24/09/2008 - 7:00
DINHEIRO – O PIB do primeiro semestre cresceu 6%. Que avaliação o sr. faz do atual momento da economia?
PAULO SKAF – O momento é positivo. Nós tivemos no ano passado o primeiro ano de crescimento significativo. Neste ano, temos o setor automobilístico indo muito bem, a construção civil, a indústria de máquinas e equipamentos, o siderúrgico, papel e celulose, as commodities também. Os investimentos do PAC estão acontecendo, embora não na velocidade que gostaríamos. Um exemplo disso são as aplicações do BNDES, que devem chegar a R$ 80 bilhões. A previsão da Fiesp é um crescimento da economia de 5,4% para este ano, com a indústria crescendo 5,8%. Será o segundo ano de Entrevista / Paulo Skaf crescimento mais elevado. Gostaríamos que fosse o 15º ou 20º ano com crescimento compatível com o resto do mundo, mas felizmente este ano teremos um crescimento positivo. Sempre lutamos para que este crescimento tenha solidez, seja duradouro. Queremos crescer assim por 20 anos.
DINHEIRO – O que se ouve do empresariado é uma satisfação grande com a economia e também com o governo Lula. Já a Fiesp tem sido uma crítica muito severa do governo. Por quê?
SKAF – Temos que separar as coisas. A Fiesp é muito parceira. Temos uma agenda positiva com o governo muito grande, mas isso não tira a nossa independência de criticar, por exemplo, a questão dos juros. Quando falamos da política de juros, não estamos criticando o presidente Lula, talvez ele até concorde conosco. Quando travamos a guerra contra a CPMF no ano passado, nós tínhamos razão. Dizíamos que haveria aumento da arrecadação, e foi exatamente o que aconteceu. Não era por ser contra ou a favor do governo, mas porque entendíamos que a recriação da CPMF levaria a um aumento de gasto público, que é justamente o que aconteceu. Quando a gente discute juros, a mesma coisa. Estamos vivendo uma inflação advinda do aumento dos preços agrícolas internacionais. O aumento dos juros no Brasil não fará com que os preços caiam lá fora. Então, para que aumentar os juros? Para aumentar o gasto público? Para aumentar custo de investimento, que já é um absurdo? É preciso separar as coisas. O compromisso da Fiesp é com o País. Agora, em relação a tudo aquilo que a nosso ver contraria os interesses do País vamos estar a postos e vamos ser contrários sim, como representantes legítimos da sociedade que somos.
“No caso da CPMF, estávamos certos. A arrecadação maior compensou o fim do imposto” Protesto liderado pela Fiesp pelo fim da CPMF
DINHEIRO – Na útima semana houve aumento de juros, criticado pela Fiesp, mas em seguida a entidade elevou para 5,4% a previsão de crescimento para este ano. Não é sinal de que os juros não estão prejudicando a economia?
SKAF – Nós sabemos que o aumento dos juros não tem reflexos imediatos, mas no médio prazo. E no médio e longo prazo, nossa preocupação não é o excesso de crescimento, mas a redução do crescimento. Já temos uma moeda sobrevalorizada, que prejudica a competitividade, tem um momento de inflação pressionado por preços internacionais, o que prova que o Banco Central errou. A nossa preocupação não é com inflação, é com o crescimento. Nós achamos que o Brasil pode crescer mais de 4% em 2009, mas não estamos trabalhando com 5%, 5,5%. Os mais pessimistas já falam em 3%, 3,5%. Numa situação dessas, a quem interessa esses juros?
DINHEIRO – Na semana passada uma pesquisa da própria Fiesp mostrou que os empresários estão otimistas.
SKAF – Uma característica do empresário é ele viver o seu negócio. Este ano nós vamos crescer mais de 5%. Não houve ainda sinais de recuo. Os efeitos nocivos do aumento de juros não chegaram ainda. A pesquisa não fala sobre 2009. Uma coisa é fazer previsões, outra é estar no dia-a-dia da empresa. Enquanto está tendo demanda, pedidos, venda, recebendo o que vende, produzindo, novas oportunidades, você está otimista. Nós não pregamos pessimismo. Somos otimistas com o Brasil. São poucos os empresários que fazem análise macro. Geralmente a análise é micro. Mas nós como entidade temos a obrigação de enxergar mais adiante. O Brasil não ganha com aumento de juros, o Brasil perde. Nós precisamos saber quem ganha com aumento de juros num momento em que não há a mínima necessidade para isso.
DINHEIRO – Como está o repasse da inflação nas empresas?
SKAF – Não vai ter repasse. Não há expectativa de aumento de preços.
DINHEIRO – Outro dado da pesquisa da Fiesp é o emprego, pois 55% das empresas dizem que não têm intenção de contratar. Isso pode significar que a melhora já se esgotou?
SKAF – Pode ser isso, sim. Até agosto houve uma contratação bastante elevada, e não há uma perspectiva elevada a partir de agora.
DINHEIRO – A crise americana, que se aprofundou nesta semana, pode atingir a indústria?
