04/07/2025 - 16:16
Embora a atitude da sociedade em relação aos abertamente LGBTQ+ tenha melhorado, a Ucrânia ainda não garante a plena igualdade de direitos.”Toda a minha vida fui aberto quanto à minha orientação sexual”, diz Roman Abrashyn, piloto de drones homossexual de 25 anos do Exército ucraniano. Quando ele se assumiu aos 15 anos de idade, recebeu o apoio de amigos, pais e dois irmãos, um dos quais agora serve na mesma unidade que Abrashyn.
Em abril de 2024, o jovem se inscreveu para servir nas Forças Armadas ucranianas. Inicialmente, Abrashyn não enfrentou quase nenhum preconceito ou discriminação. Quando as pessoas ao seu redor no Exército souberam de sua orientação sexual, a maioria reagiu de forma neutra. “Não houve perguntas estranhas”, diz Abraschyn. No entanto, ele está preocupado com o fato de que, embora existam centenas de soldados abertamente LGBTQ+ no Exército ucraniano, eles não gozam dos mesmos direitos que seus colegas heterossexuais.
Parceiros sem direitos
Em um prédio sem adornos, os soldados da unidade de Abrashyn se instalaram entre caixas cheias de drones. O próprio Abrashyn é o comandante de um grupo de pilotos de drones que trabalham principalmente em porões, pois são constantemente perseguidos pelo inimigo.
Abrashyn recentemente começou a namorar um civil, mas não é possível o registro de casamentos homossexuais na Ucrânia. Ele reclama que seu parceiro não tem direito a indenização no caso de sua morte. “Mesmo que eu esteja em tratamento intensivo, ele não tem direitos”, diz o soldado, que acha isso uma injustiça. “Lutamos como todo mundo, mas não somos legalmente iguais”, lamenta.
O projeto de lei sobre parcerias registradas, que vem sendo discutido há mais de dois anos nos comitês do Parlamento ucraniano, é uma das principais demandas da comunidade LGBTQ+ na Ucrânia. Essa lei permitiria, por exemplo, que os parceiros recebessem informações de médicos e herdassem ou recebessem benefícios sociais em caso de morte.
O projeto de lei foi apresentado pela deputada da oposição Inna Sowsun. Em uma entrevista à DW, ela disse que a lei está sendo bloqueada pelo Comitê de Assuntos Jurídicos. Segundo ela, o Parlamento é bastante conservador – pouco menos de um terço dos deputados é categoricamente contra parcerias civis registradas, enquanto pouco mais de um terço é a favor. Os demais estão hesitantes, preocupados com a reação da opinião pública e dos colegas, ou não têm opinião alguma. “Essa é uma questão urgente para os soldados LGBTQ+, porque suas vidas estão sempre em perigo”, diz Sowsun.
Intimidação e ameaças
Dmytro, de 19 anos, está servindo no Exército há cerca de um ano. Ele se descreve como assexual, gosta de homens e mulheres e busca relacionamentos românticos em vez de sexuais. Quando a orientação de Dmytro se tornou conhecida em sua brigada, houve problemas. “Fui ameaçado com violência física”, reclama. Em um bate-papo a que a reportagem da DW teve acesso, um camarada o aconselha a “procurar outra unidade” e ameaça explicar os motivos “claramente, para que isso seja lembrado por muito tempo”.
Esse tipo de assédio levou Dmytro a tentar suicídio, mas os médicos salvaram sua vida. Só então ele registrou uma queixa na polícia, sem sucesso. “Até hoje, não houve sequer uma resposta”, lamenta. Por fim, ele conseguiu ser transferido para outra brigada. O jovem diz que também conhece casos de outras unidades em que o comando tentou transferir rapidamente um soldado LGBTQ+ para outro posto de serviço depois de descobrir sua orientação.
Responsabilização por agressões
No entanto, Dmytro diz que as atitudes no Exército estão mudando gradualmente e que ele também já teve experiências positivas na tropa. “Quando o comandante de uma brigada descobriu minha orientação sexual, ele me apoiou e disse que jamais me insultaria ou discriminaria”, diz Dmytro.
Além do projeto de lei sobre parcerias registradas, a comunidade LGBTQ+ ucraniana está insistindo na introdução da responsabilidade criminal por ofensas baseadas em intolerância, especialmente a homofobia. Dmytro critica o fato de que os ataques a pessoas LGBTQ+ são geralmente considerados “hooliganismo” e punidos de forma branda. Uma lei que prioriza crimes de ódio contra pessoas LGBTQ+ tramita no Parlamento desde 2021 e vem sendo discutida desde então.
Opinião da sociedade
O veterano e diretor da ONG “LGBT+ Militares e Veteranos pela Igualdade de Direitos”, Viktor Pylypenko, foi um dos primeiros soldados na Ucrânia a admitir abertamente sua homossexualidade. Ele apela para que o Parlamento pare de atrasar as leis de apoio à comunidade LGBTQ+. Pylypenko reclama que os políticos estão sempre dizendo que a sociedade ucraniana não está pronta para mudanças, o que ele não consegue entender.
O ativista ressalta que, de acordo com pesquisas, o apoio às pessoas LGBTQ+ está aumentando. De acordo com um estudo realizado pelo Kyiv International Institute of Sociology (KIIS) em junho de 2024, mais de 70% dos ucranianos são a favor de que as pessoas LGBTQ+ tenham os mesmos direitos que todos os cidadãos. De acordo com a mesma pesquisa, 14% têm uma atitude positiva em relação à comunidade LGBTQ+, 47% uma atitude neutra e 32% uma atitude negativa. O último indicador está em constante declínio desde 2015.
Ao mesmo tempo, um evento beneficente organizado pela organização KyivPride no início de junho foi acompanhado pelos protestos habituais, embora pequenos. Ativistas fizeram uma manifestação pelos direitos da comunidade LGBTQ+ perto do Ministério das Relações Exteriores em Kiev e coletaram dinheiro para o Exército ucraniano. Os defensores dos valores tradicionais também se reuniram. A Igreja Ortodoxa da Ucrânia criticou posteriormente o fato de a ação LGBTQ+ ter ocorrido perto da Catedral de São Miguel e a descreveu como uma “provocação”.
Quantos militares LGBTQ+ existem?
A ONG liderada por Viktor Pylypenko inclui mais de 600 militares e veteranos. De acordo com seus dados, gays, lésbicas, bissexuais, transgêneros, queer ou assexuais servem em pelo menos 59 unidades do Exército ucraniano. Seu número exato não pode ser determinado, pois muitos não falam sobre sua orientação. Com base em estimativas de outros países, conforme um estudo da ONG de Pylypenko, a proporção de pessoas LGBTQ+ no Exército ucraniano poderia ser de 5% a 10%.
De acordo com Pylypenko, o Exército ucraniano carece de regras contra a discriminação que não só protegeriam melhor os direitos das pessoas LGBTQ+, mas também os de todos os militares. Ele espera que a situação melhore com a planejada criação de um ombudsman militar.
O piloto de drone Roman Abraschyn acredita que quanto mais as pessoas LGBTQ+ falarem sobre si mesmas e seus problemas, mais rapidamente ocorrerão mudanças. “Isso é importante, mesmo que haja uma onda de ódio”, diz ele. O soldado Dmytro concorda com ele. Como a maioria dos soldados, ambos querem que a guerra termine.