríamos o tamanho que temos nem seríamos quem somos?, resumiu à DINHEIRO o presidente do conselho de administração do grupo, Emílio Odebrecht. Seu outro braço operacional, a petroquímica Braskem, também avança pelo continente. A empresa participa, neste momento, da construção de duas plantas industriais, na Bolívia e na Venezuela, com investimentos de US$ 1,25 bilhão.

Nada menos que 78,4% do faturamento do grupo ? R$ 4,6 bilhões ? vieram, no ano passado, de seus canteiros de obras no exterior. A Odebrecht está presente, hoje, em 27 países, mas as principais obras estão sendo feitas entre os Estados Unidos e a Argentina. No mais latino dos estados norte-americanos, a organização reforma neste momento as asas norte e sul do aeroporto de Miami, na Flórida, pela cifra de US$ 1,3 bilhão. No México, acaba de ganhar a licitação para duplicar a refinaria de petróleo General Lázaro Cárdenas, da estatal Pemex. A obra foi orçada em US$ 635 milhões. Na América Central, a construtora ergue agora a hidrelétrica de Pinalito, na República Dominicana, com custo de US$ 131,7 milhões. Três outras hidrelétricas, com valor aproximado de US$ 800 milhões, são tocadas pela companhia no Equador. Na Venezuela de Hugo Chavez, os negócios da Odebrecht são ainda mais espraiados. As linhas 3 e 4 do metrô da capital Caracas, com um total de 12 quilômetros de túneis, vão sendo construídas pela empresa sob contratos de US$ 185 milhões. O projeto de irrigação El Diluvio-El Palmar, na região fronteiriça com o Brasil, foi conquistado este ano pelo valor de US$ 96 milhões. Enquanto isso, uma ponte de 3,1 quilômetros sobre o rio Orinoco, 165 quilômetros de estradas e dois quilômetros de viadutos vão ficando prontos no interior do país, com previsão de entrega para maio de 2006. A fatura total desses empreendimentos é de US$ 600 milhões.

Para ganhar as disputas, a estratégia da Odebrecht segue a política do caso a caso. Muitas vezes, é a própria empresa que se dirige aos governos nacionais com a sugestão da obra a ser feita. Foi assim com a hidrelétrica de PPL, na Patagônia, Argentina. Os executivos da companhia primeiro detectaram a necessidade energética da região, em seguida fizeram os desenhos e orçamentos e mais tarde abordaram o governo. Entre prospecção e aprovação, todo o processo levou 10 anos para se completar, mas, em compensação, valeu à Odebrecht a condição de ser a primeira empresa brasileira a se fixar no país vizinho. Outras vezes, para chegar com mais cartas na mão durante as licitações, a companhia tratava de garantir os recursos para viabilizar a obra. Nos últimos tempos, sua parceria com o BNDES, que têm aberto poderosas linhas de financiamento para amparar suas investidas, tem despertado polêmica e ciúmes dentro do Brasil. Há quem considere, e não é pouca gente, que o banco tem mais o que fazer dentro do País em lugar de financiar obras para outras bandeiras. ?Este tipo de financiamento estimula a produção de bens e produtos brasileiros?, defende o presidente do BNDES, Guido Mantega. ?Isso quer dizer que essas linhas geram empregos e renda dentro do Brasil, enquanto as empresas que delas se beneficiam recolhem tributos. Tudo isso estimula o crescimento do PIB?.

Para obter uma terceira alternativa para viabilizar suas obras, a companhia montou em Washington, bem perto das sedes dos organismos multilaterais de financiamento como o BID e o Bird, um escritório cuja função específica é cuidar da papelada ? e do lobby ? para a liberação de verbas. O antigo relacionamento com as maiores seguradoras do mundo ? desde 1979, jamais as obras internacionais da Odebrecht registraram um sinistro grave ? rendem à companhia melhores taxas e mais rapidez diante das concorrentes. Isso, muitas vezes, pode ser a razão determinante de uma vitória ou um inútil segundo lugar. ?Temos de atender o cliente em todas as suas necessidades?, diz André Amaro, diretor da área externa da construtora. ?Caso contrário, faríamos uma obra e sairíamos do país, o que nunca aconteceu?. Hoje, a construtora tem 1,4 mil funcionários trabalhando no exterior.

