06/04/2004 - 7:00
“Armínio Fraga não teria feito os erros cometidos pela equipe atual do BC”
“A política externa do Celso Amorim confronta os EUA, nosso maior parceiro”
DINHEIRO ? Há uma crise de governabilidade no País?
JORGE BORNHAUSEN ? Não, porque o governo mantém maioria na Câmara e no Senado e não há qualquer sinal de que vá perdê-la. Mas há uma crise de autoridade. O presidente não exerce seu dever de presidente da República. Permite que seu partido ataque ministros, que partidos aliados façam o mesmo, que ministros xinguem ministros e que as invasões de terra se concretizem sem qualquer reação do governo. Nós, da oposição, só queremos que o presidente governe e cumpra o seu mandato.
DINHEIRO ? Quais são os exemplos dessa suposta falta de comando?
BORNHAUSEN ? Depois do caso Waldomiro Diniz, houve uma fratura na autoridade do presidente. O Lula aceita críticas até de ministros que acabaram de ser empossados, como o Alfredo Nascimento, dos Transportes. Ele criticou a política econômica e deveria ter sido demitido na hora.
DINHEIRO ? O ritmo de decisões no governo atual é diferente dos anteriores?
BORNHAUSEN ? O governo está paralisado porque o presidente montou um ministério medíocre e incompetente. Aumentou o número de pastas só para colocar os companheiros do PT derrotados nas últimas eleições, sem falar nas estatais. Eu até entendo que o presi-
dente pensou em delegar a economia ao ministro Antônio Palocci e a administração geral ao ministro José Dirceu. Mas isso não funciona.
DINHEIRO ? Por quê?
BORNHAUSEN ? O Palocci não comanda a economia. Se tivesse poder de fato, não permitiria os equívocos que vêm sendo tomados em relação às agências regulatórias e em muitas outras áreas.
DINHEIRO ? E por que o PFL defende a sua permanência?
BORNHAUSEN ? Porque o PT não tem ninguém no banco de reservas. Mas o governo cometeu erros graves em 2003, que estão custando caro. O Brasil poderia estar crescendo 6% ou 7% ao ano, aproveitando este ciclo virtuoso da economia mundial. É como no surfe. Para surfar, tem que se pegar a onda no início e não no fim.
DINHEIRO ? Quais foram os erros?
BORNHAUSEN ? O governo procurou tirar a autoridade das agências reguladoras, mudou marcos regulatórios por medida provisória, sinalizou para a reestatização em alguns setores e, com isso, inibiu os investidores. Além disso, o Itamaraty, com o Celso Amorim, adotou uma política externa terceiro-mundista voltada para um público interno, que tem por base afrontar os Estados Unidos, nosso maior parceiro comercial, com seguidas reverências a Fidel Castro e a Hugo Chávez, os líderes do atraso.
DINHEIRO ? A oposição não tem exagerado nos ataques com o único objetivo de fragilizar prematuramente o governo?
BORNHAUSEN ? Nós não temos interesse nenhum em fazer com que o governo seja fraco. Também não fazemos movimentos de rua do tipo ?fora FHC?. Só pedimos que Lula reaja e governe. O Brasil está medíocre, mas não perdeu a governabilidade.
DINHEIRO ? Haveria espaço para um ?plano B? na economia?
BORNHAUSEN ? Não é com populismo e medidas irracionais que o governo vai fazer o País crescer. E quem tocaria um plano B? Repito: eles não têm banco de reservas. O Fernando Henrique tinha o Pedro Malan, o Armínio Fraga, o Edmar Bacha e o Pérsio Arida. O José Serra também tinha uma seleção. Era só tirar o Ronaldo, que entrava o Kaká. Mas o Palocci é apenas uma improvisação, por ser um raro homem de bom senso dentro do PT.
DINHEIRO ? O Aloizio Mercadante não seria um bom nome?
BORNHAUSEN ? Quem fala mal do
próprio governo não deve ter espaço
na administração. Acho que esse
é o caso do Mercadante.
DINHEIRO ? O governo pode prescindir de um ministro forte como o José Dirceu?
BORNHAUSEN ? Depois de tudo o que aconteceu, e por mais que Lula queira preservá-lo, o José Dirceu não é mais um ministro forte. É um peso para o governo.
DINHEIRO ? Como esse quadro irá afetar a vida empresarial?
BORNHAUSEN ? Os bancos, que aproveitam as altas taxas de juros pagas pelos papéis do governo, vão continuar ganhando muito dinheiro. E o setor de agronegócios também tem uma grande chance de expansão, porque os mercados mundiais, como a China, estão tremendamente aquecidos. Estes são os únicos que não vão sofrer abalos com a gerência medíocre do governo Lula.
DINHEIRO ? E os exportadores?
BORNHAUSEN ? Deram alguma sorte. Mas mesmo setores que exportam muito, como a siderurgia, também dependem do mercado interno. E este está arrasado. Nunca houve uma perda salarial tão grande quanto a do ano passado.
DINHEIRO ? Como seria possível ampliar os investimentos? O projeto das Parcerias Público-Privadas não é positivo?
BORNHAUSEN ? A melhor coisa para estimular o investimento privado é um mercado interno dinâmico. E isso não há no Brasil do presidente Lula. Além disso, na área de infra-estrutura, eles não param de cometer equívocos. Um exemplo é a medida provisória do setor elétrico, que é estatizante e inconstitucional. Todas as agências regulatórias foram enfraquecidas. Sem essas derrapadas, o Brasil sequer precisaria discutir as tais PPPs.
