09/02/2005 - 8:00
“Obsessivo, Serra liga para dizer onde há buracos e lixo. E cobra as providências”
“Silvio Santos, com seu novo centro de lazer, pode se tornar um grande parceiro”
DINHEIRO ? Como o sr. encontrou o caixa da principal região administrativa de São Paulo?
ANDREA MATARAZZO ? Arrasado. O buraco, aqui, é de mais de R$ 5 milhões. Empresas terceirizadas de segurança e transporte ficaram até cinco meses sem receber. Serviços básicos como o corte de grama foram paralisados desde setembro. Muitas áreas foram abandonadas. Internamente, me dizem que temos 1,3 mil funcionários e outros 3,8 mil para as tarefas externas, mas não estou certo. Já estamos fazendo um recadastramento. Me parece que há contínuos demais e cortadores de grama de menos. Faz muitos anos que o pessoal não recebe treinamento de atualização. Queremos retomar esses programas, para motivar o funcionalismo. Essa Subprefeitura tem 60 veículos, mas como eles não foram sendo renovados criou-se aqui uma oficina de manutenção, que tem alto custo. Isso não tem sentido. Precisamos fazer remanejamentos e racionalizações. O que houve aqui foi má gestão.
DINHEIRO ? Tudo está errado, é isso?
MATARAZZO ? Sou contra esse negócio de chegar num lugar e dizer que nada funciona. Aqui, de um modo ou de outro, o fato é que as guias, as autorizações e muitos serviços continuaram a ser feitos, apesar do caos administrativo. Há funcionários abnegados que carregaram o piano. A questão é que tem coisas que não se justificam, especialmente com a quantidade de taxas e impostos que os cidadãos pagam. Eu pergunto: o que melhorou na limpeza da cidade, nos últimos dois anos, com a implementação da taxa do lixo? Nada. São Paulo vem sofrendo com a imposição de taxas e aumento de impostos há dez anos, mas a sociedade não vê benefícios.
DINHEIRO ? Mas a taxa do lixo vai continuar nesta administração.
MATARAZZO ? A diferença é que agora haverá mais empenho na sua utilização. O prefeito José Serra é obsessivo. Ele telefona para dizer onde há buracos e lixo acumulado. Em seguida, liga para cobrar as providências. Na minha área, quero usar as diferentes ONGs que se ocupam do centro da cidade para serem detectores de problemas. Não se pode mais aceitar a situação de jogar colchões, sofás, mobílias inteiras nas ruas. A cidade é enorme; nós não vamos conseguir achar todos os problemas e resolvê-los no dia seguinte. Mas se nos informarem sobre onde eles estão, a gente vai atrás para resolver.
DINHEIRO ? Como tapar o buraco financeiro?
MATARAZZO ? A questão dos pagamentos do passivo está sendo equacionada pela Secretaria das Finanças. O prefeito determinou essa centralização exatamente para pôr a casa em ordem. O problema é que também lá não havia um centavo no cofre, e os fornecedores precisarão ter um pouco de paciência até o fluxo de pagamentos se normalizar. O orçamento desta Subprefeitura é de R$ 145 milhões para este ano, mas esse dinheiro ainda não existe.
DINHEIRO ? Sem dinheiro, o que fazer?
MATARAZZO ? Nossa meta é fazer mais com menos. A população é o grande cliente, e os empresários são os nossos principais parceiros. Eles vão nos ajudar a salvar São Paulo. Temos de ser criativos na busca de soluções e obsessivos na realização de alianças e parcerias entre o poder público e a iniciativa privada. Encontrei muitas áreas abandonadas, mas a sorte é que o setor privado de São Paulo tem uma vitalidade excepcional. É fácil ver isso. A menos de cem metros desta sede há um hotel todo em granito, com vidros espelhados, muito bem construído. À volta não há equipamento público nenhum, mas o hotel está sempre cheio. E por quê? Porque perto dele há uma rua de compras, que atrai consumidores de todo o interior do Estado e de várias partes do Brasil. Nessa região central também há um drive range de golfe com 70 estações e dois andares. Isso a gente só vê igual nos Estados Unidos. São provas de que a economia privada revitaliza a cidade. Cabe à Prefeitura apoiar esse crescimento.
DINHEIRO ? Como?
MATARAZZO ? Os empresários de São Paulo me conhecem, sabem que é fácil falar comigo, basta telefonar. Vou aproveitar os meus contatos para pedir ao pessoal para ajudar na preservação de espaços públicos. Já falei com os dirigentes da Bolsa de Valores, da Bolsa de Mercadorias & Futuros e do Banco Santander, três grandes instituições com sedes aqui no Centro, para ver como eles podem ajudar na preservação de praças, jardins, ruas e participar de um plano de intervenções urbanas. Noto que todo mundo quer ajudar. Quero atrair segmentos econômicos novos para o Centro. Já temos transporte e infra-estrutura de comunicações, com fibra ótica em praticamente toda a região. Estamos pensando em abrir concessões para estacionamentos subterrâneos. Também é nossa intenção trazer os jovens para o Centro.
DINHEIRO ? Por que os jovens viriam para esta região?
MATARAZZO ? Para ter uma alternativa de lazer, por exemplo. Estou conversando com a associação dos corredores para promover corridas a pé nos finais de semana. Jovem gosta de esporte. Com essas corridas, teremos mais gente olhando o centro da cidade, num circuito pelas ruas históricas. Estamos estudando abrir o Mercado Municipal à noite, para ser mais um pólo de atração. O grupo Silvio Santos está criando um núcleo de lazer aqui no Centro, o que só ajuda. Pode se tornar um grande parceiro. Universidades também são bem-vindas nesta área.