Criada em 2002, a Braskem firmou com a estatal Pequiven, um acordo para construir, até 2008, sua primeira planta industrial de polipropileno fora do Brasil. Os aportes serão de US$ 250 milhões. Na Bolívia, com investimentos de US$ 1 bilhão, já tem tudo acertado para montar, até 2009, um planta de polietileno. ?Nossa meta é figurar entre as 10 maiores petroquímicas do mundo em sete anos?, avisa José Carlos Grubisich, presidente da Braskem, hoje na 17a posição do ranking. ?Estamos certos de que a América Latina nos levará até lá?. Diante do histórico de relacionamento entre o grupo e os países do continente, a nova estratégia de mercado e tradicional qualidade de execução, o prudente é não duvidar.

Presença global
Odebrecht está em 27 países, com ênfase na América Latina

Peru
Acaba de vencer concorrência de
US$ 560 milhões
Argentina
Atenção na licitação do gasoduto
de US$ 187 milhões
Venezuela
Braço petroquímico fez acordo de US$ 250 milhões com a Pequiven
Equador
Três hidrelétricas e receita de US$ 97 milhões em 2004
Estados Unidos
Obras de ampliação do aeroporto de Miami com receita de US$ 1,3 bilhão
Bolívia
Braskem investe US$ 1 bilhão para fazer polietileno até 2009
México
Contrato de US$ 635 milhões para ampliar refinaria de petróleo da Pemex
República Dominicana
Constrói usina hidrelétrica com orçamento de US$ 131,7 milhões

US$ 17 bilhões é a receita de 26 anos no exterior

 
Obras continentais
Empresa baiana venceu principais licitações de infra-estrutura

Peru:
A obra para construir o trecho de 300 Km que ligará Urcos a Inhambari tem custo de US$ 235 milhões e recursos do BNDES

Venezuela:
A construtora fará a ampliação das linhas 3 e 4 do metrô de Caracas, capital do país de Chavez

 

Rota para o pacífico:
Estrada de 700 km sai da Amazônia, cruza
a Cordilheira dos Andes e chega ao oceano

Aeroporto de Miami:
Odebrecht foi a primeira empresa brasileira a vencer licitações públicas nos Estados Unidos

 

?A América é segura?

DINHEIRO ? Por que a Odebrecht resolveu fazer a América Latina?
Emílio Odebrecht ?
No período do Milagre Brasileiro percebemos que haveria uma retração de investimentos públicos. Resolvemos, então, diversificar e internacionalizar o grupo. Partimos para propor obras na América Latina, a região que nos oferecia segurança.

Como foi o primeiro passo?
Difícil. Uma coisa é exportar produtos e outra, mais complicada, é exportar serviços. Começamos no Peru, em 1979, e depois avançamos oferecendo soluções de infra-estrutura para outros países da região. Quando entramos na Argentina, depois de dez anos de tentativas, nos tornamos a primeira empresa brasileira no país.

Qual foi o movimento seguinte?
África, do mesmo modo: identificando necessidades e oferendo soluções. Dali fomos para Portugal, que tinha bons financiamentos para infra-estrutura em suas ex-colônias. Uma decisão da Petrobras de privatizar seus contratos de perfuração de petróleo nos levou até a Índia. E fomos indo.

América do Sul e da África são bons clientes?
São, mas seus países costumam ser tão carentes que precisam de ajuda até para definir o que precisam fazer, quanto mais para a solução financeira.

Qual é o foco hoje?
De novo é a América Latina. Com a construtora e a petroquímica. A integração regional passa pela construção de obras binacionais de infra-estrutura. O continente não pode esperar mais pelo desenvolvimento. Nossa fase de diversificação ficou para trás.