O Grupo Ipiranga fechou 2005 com faturamento recorde de R$ 28 bilhões, obtendo lucro líquido de R$ 518 milhões. São números robustos, sem dúvida. Mas apesar das cifras, nem tudo vai bem na Ipiranga. Ela não consegue se livrar de alguns fantasmas. O mais recente deles é o risco de perder sua força no setor petroquímico caso não aumente sua participação acionária na Copesul, a central de matéria-prima que ela divide com a Braskem e a Petrobras. Há ainda fantasmas mais antigos, como a eterna briga dos acionistas. Nesse cenário, cabem duas perguntas: Como uma empresa cujos controladores vivem às turras e não se cansam de medir forças internamente consegue números tão vistosos? E como uma empresa com números tão vistosos não encontra comprador, já que está à venda há pelo menos cinco anos?

Cinco famílias comandam a Ipiranga ? Gouvêa Vieira, Tellechea, Bastos, Mello e Osmazabal. O problema começou quando os Osmazabal e os Mello resolveram vender o negócio, em 2001, e a oposição dos demais clãs tornou tensa a convivência no ?board?. Desde então a Ipiranga já ?flertou? com a Agip, a Repsol e a PDVSA. Sem sucesso. O preço, estimado em R$ 3,7 bilhões, é tido como o maior empecilho.

O alívio da Ipiranga é que a companhia tem pontos fortes capazes de superar suas desavenças societárias. O principal deles é a área de distribuição, responsável por 81,6% da receita do grupo. A bandeira Ipiranga está na fachada de 4.221 postos, que respondem por 23,6% do comércio de combustíveis e lubrificantes do País. Acima dela só aparece a Petrobras BR, com 40%. Esses trunfos, porém, podem não ser suficientes para evitar um novo imbróglio: a Ipiranga pode ser isolada na reestruturação societária da Copesul. A planta, localizada no pólo petroquímico de Triunfo (RS), é avaliada em US$ 2 bilhões.

Braskem e Ipiranga detém 29,46% cada uma da Copesul. A Petrobras tem outros 15,63% e deve decidir até 31 deste mês se fica ou sai do negócio. A eventual saída da estatal forçará a Ipiranga a desembolsar milhões de dólares para manter seu feudo na central. Trata-se de um ativo estratégico para quem tem a pretensão de dar as cartas ? ou no mínimo não encolher diante da cada vez mais poderosa Braskem ? no setor petroquímico.

Procurada pela DINHEIRO, a direção da empresa não quis se pronunciar. No entanto, em recente entrevista aos jornais, Paulo Magalhães, dirigente da Ipiranga Petroquímica, deixou claro que não há dinheiro em caixa para essa eventualidade. O executivo conta com uma linha de crédito pré-aprovada de US$ 150 milhões no International Finance Corporation. Outros R$ 400 milhões viriam da emissão de debêntures. Uma operação que pode não ser tão simples quanto Magalhães gostaria, já que as disputas familiares e a falta de transparência resultante disso podem afastar os investidores.

E não há sinais de que essa questão esteja prestes a ser resolvida. As brigas internas e a dificuldade em conseguir um comprador fizeram com que a Ipiranga se fechasse. Em agosto último, o alto escalão do grupo se reuniu com profissionais do mercado no auditório da Bolsa de Valores de São Paulo. ?Foi o primeiro encontro desde 1988?, critica Milton Luiz Milioni, presidente da Apimec, entidade que congrega os analistas de investimento. A maioria das empresas de capital aberto cumpre esse ritual pelo menos uma vez por ano. Pedro Paulo Silveira, analista da consultoria Global Invest, é mais enfático. ?A falta de transparência faz com que os papéis da Ipiranga sejam classificados como de elevado risco?, opina. Isso, não custa lembrar, apesar dos números recordes que ela continua mostrando. No mercado, especula-se que a Braskem gostaria de assumir integralmente a parte da Petrobras para fazer as coisas do seu jeito, sem depender do aval da tumultuada Ipiranga e, depois, quem sabe, avançar sobre a parceira. Dinheiro não seria problema para a Braskem pôr seu plano em prática, afinal ela é filhote da Odebrecht, um dos maiores grupos empresariais do continente. É uma situação, enfim, que não permite que a Ipiranga comemore plenamente seus feitos de 2005. O ganho de hoje pode virar pó amanhã.