SKAF – É imprevisível. O mundo não sabe, os americanos não sabem, difícil a gente saber. Até o momento não afetou a confiança nos investimentos, os empréstimos do BNDES, por exemplo, não tiveram nenhuma alteração.
DINHEIRO – O dólar se desvalorizou muito nos últimos dois anos, mas se valorizou agora nas últimas semanas. Isso é bom ou é ruim para a indústria?
SKAF – A valorização do dólar é positiva, porque do jeito que estava tirava a competitividade da nossa indústria. Lamentavelmente essa valorização veio acompanhada de um clima de insegurança. Mas o dólar de R$ 1,80 para o Brasil é melhor do que o dólar de R$ 1,60. Quando tem um câmbio sobrevalorizado, você pode pegar a empresa mais competitiva do mundo e ela perde mercado por causa do câmbio.
DINHEIRO – Vários empresários dizem que a Fiesp já não é mais a principal voz do setor. O que aconteceu?
SKAF – Não é isso o que eu ouço aqui. Pelo contrário, ouço que ela é presente até além dos interesses da indústria. Não me lembro de outra entidade liderar um movimento como o da CPMF, porque conseguimos reduzir a carga tributária em 1,5% do PIB. A Fiesp tem hoje seis mil voluntários, 14 departamentos operacionais, todas as cadeias produtivas representadas. Os temas que se discute vão além da indústria: falamos de defesa, agronegócio… O que eu ouço é o oposto, que ela faz um papel além da sua missão de defender a indústria para defender o que é melhor para o País, além da grande participação na questão ambiental.
DINHEIRO – A indústria paulista perdeu participação na indústria brasileira, mas nos últimos anos já a recuperou. Qual é a tendência agora?
SKAF – Houve uma migração para outros Estados quando havia muitos incentivos, mas agora o crescimento está acima da média nacional. O Brasil cresce 5% e São Paulo, 9%. Muitas companhias com sede em São Paulo têm investimentos em outros Estados e até em outros países. Então temos uma representatividade que vai além dos 44% de participação no PIB instalada no Estado.
![]() | “Essa alta do dólar é até boa porque aumenta a competitividade da indústria nacional” Moeda americana, que voltou a superar R$ 1,80
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DINHEIRO – A Fiesp recebeu nesta semana a visita do presidente do Paraguai, Fernando Lugo. Quais são as perspectivas para o relacionamento com o Paraguai?
SKAF – Nós queremos desfocar a questão única de Itaipu. Itaipu está lá, é uma realidade, foi um único negócio para o Paraguai, não podemos deixar que pareça agora que não é. Queremos mostrar que há outras alternativas em que eles têm competitividade, como o agronegócio, o setor têxtil. Em vez de abalar a credibilidade no relacionamento entre os países, seria muito melhor ter uma agenda positiva e despertar interesses nos empresários. Desde que o presidente Lugo nos transmita segurança. Por isso é muito importante que ele não tome – a exemplo de outros países – medidas que diminuam a segurança.
DINHEIRO – O Brasil já tem investimentos e enfrenta problemas na Bolívia. E a Venezuela ainda não teve problemas com o Brasil, mas a situação não é de completa segurança jurídica.
SKAF – Com a Venezuela temos uma relação comercial que é proveitosa para o Brasil, com um superávit que no ano passado foi de US$ 4 bilhões e este ano pode até crescer um pouco. Temos empreiteiras, empresas brasileiras com grandes obras na Venezuela. Há muitas oportunidades, mas, em contrapartida, há sempre uma insegurança causada por declarações do presidente Chávez. Mas não podemos confundir governantes com países. Já na Bolívia tivemos problemas com a atitude em relação ao investimento estrangeiro, e neste momento há uma apreensão por causa da situação política. Quanto ao fornecimento de gás, não acredito que teremos nenhum problema por uma razão muito simples: nós precisamos do gás e a Bolívia precisa deste gás que vende para nós e rende para eles mais de US$ 1 bilhão. Houve um susto, mas já passou. Gás não é como petróleo que você embarca num navio e manda para outras partes do mundo. O gás precisa de um gasoduto. A Bolívia não tem para onde mandar este gás.
DINHEIRO – Então vocês não estão preocupados?
SKAF – Estamos preocupados e acompanhando diariamente, estamos em contato com a embaixada e com o Ministério de Minas e Energia. A médio e longo prazo o Brasil está tomando providências, tem o gás que vai ser importado em líquido, tem a produção própria que está aumentando. O que não queremos é ser alarmistas. Acho muito difícil qualquer um dos lados abrir mão de faturar esse US$ 1 bilhão. Não creio que haja razão para alarme exagerado.
DINHEIRO – A indústria tem alternativas ao gás, tem como alterar a matriz energética?
SKAF – Depende do caso. O setor de vidros, cerâmico, depende muito do gás e qualquer alternativa vai representar aumento drástico do custo, porque o gás é usado no processo produtivo. Tem outros casos em que o gás é usado em geradores e há alternativas.