Na noite da quarta-feira 19, Alexandre Tombini passou pelo seu primeiro teste como presidente do Banco Central. O aumento de 0,5 ponto percentual na taxa básica de juros, agora em 11,25% ao ano, não agradou aos representantes da indústria, que reclamaram prontamente. Mas mostrou que, no governo da presidente Dilma Rousseff, o Banco Central continua comprometido com a estabilidade econômica e vai se esforçar para conter a alta da inflação mesmo correndo o risco do prejuízo em popularidade. 

 

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Tombini também colocou em prática a afirmação que fez quando foi escolhido para o cargo, em dezembro: de que o BC de Dilma teria autonomia operacional para cumprir sua missão de proteger a moeda. 

 

No que poderia ser chamado de “o paradoxo de Tombini”, a alta dos juros não desestimula os investimentos. Porém, ajuda a calibrar o crescimento. “A economia está superaquecida. A prova disso é que falta mão de obra em todos os setores”, disse o economista José Roberto Mendonça de Barros.

 

O resultado da combinação do aquecimento doméstico com as cotações das commodities em alta no mercado internacional é uma inflação bem acima da meta de 4,5% ao ano – com margem de dois pontos para cima e para baixo, perseguido pelo BC. 

 

Os economistas ouvidos semanalmente pelo Banco Central vêm revisando suas projeções para cima há seis semanas consecutivas e na semana passada esperavam que o IPCA fechasse o ano em 5,42%. 

 

Neste cálculo, eles também consideram que o governo vai atuar para contrair a demanda, elevando os juros para 12,25% até o fim do ano. Ainda assim, esperam um crescimento de 4,5% para a economia em 2011. 

 

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Nova reunião, velha decisão: os economistas Fernando Sampaio e José Roberto Mendonça de Barros

endossam a estratégia do Copom de elevar os juros para conter a disparada dos preços

 

“Somando a alta das commodities com as particularidades da economia brasileira, com desemprego baixo e baixa capacidade ociosa, a situação está ficando apertada”, diz o economista Fernando Sampaio.

 

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, argumenta que a alta dos preços é limitada às commodities, que as cotações internacionais têm um impacto pequeno no custo de vida do brasileiro, e que esses valores já estão recuando. 

 

Mas não é o que pensam os analistas de fora do governo. “O argumento do ministro é incompleto. Os preços internacionais não vão cair rapidamente, porque os estoques mundiais estão baixos e existe uma demanda gigantesca no mundo, especialmente na Ásia”, diz Mendonça de Barros. 

 

A demanda deve crescer ainda mais com a retomada da economia dos EUA, que pode crescer até 4% neste ano. O crescimento só não é forte na Europa, mas a China divulgou na quinta-feira 20 expansão de 10,3% em 2010.

 

O que preocupa os economistas de dentro e de fora do BC é o risco de proliferação da alta dos preços. “É preciso evitar que esta alta das commodities contamine os contratos”, diz o economista Roberto Padovani, economista-chefe do West LB. Com o desemprego abaixo de 6% e a renda do trabalhador em alta, o que começa como alta localizada de preços pode se espalhar via aumento de salários.

 

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O problema é que o velho remédio de aumentar os juros tem suas limitações. É preciso também mostrar a mudança na política fiscal frouxa dos últimos anos. “A redução dos gastos públicos está prometida, mas não foi entregue”, diz Mendonça de Barros, revelando o ceticismo que ainda atinge parte dos analistas. 

 

A presidente já prometeu um corte rigoroso nas despesas do governo, mas não se comprometeu com um número. Os dados ainda estão sendo analisados e só devem ser divulgados em fevereiro.

 

Juros mais altos, bancos mais seletivos à concessão de crédito, dólar desvalorizado em relação ao real, desaceleração do consumo e crescimento menor do Produto Interno Bruto (PIB). 

