As altas das taxas de juros no mundo provoca “níveis de superendividamento sem precedentes” nos países em desenvolvimento, expondo-os a importantes riscos financeiros, advertiu uma agência da ONU nesta quarta-feira (12).

O ciclo de aumentos de juros, que há vários meses afeta Estados Unidos e Europa, “custará aos países em desenvolvimento mais de 800 bilhões de dólares (em torno de 4,94 trilhões de reais em valores atuais) em perda de renda” nos próximos três anos, estima a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD, na sigla em inglês).

Segundo o relatório, o número de países onde recursos destinados a pagar os juros da dívida superam os dedicados aos sistemas de saúde passou de 34 para 62 na última década.

As altas dos juros “aumentam o peso da dívida em todo o mundo, mas pesam ainda mais sobre os países em desenvolvimento”, disse à AFP Jeronim Capaldo, um dos autores do informe, que questiona a eficácia dos aumentos das taxas para combater a inflação.

Se os preços continuam nas nuvens, principalmente da energia e dos alimentos, é porque agora “não têm nada a ver” com as taxas, mas com as modalidades de “intercâmbios comerciais internacionais”, explica Capaldo.

“O risco (…) é que estamos seguindo pelo caminho errado”, adverte.

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A questão do endividamento dos países em desenvolvimento está na agenda das reuniões de primavera do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (BM) desta semana em Washington, mas as soluções em estudo são meramente “simbólicas”, critica o especialista.

Em seu informe, a UNCTAD defende um “foco urgente na reforma” da estrutura da dívida dos países em desenvolvimento.

A entidade recomenda criar “um mecanismo multilateral de renegociação da dívida”, com análises que “incluam as necessidades de financiamento climático e de desenvolvimento”. Essa reforma evitaria que “a escassez de liquidez internacional” leve muitos países a entrar em “um círculo vicioso financeiro” que pode agravar sua exposição aos riscos, continua o documento.

A UNCTAD também aconselha a criação de um organismo independente de auditoria, atualmente sob responsabilidade do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial.

Essas instituições “são credoras importantes e, ao mesmo tempo, realizam as auditorias das contas públicas dos Estados”, observa Capaldo, para quem “esse conflito de interesses não ajuda a ninguém e menos ainda aos países endividados”.