24/02/2005 - 7:00
Deu-se a revolução, o vento de novidade que virou ao avesso a história da moda, na tarde fria de Paris de 12 de fevereiro de 1947, uma quarta-feira. Christian Dior tinha 42 anos, idade improvável para o início de grandes guinadas. Na passarela, assistiu-se ao casamento do capital e da arte numa explosão que mudaria para sempre o modo das mulheres se vestirem. O capital vinha do empresário Marcel Boussac, um dos homens mais ricos daqueles tempos. A arte mostrou-se em saias abaixo dos joelhos, de rodas imensas, com até 30 metros de tecido. A coleção chamava-se ?Corola?. Ao ver as criações, a jornalista Carmel Snow, editora de moda da revista Harper?s Bazaar, decretou: ?This is a new look? (Este é um novo visual). O modelo que se tornou símbolo desse novo olhar foi o tailleur Bar, um casaquinho de seda bege, ombros estruturados, ampla saia preta plissada na altura dos tornozelos. Era o feminino de volta à vida, depois dos anos da recessão ao longo da II Guerra Mundial.
Foi um espanto. Em um ano, o New Look resultou em cerca de 10 mil pedidos. Ricas e famosas aderiram à onda, numa espontânea rede de divulgadoras. Elas passaram a vestir Dior. Na galeria, desfilavam nomes como Grace Kelly, Eva Peron, Marlene Dietrich, Lauren Bacall, Olivia de Havilland… Foi como se, depois dos anos movidos a balas de canhão, a beleza tivesse renascido. Renascido para não mais morrer. Dior faria, em 21 de janeiro passado, 100 anos. A efeméride tornou-se uma espécie de dia internacional para a moda, uma celebração das grandes invenções do mestre. Dior foi e ainda é descrito como um Alexandre, um César, um Napoleão ? enfim, o imperador da moda. Seu reinado durou apenas dez anos (Dior estourou em 1947 e morreu de enfarte em 1957), mas seu legado é incontestável.
Os produtos que levam a sigla CD são vendidos em centenas de países e rendem mais de 1,7 bilhão de euros por ano. ?Até hoje o mundo se curva ao mito Christian Dior?, resume Carlos Ferreirinha, consultor do mercado de luxo. Dior é uma lenda não só pelas suas criações, mas também por ter transformado a alta costura em uma indústria extremamente lucrativa no pós-guerra. ?Houve uma demanda maior por produtos de moda na época de Dior?, diz a consultora de estilo Danielle Ferraz. Durante o seu reinado, Christian Dior desenhou 16 mil croquis, entregou 100 mil vestidos e confeccionou 1,5 milhão de metros de tecidos. Outra façanha do estilista foi transportar a elegância e o glamour de suas roupas para acessórios e perfumes da marca, como a lendária fragrância Miss Dior, cuja nova garota propaganda é Rieley Keough, neta de Elvis Presley. Ao morrer, com apenas 52 anos, deixou aberto o campo para que outros monstros da tesoura e do dedal despontassem. Depois dele, na CD, vieram Yves Saint Laurent, Gianfranco Ferré e, mais recentemente, John Galliano.
A marca Dior foi comprada em 1987 pelo bilionário francês Bernard Arnault. Ela foi a primeira de uma série de empresas adquiridas pelo magnata, na criação do conglomerado de luxo Louis Vuitton Moët Henessy, o LVMH. Por mais de uma década, a Dior apresentou números deficitários. A casa viu-se então num dilema que acomete as principais empresas que sobrevivem da identidade de seu criador mas não sabem como mantê-la. Dior não era mais Dior. Mas, em 1997, Galliano foi contratado e revolucionou a grife. ?Ele resgatou o DNA da Christian Dior?, diz Luciane Robic, diretora do Instituto Brasileiro de Moda. ?Trouxe modernidade sem perder a tradição.?
Com Galliano, os tempos áureos do rótulo CD voltaram e as vendas explodiram no mundo inteiro. ?Das 180 lojas da grife espalhadas ao redor do planeta, a dos Jardins, em São Paulo, está entre as 50 mais lucrativas por metro quadrado?, diz Rosângela Lyra, diretora geral para Dior Brasil. Os números apresentados no último balanço são claros. Atualmente, as roupas e acessórios rendem 595 milhões de euros por ano e os cosméticos tornaram-se a galinha dos ovos de ouro, com um faturamento de 1,1 bilhão de euros. É uma família de sucesso avassalador, que puxa a locomotiva. ?Galliano desenha até os frascos de perfumes da marca?, diz Evelyze Britto, diretora geral da LVMH Parfums no Brasil. É, numa tendência que faz respirar o mercado de luxo, a união da eterna boa imagem das roupas com os acessórios e cosméticos. Para manter vivo o fenômeno, a CD investe mais de 200 milhões de euros em desenvolvimento e marketing. É aquele New Look de 1947 que parece não envelhecer, nunca.
A GRIFE NO MUNDO
? 180 lojas próprias
? e 595 milhões é o faturamento com a divisão de roupas
? e 1,1 bilhão é o faturamento com cosméticos
? e 200 milhões é o investimento em marketing e desenvolvimento de produtos