04/09/2002 - 7:00
Está chegando no Brasil uma grife tão francesa quanto Michelin, Carrefour e Dior. Pouco conhecida por aqui, a Cetelem é a maior financeira da Europa e a segunda no ranking mundial. É um gigante que atua em áreas variadas, como cartões de crédito, empréstimos ao consumidor e financiamento para a compra de imóveis. A empresa tem negócios em 21 países, mas sua presença no Brasil era muito discreta ? era dona de 40% do cartão de crédito do Carrefour. Agora, essa situação vai mudar. A financeira acaba de montar um novo escritório no Brasil, prepara o lançamento de produtos e serviços e tem planos de uma ousadia extrema. ?Somos desconhecidos no Brasil por pouco tempo?, anuncia Michel Raffaëlli, presidente da empresa na América Latina. ?Seremos uma das maiores financeiras do País dentro de cinco anos.?
A Cetelem tem fôlego para comprar a briga. Dona de ativos
de US$ 25 bilhões, a financeira pertence ao banco francês BNP Paribas. Os franceses da companhia descobriram o Brasil em 1998, quando vieram operar o cartão de crédito do Carrefour, como
parte de um acordo mundial entre as duas empresas. Em pouco tempo, eles perceberam que o negócio era muito melhor do que imaginavam. ?Não tínhamos planos de crescer no Brasil, mas a operação do Carrefour foi uma grata surpresa e despertou nosso interesse?, diz Raffaëlli.
Essa atração se voltou no Brasil especificamente para as áreas
de empréstimos pessoais e crédito direto ao consumidor (CDC), mercados que movimentam R$ 60 bilhões por ano no País. Para disputar esse concorrido território, onde atuam empresas tradicionais como Losango, Fininvest e Finasa, a Cetelem jogou pesado. Investiu US$ 20 milhões na construção de uma poderosa rede de informática, capaz de lidar com o cadastro de 20 milhões de pessoas. ?Trabalhamos com um horizonte de 10 anos. Quando a economia brasileira voltar a crescer, estaremos mais do que prontos para atender a demanda por crédito?, diz Georges Régimbeau, diretor-geral da financeira no Brasil.
O principal instrumento da Cetelem para oferecer crédito no Brasil será o cartão Aura, marca adotada em todos os países de língua portuguesa e espanhola onde a empresa atua. Em todo o mundo, a Cetelem emitiu 13 milhões de cartões, que são aceitos em 250 mil estabelecimentos. Funciona como uma rede própria, com a pretensão de competir no Brasil com bandeiras como Visa e Mastercard. Discretamente, sem fazer alarde, a financeira começou a credenciar lojas no Brasil. Já foram inscritos 500 pontos comerciais. Muitos outros virão para atender os planos da empresa. Até 2007, a Cetelem quer emitir três milhões de cartões para os consumidores no País.
Inadimplência ? Para quem acha que os planos são arriscados demais, num País com economia paralisada e alto nível de inadimplência, Régimbeau tem uma resposta pronta. Ele diz que a empresa fez um estudo sobre as razões da inadimplência no Brasil e descobriu que a maioria dos casos de falta ou atraso de pagamento ocorre quando um cliente pega um empréstimo para pagar outro. Com a Cetelem, diz ele, será diferente. A empresa só emprestará para quem quiser comprar um bem ou pagar um serviço.
Se ainda assim houver dificuldade em receber, a empresa não enviará cobradores enfezados para brigar com os fregueses.
?Em geral, os clientes querem pagar, mas não podem. O nosso pessoal vai até a casa da pessoa para encontrar uma solução,
para negociar, e não para tirar o sangue dele?, diz Régimbeau.
Na Argentina, diz ele, o método funcionou. A taxa de inadimplência da Cetelem recuou numa hora em que os índices de outras financeiras só pioravam.
As iniciativas da nova empresa prometem agitar o já concorrido mercado das financeiras. Nos últimos tempos ocorreram vários negócios de porte. Só o Bradesco incorporou a Continental, a financeira da Ford e o banco Mercantil e relançou a bandeira Finasa, na maior operação do País. O Unibanco comprou a Fininvest e está de olho na Cacique. A briga promete esquentar. ?A Cetelem é uma empresa séria e suas estratégias não costumam ficar só no papel?, diz Boanerges Freire, da consultoria Partner. ?Se eu fosse uma financeira, ficaria preocupado.?