18/06/2015 - 18:13
A inflação e a retração do emprego têm feito os brasileiros pouparem menos e se endividarem mais. As cadernetas de poupança vêm registrando seus maiores resgates líquidos em duas décadas, e os empréstimos consignados – aqueles descontados diretamente do salário ou da aposentadoria do devedor – estão crescendo. Segundo o Banco Central (BC), em abril, dado mais recente disponível, os bancos haviam concedido R$ 262 bilhões nesses empréstimos, um recorde correspondente a 71,5% dos financiamentos totais às pessoas físicas, com exceção dos créditos automotivo e imobiliário.
A forma de conceder esses empréstimos também mudou. Até há pouco tempo, era comum encontrar promotores de crédito perambulando pelos corredores das empresas ou de prontidão na porta das agências bancárias. Eles apresentavam uma gama de ofertas de empréstimos aos funcionários ou aos aposentados do INSS que iam receber seus benefícios. Em troca, esses vendedores, apelidados de pastinhas, recebiam uma comissão de até 20% do financiamento, paga na contratação do crédito. Agora, a pasta de couro transformou-se em bits e bytes.
A empresa paulista Movats, pertencente ao grupo de tecnologia Accesstage, está lançando um sistema de contratação on-line de empréstimos. “Estamos transformando o consignado em um e-commerce”, afirma Celso Sato, presidente da Accesstage e da Movats. A Accesstage está se aproveitando de uma oportunidade criada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Até a mudança, cuja regulamentação definitiva ocorreu em 2014, a concorrência pela venda dos empréstimos consignados havia se transformado em uma atividade predatória. Com a ajuda dos pastinhas, os bancos, especialmente os menores, passaram a “roubar” clientes uns dos outros, oferecendo taxas de juros mais competitivas, prazos mais longos e alterações no saldo remanescente.
Isso elevou os riscos do sistema. Duas resoluções do CMN, no entanto, puseram um ponto final nessa disputa. Agora, a comissão chega, no máximo, a 6% do valor do financiamento e deve ser paga ao longo do contrato, e não mais na hora da contratação. Além disso, os bancos só podem alterar a taxa de juros, deixando prazo e saldo intactos. Essas mudanças afastaram muitos pastinhas do mercado e abriram espaço para a Movats. Para o cliente ter acesso às ofertas, basta consultar a intranet da companhia onde trabalha, fazer a simulação e contratar o empréstimo.
A operação é enviada diretamente para o RH da empresa. “A única parte que não é virtual é a assinatura do contrato”, afirma Sato. A Movats já fechou acordos com seis bancos e fez parcerias com seguradoras. “Oferecemos a possibilidade de o empregado contratar o financiamento com seguro contra desemprego, por exemplo”, diz. “É uma oportunidade para todo o sistema financeiro, que está sedento por empréstimos considerados mais seguros.” A receita da Movats vem de um percentual cobrado por transação fechada, não revelado por Sato. Segundo ele, as receitas do e-commerce deverão representar 10% do faturamento de R$ 65 milhões previsto para 2015.
Apesar de não ser responsável pela análise de crédito, a Movats conta com uma área de risco, seguro e um colchão de R$ 2 milhões para eventuais casos de fraude na documentação apresentada pelos tomadores dos empréstimos. “Não queremos ser um banco, mas ser um facilitador para o sistema financeiro captar clientes onde ele não consegue chegar”, diz. “Com o tempo, pretendemos nos tornar uma opção para o consumidor, que poderá pagar o e-commerce com cartão de crédito, boleto ou Movats.” A empresa de Sato não está sozinha. A Bom pra Crédito fez a sua primeira operação em janeiro do ano passado e hoje já conta com 15 bancos parceiros, como BMG, Itaú, Bradesco e Daycoval, entre outros.
A ideia inicial dos sócios Ricardo Kalichsztein, Daniel Polistchuck e Felipe Lemos era permitir que os clientes apenas se informassem sobre as taxas, mas o negócio acabou indo além disso. “Ao comparar as propostas de diferentes instituições, as pessoas têm maior chance de aprovação de crédito”, diz Kalichsztein. “Nosso site é aberto, funciona como um marketplace.” É possível contratar – de graça – empréstimo pessoal, consignado para aposentados, cartões de crédito e cartões pré-pagos. “Estamos estudando a possibilidade de oferecer crédito estudantil”, afirma.