24/10/2022 - 21:54
Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) -A campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL) montou uma operação de guerra no domingo para tentar afastar o candidato à reeleição de Roberto Jefferson, ao reforçar a condenação às ações do ex-deputado e ao mesmo tempo tentar ligar o presidente de honra do PTB a Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e assim buscar conter possíveis danos eleitorais a uma semana do segundo turno, de acordo com duas fontes ouvidas pela Reuters.
Aliado de Bolsonaro, Jefferson disparou tiros de fuzil e lançou granadas ao resistir na manhã de domingo a uma ordem de prisão do Supremo Tribunal Federal (STF), deixando dois agentes da Polícia Federal feridos.
O ministro do STF Alexandre de Moraes havia revogado uma prisão domiciliar do petebista –concedida em janeiro deste ano em razão de problemas de saúde– por ele ter desrespeitado várias vezes medidas cautelares, entre elas quando divulgou vídeo na sexta-feira passada com graves ofensas contra a ministra do Supremo Cármen Lúcia.
O petebista –que passou a apoiar a apoiar Bolsonaro no segundo turno de 2018– havia sido inicialmente preso em caráter preventivo em agosto de 2021 pela PF, por determinação de Moraes, em uma investigação que incitação ao crime e ataques a instituições.
De fevereiro a julho do ano passado, em várias ocasiões, Jefferson atacou ministros do Supremo e incitou crimes de racismo e homofobia. Em uma entrevista, ele chegou a equiparar LGBT, drogado, traficante e assaltante de banco à “demolição moral da família”. Ele virou réu nesse caso.
Nesta segunda-feira, Jefferson foi indiciado, segundo a corporação, pela tentativa de quatro homicídios ao atirar na direção de agentes da PF.
ELEVANDO O TOM
Bolsonaro foi elevando o tom da resposta ao episódio ao longo do domingo. Em seu tuíte inicial sobre o tema, o presidente repudiou as ofensas a Cármen Lúcia e a “ação armada” da Jefferson, mas também criticou a “existência de inquéritos sem nenhum respaldo na Constituição e sem a atuação do MP”, numa referência a investigação que apura a existência de uma organização criminosa digital voltada para atacar instituições democráticas, alvo de críticas constantes dele.
Nas publicações e aparições públicas seguintes, Bolsonaro já se referia a Jefferson como bandido e ainda tentava levar algum crédito pelo desfecho do episódio.
“Como determinei ao ministro da Justiça, Anderson Torres, Roberto Jefferson acaba de ser preso. O tratamento dispensado a quem atira em policial é o de bandido. Presto minha solidariedade aos policiais feridos no episódio”, disse.
O presidente tinha chegado a determinar a ida de ao Rio de Janeiro para acompanhar o andamento do que chamou de “lamentável episódio”. Contudo, segundo uma fonte, ele recuou e deixou Torres monitorando a situação de Juiz de Fora (MG) após Moraes ter emitido uma segunda ordem de prisão contra Jefferson e alertado que qualquer autoridade que interviesse no caso poderia responder por prevaricação.
Na sequência, além de se referir a Jefferson como bandido, o presidente e aliados se referiram ao ex-deputado “criminoso” e “infrator” e passaram a tentar ligá-lo a Lula, por ter dado sustentação ao governo do adversário em 2003 e só teria se afastado após o escândalo do mensalão, no qual foi o delator em 2005.
“Tem gente aí, como o candidato fujão (numa referência a Lula) que quer tirar proveito da situação dizendo que ele (Jefferson) coordena minha campanha e é meu amigo. Ele não coordena minha campanha e não tem nada de amizade”, disse Bolsonaro, na sabatina da Record de domingo à noite.
O presidente ainda citou em entrevista à Record que Jefferson entrou com uma queixa-crime contra ele e o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, no Superior Tribunal Militar (STM) por prevaricação. Ele se refere a uma ação em que o petebista questiona o fato de que Bolsonaro e o titular da Defesa não terem acionado as Forças Armadas contra o que seria arbitrariedades do Supremo. O foro dos dois, no entanto, seria o STF e não o STM.
Para tentar se distanciar, o candidato à reeleição chegou até a falar que não tinha foto com Jefferson, mesmo com dezenas de encontros registrados entre os dois nos últimos anos, inclusive no Palácio do Planalto.
Nesta segunda-feira no final da tarde, em entrevista ao portal Metrópoles, Bolsonaro seguiu com a estratégia ao ser questionado sobre o assunto.
“Tenho vários amigos pelo Brasil, se algum faz besteira o que eu tenho a ver com isso?”, questionou ele, num primeiro momento.
“Roberto Jefferson, no meu entender, tinha tudo para continuar a sua batalha por liberdade. Agora quando ele atira em direção aos policiais e lança uma granada –que seja uma granada de efeito moral– ele perdeu completamente a razão e vai responder agora por tentativa de homicídio. Lamento, mas não posso concordar com isso”, acrescentou.
Pesquisa AtlasIntel divulgada nesta segunda mostrou que 66,7% dos entrevistados têm uma imagem negativa de Jefferson, incluindo 46,7% daqueles que se declaram bolsonaristas. Apenas 3,8% dos entrevistados disseram ter imagem positiva, enquanto 29,5% disseram não saber. Entre os bolsonaristas, 13,4% têm imagem positiva do ex-deputado, e 39,9% disseram não saber.
Para 59,7%, a decisão do STF de prender Jefferson é justa, enquanto 16,4% disseram considerar injusta e 23,9% disseram não saber do caso. Entre os bolsonaristas, 25,9% disseram considerar justa, ante 36,8% que consideraram injusta.
A reação de Jefferson contra os agentes da PF foi considerada injustificada por 64% dos entrevistados, enquanto 8,5% disseram ser totalmente justificada e 7,3% disseram ser parcialmente justificada. Apenas entre os apoiadores de Bolsonaro, 44,9% disseram ser injustificada, enquanto 7,6% disseram ser totalente justificada e 16,6%, parcialmente justificada.
Uma fonte da campanha admitiu que o episódio envolvendo Jefferson quebrou o discurso de vitimização do bolsonarismo em relação ao Supremo porque gerou uma onda de solidariedade à ministra Cármen Lúcia e também acabaram, de maneira geral, por dar razão às medidas que Moraes tomou contra o petebista.
Não à toa, houve quem no núcleo bolsonarista mais ideológico –em especial nas redes sociais– chegasse a dizer que Bolsonaro deveria ficar do lado de Jefferson na resistência ao Supremo. Mas esse caminho é minoria no núcleo da campanha.
“Muita preocupação com as próximas pesquisas. Vamos torcer para que seja igual à crise das venezuelanas. Muito barulho, mas pouco impacto eleitoral”, disse uma das fontes.
“É olhar para frente e torcer que não haja um impacto eleitoral”, reconheceu ela, ao acrescentar que a ordem é buscar falar de ações do governo e comparações com a gestão petista. Segundo a fonte, a campanha deve lançar nos próximos dias 22 propostas –o número eleitoral de Bolsonaro– para o eleitorado. Isso era para ter ocorrido no sábado.
O candidato à reeleição terminou o primeiro turno 6,2 milhões de votos atrás de Lula. As pesquisas eleitorais têm mostrado que a vantagem do petista tem se estreitado.
(Reportagem adicional de Rodrigo Viga Gaier, no Rio de JaneiroEdição de Alexandre Caverni e Pedro Fonseca)