23/04/2003 - 7:00
Tempo é dinheiro, diz uma das mais antigas máximas do mundo executivo. Mas há um limite. Essa talvez seja a mais amarga das lições com a aposentadoria do Concorde, prevista para outubro deste ano. A lendária aeronave, o canudo de alumínio capaz de ultrapassar a barreira do som, construída em consórcio pela British Airways e pela Air France, terá voado ao longo de 27 anos. Consome duas vezes mais combustível que um Boeing 747 e transporta apenas um quarto do número de passageiros. É, naturalmente, uma aberração econômica. No ano passado, as 12 aeronaves produziram um rombo de US$ 50 milhões. Para tirá-los do ar, as duas empresas gastarão US$ 197 milhões. E daí? O fim dos vôos é quase um detalhe diante do mito que se ergueu na trilha do Concorde. O século XX será lembrado, no futuro, como uma época em que se podia ir de Paris a Nova York em apenas 3h45 ? contra 7h55 de um Boeing. O ícone deixou órfãos. ?O Concorde jamais terá interrompido suas atividades, porque continuará a viver na imaginação humana?, diz Jean-Cyril Spinetta, presidente da Air France. ?Nunca houve um objeto industrial tão bonito.?
É verdade. O nariz aquilino do Concorde o transformou em escultura. A velocidade o fez útil. ?Tempo é, sim, dinheiro?, retruca Keith McMullan, diretor administrativo da Aviation Economics, consultoria com sede em Londres. ?E, para algumas pessoas, tempo é muito dinheiro.? A bordo do Concorde estiveram todos os grandes executivos pré-nova economia, antes do boom da internet. Fecharam negócios a jato. Artistas e esportistas o transformaram em prioridade. Pelé, Bjorn Borg e, mais recentemente, Tiger Woods eram assíduos. Paul McCartney, Liz Taylor e Michael Jackson tinham fascínio pelo avião. Em junho de 1985, Phil Collins esteve numa mesma noite em um show em Nova York e no Live Aid, em Londres, por força do bólido a planar contra o fuso horário. O Estádio de Wembley chorava a fome na África e Collins não teve dúvidas em celebrar o símbolo da riqueza. ?O Concorde foi uma das maravilhas da engenharia em todos os tempos, mas nunca foi um sucesso econômico?, diz John Leahy, diretor comercial da Airbus.
Pergunta-se, agora, como sucedê-lo, já que os relógios continuam a correr, e cada vez mais acelerados. O sonho de atravessar o Atlântico em pouco mais de 3 horas persiste. Especialistas em aviação acreditam na construção de jatos com capacidade para 10 passageiros, mais velozes até que o Concorde. O mercado vai em direção a custos menores. Aparelhos diminutos reduziriam os custos de construção das aeronaves. Já há estudos nas pranchetas da Boeing, Airbus, Lockheed e Dassault. Seus executivos sabem que depois do sonho do homem em voar, um outro brotou, definitivo ? o de voar cada vez mais rápido.