Quando aquela bailarina correu pelo picadeiro, o mundo dos negócios, por um momento mágico, pareceu embalado por uma nova cadência onde empresários, seus herdeiros e sucessores haviam se reparado simplesmente naquela condição elementar, e certamente mais sublime, de pais e filhos ? convertidos todos em garotos, encantados como numa tarde no parque. A bailarina abria o espetáculo, organizado literalmente dentro de um circo no amplo salão de convenções e convescotes, e tinha na platéia os tais pais e filhos, representantes da mais nobre estirpe de empreendedores, pilotos de organizações corporativas que juntas faturam na casa dos bilhões. Esses senhores, senhoras e jovens espectadores estavam lá, a cada passo, a cada atividade coletiva, recebendo mensagens, dicas de como seguirem nas mais variadas gestões ? os tais desafios que estão a vivenciar rotineiramente em casa ou no escritório. A atmosfera envolvente, lúdica até, repetia-se nas brincadeiras da piscina, na competição para vencer os 18 buracos do golfe, no futebol, nos testes de trabalho em grupo, no rol de palestras. O que havia de especial naqueles dias de encontro é que as famílias participantes experimentaram o tradicional burburinho de contatos comerciais desta vez com pitadas típicas de descontração e clima de feriado prolongado. É como se ao lado do filho, brincando lá adiante com o herdeiro do concorrente ou parceiro, tudo parecesse mais fácil. E era. Muitos embarcaram na experiência. CEOs vieram de todas as áreas e corporações. Da telefonia (Vivo, TIM, Telefonica) à informática ( SAS, Compuware), empresas de serviços (Amico, Mapfre, Atento, Lincx, Bioritmo, Agaxtur ), de transportes e veículos (TAM, Avis, Unidas, Audi, Sundown, Varig), grandes indústrias (Nivea, Nestlé, Purina, GE, Pepsi, Kodak) e até bancos como o Santander. Presidentes de empresas se multiplicavam, numa concentração rara com oportunidades de igual porte. Deu-se ao evento o nome de ?Family Workshop?, já na segunda edição, esta em Mogi das Cruzes, interior de São Paulo, com o dobro de participação da anterior, pelo menos 150 sobrenomes sonoros. E o que essa turma fazia ali era exatamente o que está na essência do nome de batismo da convenção: uma oficina, um curso intensivo para toda a família, que trabalha pela ampliação de sua rede de contatos e tenta potencializar as oportunidades empresariais. A mensagem clara: ?vá, alargue os horizontes de sua empresa e traga a família?. Esse último componente da formatação do evento tem razões concretas. João Doria Jr., idealizador e comandante do Workshop, é quem explica: ?a oportunidade de pais e filhos conviverem no universo de trabalho dos pais aumenta o entendimento geral sobre os motivos de ser dispensar tanto tempo na atividade profissional. Ao mesmo tempo, reduz o sentimento de culpa e melhora a performance empresarial como um todo?, diz. Na lógica de Doria, pais felizes convertem-se automaticamente em líderes felizes, capazes de exercitar com mais propriedade a justiça social nos negócios.

Empresas desiguais

Um outro traçado tem nessas oficinas grande valor: a discussão sobre como irão evoluir as companhias, o papel dos herdeiros e de outros eventuais sucessores na toada da organização. Das mais delicadas questões do mundo corporativo atual, sucessão familiar e preparação de herdeiros virou tema quase tabu nas rodas de conversas de empresários ? por tratar-se, naturalmente, da transferência de responsabilidades, de eventuais mudanças de cultura administrativa e da partilha de riquezas. Os negócios, está na história do empreendedorismo brasileiro e mundial, costumam refletir a personalidade de seus fundadores. E daí, como diz o especialista em planejamento sucessório, o advogado Luiz Kignel, presente ao Workshop, faz parte das preocupações do empresário tentar visualizar a empresa quando ela não mais estiver sob seu comando. Garantir continuidade é a essência do anseio dos empreendedores. A complexidade dessa busca é reforçada pelo fato de que não há uma sucessão familiar idêntica à outra, por não haver uma empresa exatamente igual à outra. Em outras palavras: fórmulas pré-concebidas, com garantia de sucesso, não existem e tudo tem que ser conduzido muito pelo instinto.

Preparando herdeiros

O psiquiatra e conferencista Içami Tiba, autor do best seller ?Quem Ama Educa?, vai direto ao ponto: ?empreendedorismo é um exercício, não um legado?. Tiba lista um conjunto de regras que auxiliam na difícil cirurgia da transição corporativa. A saber:

1) Normalmente o homem faz o marketing negativo do trabalho ao chegar em casa e se mostrar cansado. Diante daquele quadro, o filho é criado com a pior das impressões sobre a atividade profissional do pai e, em muitos casos, prefere não sucedê-lo e quer trilhar um novo caminho. O ideal é, na medida do possível, dia após dia, transmitir aos filhos uma mensagem mais positiva desse ambiente.

2) Para o fundador, ?meus negócios são fruto dos meus sonhos?. O problema é quando ele começa a descobrir que seus herdeiros também têm sonhos próprios. Os sucessores precisam ser conquistados e, só assim, os sonhos de ambos vão convergir para pontos comuns.

3) É preciso, é vital, criar o espírito de cidadania nos filhos. Não se deve fazer em casa o que não se pode fazer lá fora. Exemplo simples: o hábito do quarto desarrumado pode estar na origem de muitas organizações desestruturadas.

4) Poder e autoridade devem ser sempre enxergados como valores distintos. O primeiro pode ser dado por herança, é transferível. O segundo é conquistado apenas pela via do reconhecimento.

Dada essa cartilha, o mundo empresarial que era percebido aqui e ali naqueles dias de Workshop se debatia também com o passo seguinte: o da satisfação dos donos e dos seus subordinados dentro do ambiente corporativo. Questões como desenvolvimento profissional, perspectivas de ascensão na carreira, relação vida familiar/trabalho, saúde e equilíbrio entre lazer e produtividade entraram na ordem do dia como mecanismos de efeito direto na eficiência das organizações. É o que eles diziam. Os líderes de alguns dos principais grupos industriais do País parecem ter entendido que, na era da globalização, é chegada a hora de reinventarem o ?modus operandi? dos negócios. E a melhor forma de fazer isso, acreditam, tem sido através do fluxo de informações e da troca de experiências, que vêm sendo perseguidos em encontros como o do Workshop. Lá no evento Içami Tiba pontificou: ?Não basta ser bom no que se faz, tem que se criar a rede de contatos, o chamado ?networking?, que funciona como fiel da balança quando a meta é sucesso?. Para ele, exercitar o intercâmbio de idéias não necessariamente representa a devassa de segredos profissionais ou empresariais. ?Somos parceiros vencedores e, conversando, podemos nos associar para mais vitórias e ainda eliminar a conhecida solidão do poder?. Se tais mensagens forem transmitidas através dos Ceos que esperam atuar como células multiplicadoras de experiências vivenciadas, o Workshop terá alçançado a sua meta maior: virar a roda do desenvolvimento para um rumo mais fácil.