O segundo mandato da presidenta Dilma Rousseff começou muito antes do que todos esperavam. Seu início foi na noite da quarta-feira 29, quando o Comitê de Política Monetária (Copom), presidido por Alexandre Tombini, elevou, por cinco votos a três, a taxa referencial de juros Selic para 11,25% ao ano após sete meses de estabilidade. Outra indicação de que o segundo mandato começou mais cedo, e será difícil, veio do front político. Na terça-feira 28 a Câmara dos Deputados rejeitou o projeto do governo que estabelece que as decisões sobre políticas públicas sejam submetidas a conselhos populares.

No dia seguinte, Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, afirmou que os senadores deverão ratificar a decisão. Como resultado, na manhã da quinta-feira 30, os mercados viveram um momento de euforia. O dólar caiu mais de 2% em relação à quarta-feira e o Índice Bovespa chegou a subir 2,5%, depois de uma semana de forte volatilidade. O melhor exemplo da incerteza foram as ações da Petrobras. Na segunda-feira 27, primeiro pregão após a reeleição, elas fecharam com queda de 13%, após recuarem 16,25% no pior momento do dia. A tensão foi tanta que os negócios com esses papéis totalizaram R$ 3,04 bilhões, 86% mais que a véspera.

A comemoração do mercado parece estar fora de lugar. Pela análise acadêmica clássica, não faz sentido elevar juros quando a economia está em desaceleração. Da mesma forma, dificuldades do Executivo no Congresso são sinais ruins para a economia. No entanto, a interpretação foi justamente a inversa. Para os investidores, o movimento do BC significa que o governo vai passar, ainda neste ano, a adotar uma atitude mais rígida em relação à inflação. “Em si, a alta dos juros foi pequena, mas ela sinalizou para o mercado que o Banco Central deverá voltar a perseguir o centro da meta”, diz Nicola Tingas, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi).

“O cenário político mais difícil sugere que, neste novo mandato, Dilma poderá ter de retomar algumas disciplinas econômicas que foram se perdendo nos últimos anos”, diz o economista gaúcho Valter Bianchi, sócio da gestora Fundamenta Investimentos, com sede em Porto Alegre. Outro motivo para a alegria dos investidores foi o presente de Natal antecipado entregue por Janet Yellen, presidente do Federal Reserve, o BC americano. Também no dia 29, Yellen confirmou o fim do programa de recompra de ativos que injetou US$ 1,5 trilhão na economia americana ao longo dos últimos três anos.

No entanto, para alegria dos investidores, o Fed também informou que os juros referenciais nos Estados Unidos, atualmente ao redor de zero, ainda vão demorar alguns meses para começar a subir. As primeiras reações das empresas foram positivas. Ao anunciar os resultados do Bradesco para o terceiro trimestre, Moacir Nachbar, diretor-executivo-adjunto do banco, comemorou a decisão. “Foi uma medida bem pensada pelo Banco Central”, diz ele. “O principal componente nem é o fato de os juros terem subido, mas o sinal de confiança passado ao mercado, de que as medidas estão indo no caminho adequado.”

Segundo o executivo, a concorrência forte reduz a probabilidade de que o aumento seja repassado para os consumidores. Os papéis dos bancos lideraram a alta na manhã da quinta-feira: até o meio-dia, as ações de Itaú, Bradesco e Banco do Brasil subiam, em média, 7%. A alta da bolsa e a queda do dólar na quinta-feira, porém, não devem ser encaradas como o início de uma trajetória suave. Ao contrário, os prognósticos são de fortes solavancos pela frente. A alta dos juros foi considerado um passo na direção certa, mas não o único necessário. “A grande questão que se coloca para o segundo mandato de Dilma Rousseff é como será tratada a questão fiscal”, diz Tingas.

Ela é fundamental para a manutenção do grau de investimento para os títulos da dívida brasileira. Uma deterioração das contas públicas vem ocorrendo lenta e gradualmente desde o início do ano. Entre maio e agosto, o governo central apresentou sucessivos déficits primários, e a expectativa na quinta-feira 30 era de mais um resultado negativo em setembro, o que ameaça a boa classificação de risco do Brasil. “A perda do grau de investimento afetaria a capacidade de o Brasil atrair os dólares que necessita para equilibrar o balanço de transações correntes, e isso seria um fator de enorme desconforto para o mercado”, diz Tingas. Cautela, portanto.

Colaboraram: Natália Flach e Luiz Gustavo Pacete