DINHEIRO ? Já há algum contato objetivo?
MATARAZZO ? Sim. Uma grande universidade me procurou com a intenção de montar um campi. O único pedido foi a regularização dos papéis dos imóveis que eles estão interessados em comprar. Prestar esse serviço é nossa obrigação. Isso é ótimo porque uma universidade funciona nos três períodos, atrai e fixa o jovem, que tem a tendência de morar perto de onde estuda, e espraia movimentação econômica. Noutra frente, uma fundação também me procurou interessada em assumir o Hospital Matarazzo.
DINHEIRO ? Quem mais o sr. quer atrair?
MATARAZZO ? A idéia é mudar um pouco o perfil do público do Centro. Sei que agências de publicidade, produtoras de vídeo e de cinema têm interesse em vir para cá, mas nós temos de dar as condições mínimas para que seus funcionários, clientes e fornecedores possam circular pelas nossas ruas. Os calçadões, quando foram feitos nos anos 70, se mostraram uma ótima solução urbanística, mas hoje eles merecem uma revisão. Não estou dizendo que temos de acabar com eles, mas eles podem ganhar um outro caráter, talvez ficarem um pouco menores e terem sua vocação de ruas de serviços acentuada.
DINHEIRO ? Dá para aumentar a circulação de automóveis e preservar o patrimônio histórico?
MATARAZZO ? Com inteligência e disciplina, dá. O centro histórico de Roma é todo ele preservado, mas se pode circular de carro, com limitações, por todas as suas áreas. O que há, ali, é uma férrea disciplina quanto a não permitir que automóveis atrapalhem a entrada dos hotéis nem prejudiquem o acesso às áreas tombadas. Também existe um cumprimento rigoroso de normas que impedem a poluição visual de toda a área. É um bom modelo.
DINHEIRO ? A administração anterior deixou em plena execução um convênio de US$ 100 milhões com o BID para a revitalização do Centro histórico. Como o sr. vai gerir essa fortuna?
MATARAZZO ? Esse contrato já serviu para a realização de obras como a recuperação do Mercado Municipal, mas é preciso observar que ele demanda uma contrapartida do tesouro municipal que, neste momento, não estamos em condições de enfrentar. Tem de sentar e olhar projeto por projeto, rever as prioridades. Esta sede, por exemplo, está numa das portas de entrada da cidade. Aqui, a Prefeitura tem 180 mil metros quadrados. Cabe, sem dúvida, um grande projeto de urbanização e ocupação, que vai influenciar todo o restante do Centro. Enquanto o caixa municipal se reorganiza, o que temos a fazer aqui é reestudar as prioridades para a utilização desses recursos.
DINHEIRO ? O PT procurou ocupar prédios antigos com moradias subsidiadas. Essa iniciativa pode ser repetida?
MATARAZZO ? O que eu gostaria mesmo é de ver a classe média voltar ao Centro, comprando os imóveis e usando o seus equipamentos. A moradia social é importante, mas não vamos investir só nisso.
DINHEIRO ? São Paulo tem problemas aparentemente insolúveis como os camelôs, o elevado Minhocão que desvalorizou imóveis, a população que mora nas ruas, as calçadas esburacadas… Vai dar para resolver tudo?
MATARAZZO ? Seremos ousados e organizados. Vamos recadastrar os camelôs e disciplinar sua atuação. Junto com a área de assistência social, estamos preparando uma política mais agressiva de albergues, para dar abrigo ao menos a uma parte da população que dorme nas ruas. A Praça da Sé, onde muitas vezes há flagrantes de uso de drogas entre menores, enfrenta uma triste deterioração. Queremos mudar o seu formato. Há a intenção de quebrar os seus desníveis, que hoje funcionam como esconderijos, e torná-la mais aberta e segura. Não dá para pensar em derrubar o Minhocão, mas é perfeitamente possível colocar nele aquelas proteções laterais que diminuem a poluição sonora, visual e até ambiental nas suas vizinhanças. Quanto às calçadas, sua preservação é responsabilidade dos proprietários de imóveis. Há muito o que fazer, por isso temos de ser obstinados nas parcerias, para que a iniciativa privada nos ajude a resolver os problemas e colha os frutos das soluções. Uma série de ações localizadas vai dar grandes resultados.
DINHEIRO ? Já existem mais idéias?
MATARAZZO ? Muitos equipamentos culturais estão aqui. A Pinacoteca, a Sala São Paulo, o Centro Cultural. Já entrei em contato com a Secretaria de Educação para levar todos os alunos de escolas municipais dessa região a visitas a esses pólos culturais. Para o grande público, seria bárbaro se uma empresa colocasse sua marca em microônibus que circulassem pelos equipamentos culturais do Centro. Poderíamos ajudar essa empresa a conseguir as autorizações necessárias; em troca ela exibiria sua marca num ônibus que, sem dúvida, teria grande simpatia da população. É uma bela propaganda.
DINHEIRO ? Quer dizer que o sr. está aberto a idéias?
MATARAZZO ? Quem quiser ajudar na revitalização do Centro, é só me procurar. Estou botando a cabeça para trabalhar e os amigos para pensar e agir, também. Você sabia que o Hotel Jaraguá vai colocar carruagens para levar seus hóspedes a passear pelo Centro histórico, como em Nova York? É uma grande idéia. Chama gente, dá charme e humaniza o Centro.