09/07/2003 - 7:00
A estréia estava marcada para o dia 1.º de julho. Era a data prevista para a entrada em cartaz do ?espetáculo do crescimento?, prometido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o segundo semestre. Como num passe de mágica, o País sairia da inércia econômica e nadaria de braçada em direção ao crescimento. Mas, naturalmente, nada disso parece apontar no horizonte. Na segunda-feira 30, o Banco Central reduziu sua estimativa de crescimento da economia brasileira em 2003 de 2,2% para 1,5%. O Brasil, contrariando o desejo do presidente Lula, está a beira da recessão. ?Esse espetáculo do crescimento que o governo quer ver não vai acontecer no segundo semestre?, lamenta Horácio Lafer Piva, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. Na semana passada, a Fiesp divulgou que as vendas reais de toda a indústria do Estado de São Paulo apresentaram uma queda de 1,5% em maio, em comparação ao mesmo período do ano passado. A indústria automobilística, por exemplo, vem sofrendo reduções sucessivas nas vendas de carros. Só neste semestre a queda foi de 8,2%, em relação aos primeiros seis meses de 2002. ?Só é possível um crescimento positivo no setor industrial porque as exportações estão sustentando a atividade industrial?, avalia Armando Monteiro, presidente da CNI. ?Se dependêssemos do mercado interno, o tombo seria muito maior.?
A freada vem sendo tão intensa que os indicadores de preços já apontam para um fenômeno raro no Brasil: a Fipe registrou deflação de 0,16% em junho. Por falta de compradores, os preços recuam. É o que está acontecendo com o setor de alimentos, no qual a pesquisa da Fipe apontou que os preços ficaram 1,35% negativos. No setor de transportes a deflação foi de 0,95% ? basicamente por conta dos preços dos combustíveis. No final de maio, a Fundação Getúlio Vargas registrou queda de 1,67% no Índice de Preços do Atacado, que sofre forte influência da queda do dólar. ?O desaquecimento da demanda doméstica está determinando queda nos índices?, diz o economista Mário Mesquita, do ABN-Amro. Esse efeito é temporário, pois em julho os índices deverão voltar a subir. Não porque a demanda nos supermercados tenda a aumentar, mas porque a inflação de julho sentirá os efeitos dos preços administrados, como os da telefonia (veja matéria sobre indexação à pág. 79). ?A desaceleração dos preços livres reflete a fragilidade da economia, causada em especial pela deterioração do poder de compra dos consumidores?, diz Marcelo de Ávila, economista-chefe da Global Invest.
As expectativas para o futuro próximo não são otimistas. Os analistas imaginam uma ligeira recuperação do consumo no segundo semestre, mas nada equivalente ao show que Lula anunciou. ?A melhora deve acontecer no fim do ano e não será espetacular?, avisa o economista Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central. Até porque os juros vêm caindo muito lentamente ? na última reunião do Comitê de Política Monetária, a queda foi de 26,5% para 26%. O temor da estagnação econômica está atingindo até mesmo a menina dos olhos do governo Lula. A balança comercial já começou a recuar, num reflexo direto da valorização do real, hoje próximo a R$ 2,85. Isso acontece em um momento em que as exportações haviam se tornado a grande alternativa do setor produtivo. ?A rentabilidade foi afetada e os exportadores estão postergando as vendas?, afirma Roberto Giannetti da Fonseca, ex-secretário da Câmara de Comércio Exterior.
Desemprego. Para muitos economistas, o que está por trás do baixo crescimento é uma política econômica que privilegia a confiança do mercado financeiro em detrimento do consumo interno. Os reflexos disso são o alto desemprego ? de 20,6% na região metropolitana de São Paulo ? e a queda da renda do trabalhador, que recuou 28,3% nos últimos cinco anos. Também entre os grandes empresários, representados no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, surgem sinais de insatisfação em relação à política de Antônio Palocci. O ministro Tarso Genro, secretário do Conselho, revelou que seus integrantes já cogitam propor mecanismos de controle de capitais, para permitir uma queda mais rápida dos juros. O fato é que o espetáculo do crescimento está tardando e a platéia, impaciente, já começou a bater os pés.