27/11/2020 - 17:40
Em 15 de maio, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou um plano para desenvolver uma vacina contra a covid-19 antes do fim do ano, uma missão que não será amplamente afetada pelo incidente da vacina AstraZeneca/Oxford, um dos seis projetos apoiados por Washington.
“É um enorme esforço científico, industrial e logístico diferente de tudo que nosso país já viu desde o Projeto Manhattan” (que deu origem à bomba nuclear), declarou na ocasião o presidente, que foi acusado de avançar sozinho e promover um “nacionalismo” da vacinação.
Trump batizou a operação de “Warp Speed”, em referência a um termo da ficção científica que significa ultrapassar a velocidade da luz. Com esse objetivo, ele nomeou um general do exército e um ex-diretor dos laboratórios GSK para combinar a experiência de cientistas do Departamento de Saúde com a logística militar.
Seis meses depois, o que Trump chama de “milagre”, apesar do termo não entusiasmar os cientistas, está a vista: a vacina Pfizer/BioNTech já apresentou seus estudos clínicos à FDA, agência federal de controle de alimentos e medicamentos, que deve emitir sua autorização em 10 de dezembro.
O sinal verde para a Moderna, uma pequena empresa americana diretamente subsidiada, pode chegar em breve.
E em janeiro, um terceiro projeto desenvolvido pelo grupo americano Johnson & Johnson, também pode render frutos e, portanto, fornecer mais doses, para ajudar a atingir a meta de vacinar todos os americanos até abril.
No total, o plano apostou em seis projetos, dois baseados em cada tecnologia para diversificar os riscos: Pfizer e Moderna usaram a nova tecnologia de “RNA mensageiro”; Johnson & Johnson e AstraZeneca contam com um vetor viral; e Novavax e Sanofi/GSK usam uma base de proteína.
No total, as empresas receberam mais de 10 bilhões de dólares. A esperança era que pelo menos um dos projetos desse certo.
Inicialmente, a vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford com a parceira industrial AstraZeneca estava entre as “favoritas” na corrida. Em junho, a associação anunciou que em setembro saberia se tinha ou não uma vacina eficaz.
No entanto, em setembro houve um primeiro incidente, quando um participante dos testes no Reino Unido adoeceu. Foram seis semanas até os ensaios clínicos serem retomados nos Estados Unidos.
Mais tarde, na última quinta-feira, uma confusão sobre as dosagens levou o grupo a anunciar que realizaria mais testes para dissipar as dúvidas.
– “Efeito acelerador” –
Os especialistas acham que os Estados Unidos podem se dar ao luxo de dispensar a AstraZeneca, enquanto espera mais resultados. Assim, milhões de americanos serão vacinados com as doses da Pfizer ou Moderna antes do Ano Novo, se o FDA permitir.
A União Europeia encomendou doses de seis fabricantes, incluindo cinco apoiados pela “Warp Speed”. “O poder do investimento teve um efeito acelerador importante”, afirmou Loïc Chabanier, da consultoria EY, à AFP em Paris.
O apoio dos Estados Unidos tornou possível financiar estudos clínicos em grande escala, assim como a renovação de edifícios ou construção de fábricas.
“Os americanos financiaram os testes clínicos em todo o planeta”, disse o CEO da Moderna, Stéphane Bancel, à AFP. O governo Trump encomendou 100 milhões de doses, que seriam pagas mesmo que a tentativa falhasse.
“Não somos a Pfizer ou a AstraZeneca”, declarou Bancel. “Precisamos de um fluxo de caixa enorme”, explicou.
Devido a sua gestão desastrosa da pandemia, os especialistas raramente atribuem mérito a Trump, que apostou tudo nas futuras respostas farmacêuticas, em detrimento das medidas imediatas de saúde pública que poderiam ter salvado centenas de milhares de vidas este ano.
Os Estados Unidos “não são bons em prevenção”, disse Eric Topol, diretor do Scripps Research Translational Institute, à AFP em setembro, “mas são bons em ciências biológicas”.
“Esta é uma força dos EUA. Não é o Trump. Ok, eles colocaram dinheiro nisso, bilhões de dólares dos quais dependiam o funcionamento das vacinas. Mas foram as empresas que conduziram tudo”, afirmou o especialista, que também destacou a excelência dos Institutos Nacionais de Saúde (NIH), que ajudaram no desenvolvimento da vacina da Moderna e gerenciaram os testes.