Todas as projeções macroeconômicas para este ano poderiam ser motivo para desencorajar os empresários a investir. Hoje não são. Em 2011, as companhias atingirão o maior nível de investimento da história, segundo estudo da Confederação Nacional da Indústria divulgado na última semana. 

 

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Das 454 empresas ouvidas pela CNI, o investimento médio de cada uma delas em 2011 será de R$ 6,7 milhões, 7%  acima dos R$ 6,3 milhões do ano passado. Essa projeção inclui desde grandes investimentos – como a fábrica de US$ 400 milhões da chinesa 

Chery, em Jacareí (SP) – até as pequenas quantias. Além disso, 92% das empresas pretendem expandir a capacidade produtiva ao longo do ano e lançar novos produtos, percentual que era 89,6% em 2010.

 

Otimismo exacerbado? Ao que tudo indica, não. A expectativa de crescimento do PIB entre 4,5% e 5% neste ano é vista por grande parte do empresariado como um indicador até mais positivo do que os cerca de 7,5% de 2010 – o número oficial será confirmado pelo IBGE apenas no início de março. 

 

“A expansão da economia do País no ano passado é comparada a um ano de crise, em 2009, quando o crescimento ficou um pouco abaixo de zero”, diz o gerente-executivo de pesquisa da CNI, Renato da Fonseca. “Para a indústria, 4,5% sobre 7% é mais do que 7% sobre zero”, explica o presidente da entidade, Robson Andrade.

 

Fora das equações matemáticas de crescimento, e a julgar pela recente performance industrial, as projeções positivas não são exageradas. Entre janeiro e novembro de 2010, o ritmo da atividade industrial ficou 10,4% acima do mesmo período de 2009.  O número de empregados cresceu 5,4 % no período, enquanto a massa salarial aumentou 6,5%. Por quê? Setores importantes da economia, como construção civil, automobilístico e metalurgia fizeram grandes contratações e, num inédito rally por mão de obra, promoveram altas recordes de salários. 

 

“Estamos vivendo o melhor momento da história da economia brasileira. Nunca as empresas cresceram tanto. Nunca os trabalhadores tiveram um cenário tão favorável”, disse Cledorvino Belini, presidente da Fiat do Brasil e da Anfavea, entidade que 

representa as montadoras.

 

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Consumo e crescimento: para o presidente da CNI, Robson Andrade, expansão de 4,5% do

PIB em 2011 deve continuar puxando a produção industrial e os investimentos no País

 

A euforia das grandes companhias reflete a empolgação das empresas menores. A Grob, fabricante de máquinas, deverá dobrar a produção em 2011, inclusive voltando a exportar para mercados como a Argentina. 

 

“Estamos acompanhando o crescimento das vendas recordes de veículos e a rápida expansão da produção brasileira”, diz o presidente Michael Bauer. “Um cenário menos favorável em 2011 não representa um ambiente ruim para os negócios.”

 

A razão que sustenta o otimismo das empresas em 2011, apesar do cenário menos positivo, tem nome: consumo. Alimentado por um mercado de trabalho aquecido – que mantém a taxa de desemprego no nível mais baixo já registrado, em 5,7% – a demanda interna continuará como a locomotiva do crescimento. 

 

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A expectativa do mercado para a Selic ao final deste ano, publicada no último Boletim Focus do BC, indica uma taxa básica em 12,25% em dezembro. Em outras palavras, a alta em 0,5 ponto percentual da Selic na quarta-feira 19 já era aguardada pelo mercado. As boas projeções não estão apenas nas opiniões. 

 

A maior instituição financeira do País, o Banco do Brasil, tem hoje R$ 65 bilhões em análise de pedidos de financiamento – R$ 20 bilhões serão liberados pelo BB ao longo do ano. 

 

“Nunca tínhamos tido uma concentração tão grande de projetos de investimento. Afinal, R$ 65 bilhões é um número muito bom”, disse o presidente do BB, Aldemir Bendini. Mais um reforço ao “paradoxo de Tombini”.

 

Com Denize Bacoccina