O Airbus 330 disputa espaço com o Boeing 737 na mesa de reuniões. Ao lado, outro avião em miniatura, o Embraer Tucano, aponta o nariz para a parede, onde estão os quadros com homenagens de entidades internacionais da aviação civil. ?Presentes que ganhei ao longo de minha carreira?, avisa o dono do escritório. Ele é Ozires Silva, fundador da Embraer, piloto, ex-presidente da Varig, ex-ministro, doutor em aeronáutica pelo instituto Caltech, na Califórnia. Aos 70 anos, após deixar a presidência da Varig, Ozires poderia tranqüilamente pendurar o quepe. Os amigos incentivam a aposentadoria. Ele dá de ombros aos amigos. Ainda hoje trabalha não menos que doze horas por dia em seu escritório em São Paulo, sempre inventando negócios. Neste momento, por exemplo, deixou um pouco de lado sua grande paixão, a aviação, para respirar novos ares. Anda encantado com a biotecnologia, ciência em moda capaz de abrir mercados bilionários. Ele acaba de montar a empresa Pele Nova, em parceria com 11 sócios: os grupos Takaoka, Delta do Prata e Decisão e investidores individuais. Ozires é dono de 6% das ações, mas apita como majoritário. ?Sou até meio mandão?, confessa. Pois o mandão enxergou nas pesquisas de cientistas de Ribeirão Preto um excelente mercado. A Pele Nova criou o Biocure, medicamento que tem a propriedade da angiogênese, ou seja, forma novos vasos sangüineos e acelera a reconstrução de tecidos humanos. Em outras palavras, é um supercurativo que cicatriza rapidamente feridas crônicas (mal que aflige principalmente diabéticos) e já mostrou eficácia, por exemplo, na reconstituição de tímpanos perfurados. ?O produto poderá beneficiar mais de 5 milhões de brasileiros, sem falar no seu potencial de exportação?, diz Ozires.

A promessa é de chegar ao final de 2004 com uma receita de R$ 70 milhões. E dobrar de tamanho a cada ano. ?É uma meta otimista, mas possível?, afirma Ozires. A Pele Nova nasceu dos estudos da equipe liderada pelo médico paulista Joaquim Coutinho. Foram nove anos de pesquisa até chegar a um produto sofisticado. De acordo com Coutinho, o campo de atuação do ?curativo do século 21? é ilimitado. O produto pode servir não só aos diabéticos, mas também a pessoas com úlcera crônica. ?E no caso da reconstrução de tecidos, o Biocure mostrou melhores resultados do que outros materiais como cartilagem e tecido placentário?, diz Coutinho. A idéia dos parceiros é oferecer um medicamento mais barato que os rivais importados. Há planos ainda de atender a população de baixa renda vendendo o Biocure a bom preço para o Sistema Único de Saúde. O produto aguarda aprovação da Anvisa para ir ao mercado.

O médico encontrou o aviador no ano passado. Ao mesmo tempo em que sua equipe finalizava os estudos do Biocure, Ozires se despedia dos amigos da Varig para pilotar a Academia Brasileira de Estudos Avançados, entidade que tem por objetivo fazer a ponte entre universidades e empresas. Coutinho foi um dos primeiros a bater à porta da Academia. ?O projeto dele casou perfeitamente com nossa idéia de incentivar pesquisas e criar fortes marcas nacionais?, diz Ozires. ?Cite alguma marca brasileira conhecida no exterior. Você vai se lembrar de poucas?. O empresário revela dados do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) para reforçar sua luta pelo desenvolvimento de grifes e tecnologias nacionais. Segundo Ozires, o Brasil gasta cerca de US$ 13 bilhões
ao ano pagando royalties aos estrangeiros. ?Podemos ter a contrapartida se tivermos marcas fortes no mercado internacional.? É isso o que ele sonha para o Biocure e para outros projetos que pousem em seu escritório. Além da biotecnologia, há planos na indústria metal-mecânica e nas telecomunicações, sempre com produtos e métodos inovadores. ?Quero deixar como legado uma
boa raiz para que surja um grande conglomerado nacional com destaque no exterior?, afirma o fundador da Embraer.