Em 2008, às vésperas da grande crise financeira internacional, a Vale anunciou a construção de 19 meganavios cargueiros para transportar para o Exterior o minério de ferro extraído de suas minas no Brasil. Com capacidade para 400 mil toneladas, um pouco menos do que o triplo da dos cargueiros convencionais, as superembarcações, batizadas de Valemax,  foram encomendadas a dois estaleiros, um chinês e outro coreano, ao custo de US$ 2,35 bilhões. A justificativa, à época, era garantir à mineradora brasileira a oferta de transporte necessário para levar a matéria-prima aos seus principais mercados, em particular o da China, que absorve cerca da metade de sua produção. De quebra, a empresa reduziria a dependência das transportadoras internacionais. O primeiro Valemax foi entregue à Vale em maio deste ano. 

No dia 24 daquele mês, ele zarpou rumo à China, mas até agora, passados seis meses, o barco não chegou ao seu destino, de acordo com reportagem publicada pelo jornal O Estado de S.Paulo, em sua edição da quinta-feira 24. Segundo a publicação, o motivo foi prosaico: a Vale simplesmente se esqueceu de perguntar aos russos, digo, chineses, se poderia atracar um cargueiro com aquelas proporções em seus portos. Baseados na legislação local, que estabelece o limite de carga por navio em 300 mil toneladas, por razões de segurança e ambientais, os armadores daquele país, que ficaram contrariados com a decisão da Vale de construir os Valemax, pressionaram o governo de Pequim a não abrir exceção para seu parceiro da América do Sul. Discretamente, a Vale está tentando se livrar do mico marítimo. Em setembro, sem grande alarde, a companhia anunciou que arrendaria ou venderia os 19 cargueiros, ao mesmo tempo que informava estar em negociações com armadores chineses. 

 

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Dificilmente, porém, deverá recuperar a dinheirama separada para custear essa empreitada cujos responsáveis têm nome e sobrenome conhecidos  e estão por aí. Caso esse episódio tragicômico ocorresse numa estatal, como a Petrobras,  seguramente o tema estaria nas primeiras páginas do noticiário da imprensa brasileira, como um exemplo a mais da irresponsabilidade, da falta de capacidade e de visão do pessoal que trabalha nas empresas do setor público, geralmente vistas como cabides de emprego e mecas do aparelhamento político. No entanto, esse furo n’água não pode passar em brancas nuvens. Em especial,  é preciso saber o que tem a dizer o senhor Roger Agnelli, que em 2008 estava na plenitude do exercício de seus poderes à frente da Vale, onde ficou até o primeiro semestre deste ano, quando transmitiu a presidência ao  executivo Murilo Ferreira. 

 

Celebrado por ter transformado a maior mineradora do mundo numa máquina de fazer dinheiro, com um faturamento de US$ 46,5 bilhões, em 2010, e aumentado seu valor de mercado de US$ 9,2 bilhões para US$ 176,2 bilhões, nos dez anos em que ficou no posto, Agnelli seguramente foi muito bem recompensado por esses feitos. Seus salários e bônus milionários se situavam entre os mais vistosos do mercado. A questão que não quer calar é: e agora, como é que fica? Quem é que deve assumir a responsabilidade e pagar o prejuízo de uma decisão desastrada desse naipe? O executivo e sua equipe, que decidiram fazer a encomenda bilionária, ou a fatura recairá sobre  a empresa e sobre os milhares de acionistas que acreditaram nela?