O papa Leão 14 publicou nesta quinta-feira, 9, sua primeira exortação apostólica de seu pontificado, destacando os perigos da pobreza e da desigualdade, endossando declarações controversas do papa Francisco. Leão 14 denuncia a “ditadura de uma economia que mata”, a “tirania invisível” dos mercados financeiros e a desigualdade de renda.

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“Os pobres não existem por acaso ou por um cego e amargo destino”, escreve o pontífice no documento.

“Enquanto os lucros de poucos crescem exponencialmente, os da maioria situam-se cada vez mais longe do bem-estar daquela minoria feliz. Tal desequilíbrio provém de ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira. Por isso, negam o direito de controle dos Estados, encarregados de velar pela tutela do bem comum. Instaura-se uma nova tirania invisível, às vezes virtual, que impõe, de forma unilateral e implacável, as suas leis e as suas regras”, argumentou.

“O número de pessoas vivendo na pobreza deve pesar constantemente em nossas consciências. Não faltam teorias que tentam justificar o estado atual das coisas ou que dizem que forças invisíveis do mercado resolverão tudo. […] Aos pobres são prometidas apenas algumas ‘gotas’ que escorrem, até que a próxima crise global traga tudo de volta ao ponto de partida.”

“Ou recuperamos nossa dignidade moral e espiritual, ou caímos em um poço de imundície”, completou.

Imigração e legado do papa Francisco

Na publicação, Leão 14 diz que “em cada imigrante rejeitado há o próprio Cristo” e que “pobres não existem por acaso”. Posicionamento ecoa postura de seu antecessor, o papa Francisco. Em sua exortação, o papa Leão 14 fez um apelo para que o combate à pobreza e o acolhimento a imigrantes esteja no centro da missão da Igreja Católica.

Marcado por um forte tom social, o texto ecoa os apelos de seu antecessor, o papa Francisco, que criticava de forma contundente as políticas anti-imigração, em especial as encampadas pelo presidente dos EUA, Donald Trump.

“A Igreja, como uma mãe, acompanha aqueles que caminham”, escreveu Leão 14 no documento intitulado Dilexi te (“Eu te amei”). “Onde o mundo vê ameaças, ela vê filhos, onde se constroem muros, ela constrói pontes. Ela sabe que em cada migrante rejeitado há o próprio Cristo que bate à porta”, escreveu.

A exortação apostólica, terceiro documento em ordem de importância da Igreja, começou a ser escrita por Francisco, e foi terminada por Leão.

O cardeal Michael Czerny, conselheiro próximo de Francisco e Leão, afirmou que, embora o documento tenha sido iniciado por Francisco, ele representa as posições do novo papa.

O documento “vê o amor de Cristo encarnado no amor pelos pobres, no cuidado dos doentes, na oposição à escravidão, na defesa das mulheres que sofrem exclusão e violência, na educação para todos, no acompanhamento dos migrantes”, sintetiza a agência de notícias do Vaticano.

“Devemos estar mais empenhados em abordar as causas estruturais da pobreza”, disse Leão 14 durante a apresentação do documento nesta quinta-feira (09/10).

A posição do cardeal americano Robert Prevost sobre temas como imigração e pobreza era motivo de especulação desde que foi eleito papa. Sua escolha chegou a ser considerada uma resposta da Igreja à eleição de Trump nos EUA.

Diferente de Francisco, que era criticado por católicos conservadores por sua postura em temas como imigração, Leão tem adotado um estilo mais reservado.

No entanto, nas últimas semanas, o novo papa tem intensificado suas críticas. Em um livro de entrevistas publicado em setembro, ele criticou explicitamente os salários dos executivos e mencionou o CEO da Tesla, Elon Musk, pelo nome.

No documento mais recente, Leão diz que a experiência da migração acompanha a própria história do “Povo de Deus”, lembrando que Maria e José também fugiram com o menino Jesus para o Egito. “O próprio Cristo viveu entre nós como estrangeiro. Por isso, a Igreja sempre reconheceu nos migrantes a presença viva do Senhor”, diz em Dilexi te.

Ao pedir a construção de pontes no lugar de muros, Leão também faz uma referência à fala de Francisco que, em 2016, disse que Trump “não era cristão” por querer construir um muro na fronteira entre EUA e México.