DINHEIRO ? E o projeto da nova Lei de Falências?
BORNHAUSEN ? É algo positivo, que pode reduzir o risco de crédito. Mas, diante de tanta incompetência, é apenas uma gota no oceano.
DINHEIRO ? Quais são as principais queixas dos empresários?
BORNHAUSEN ? Eu recebo empresários sempre que existe uma nova onda de aumento de tributos. Eles chegam preocupados com a volúpia tributária do governo Lula. Por isso, nós temos feito uma base de resistência no Congresso. Só foi possível eliminar sete pontos de aumentos de tributos na reforma tributária graças a um trabalho feito pelo PFL no Senado.
DINHEIRO ? Ainda há otimismo em relação a 2004?
BORNHAUSEN ? Eu vejo que aquele ambiente animador do começo do ano para os empresários já não existe mais. O clima hoje é de início de pessimismo. Digo apenas início porque as exportações ainda estão atenuando a crise.
DINHEIRO ? O que é preciso para retomar o otimismo?
BORNHAUSEN ? Um governo que atue, trabalhe e não atrapalhe o setor produtivo.
DINHEIRO ? É mais fácil ser um líder da oposição do que era ser governo?
BORNHAUSEN ? Dá trabalho. Mas o governo se atrapalha tanto que é difícil acompanhar os erros, que são tantos e ocorrem diariamente.
DINHEIRO ? O sr. viveu uma grave crise política, no governo Collor, estando do lado de dentro do poder. Há semelhanças com o quadro atual?
BORNHAUSEN ? Há muitas diferenças de estilo entre os presidentes Collor e Lula, tanto a favor de um quanto de outro. Na questão administrativa, quando havia qualquer posição divergente em assuntos importantes, Collor exercia a sua autoridade. Seu governo não deu certo por outros motivos. Já não vejo a mesma disposição de comando e de exercer de fato a Presidência no Lula.
DINHEIRO ? O que o sr. tem dito aos empresários que lhe procuram?
BORNHAUSEN ? Que teremos então mais dois anos e meio pela frente de mediocridade administrativa, com reflexos na mediocridade econômica. O que os empresários devem fazer? Tocar suas vidas sem esperar muito do governo. Os setores que dependem do mercado externo vão puxar a economia. Os que dependem do consumo interno enfrentarão mais dois anos e meio de dificuldades. Temos que ter a paciência democrática durante esse período. Mas serão só dois anos e meio porque eles não conseguirão a reeleição.
DINHEIRO ? O que está travando o crescimento?
BORNHAUSEN ? O governo está preso numa armadilha criada por ele próprio. Não há crescimento porque o juro está alto, e o juro está alto porque há risco de inflação. Ocorre que houve risco de inflação em janeiro porque o próprio governo, para fazer caixa, promoveu uma série de aumentos nos preços dos produtos das estatais no final de 2003. Além disso, o governo aumentou os tributos e penalizou o setor produtivo. O que tivemos como conseqüência foi uma recessão de 0,2% e a geração de 850 mil desempregados em 2003, no momento em que deveríamos estar aproveitando a onda mundial para crescer.
DINHEIRO ? O sr. também aponta erros na condução da política monetária?
BORNHAUSEN ? O governo errou ao aumentar os juros no início
do mandato porque a inflação era fruto de um choque cambial. Não havia qualquer pressão de demanda. Aumentaram a taxa na hora errada e demoraram a baixar. O Armínio Fraga não teria cometido
os mesmos erros.
DINHEIRO ? Na economia, o PT não estaria seguindo a mesma fórmula de metas de inflação do PSDB e do PFL?
BORNHAUSEN ? Eles estão gerindo mal a economia brasileira por não saberem aplicar fórmula alguma. Como eles não tinham credibilidade no mercado, tiveram de ser ultraconservadores. O resultado está aí: um País com um milhão de desempregados a mais do que quando assumiram, prometendo dez milhões de empregos.
DINHEIRO ? Nada estaria funcionando?
BORNHAUSEN ? A única coisa que funciona é a agricultura. Mas o presidente Lula botou o boné da insensatez do Movimento Sem-Terra na cabeça, sem lembrar que o campo é que está fazendo com que o Brasil progrida e tenha saldo na balança comercial. Nem assim o presidente soube mostrar autoridade para reprimir esta guerrilha
feita pelo MST, que age fora da lei. Antes do Waldomiro Diniz, tínhamos um governo forte e mal gerenciado. Agora, temos um governo fraco e mal gerenciado.
DINHEIRO ? O que o governo deveria ter feito na economia?
BORNHAUSEN ? Eles tinham que ter feito o grande enxugamento da máquina pública. Era hora de diminuir as despesas do governo, reduzir o número de ministérios para no máximo doze, extinguir órgãos desnecessários e dar exemplo ao invés de aumentar impostos. O Brasil só vai crescer no momento em que se diminuir o tamanho do Estado.
DINHEIRO ? O sr. defende o Estado mínimo?
BORNHAUSEN ? Não. Defendo um Estado que tenha um tamanho normal e eficiente. Depois disso, será possível fazer uma reforma tributária redefinindo o papel da União, dos governos estaduais e dos municípios em bases razoáveis.