10/02/2015 - 18:45
Torcedores juntaram forças para resgatar a memória do irlandês Pat O’Connell, que ganho o apelido de ‘Don Patricio’ na Espanha, por ter dado ao Betis seu único título nacional e treinado o Barcelona durante a guerra civil, nos momentos mais difíceis da sua história.
Nascido em 1887, em Westmeath, morreu aos 71 anos em Londres, em 1959, na pobreza e no esquecimento.
“Patrick O’Connell foi, na minha opinião, um enigma. Teve um êxito brilhante na sua carreira, mas sempre teve um lado escuro”, explicou à AFP Mike O’Connell, neto do ex-treinador.
O irlandês viveu os últimos momentos da sua vida na casa do seu irmão, na capital britânica, depois de passar trinta anos na Espanha, onde treinou Racing Santander, Real Oviedo, Betis, Barcelona e Sevilla.
Pelas conquistas com clubes espanhóis, é muito mais lembrado na península ibérica do que na Irlanda e no Reino Unido, onde fez sua carreira de jogador, na posição de zagueiro, com passagem pelo Manchester United, de 1914 a 1919.
Ele está enterrado no cemitério Saint Mary, de Londres, em um túmulo que divide com duas irmãs, na qual sequer aparece seu nome.
Um grupo de torcedores irlandeses e britânicos resolveu restaurar este túmulo e construir um monumento em Belfast, capital da Irlanda do Norte, onde fez sua estreia como profissional, em 1909.
O’Connell foi o primeiro jogador irlandês a usar a braçadeira de capitão do Manchester United, abrindo o caminho para Denis Irwin ou o lendário Roy Keane.
Com a seleção do seu país, sagrou-se campeão britânico em 1914, superando Escócia, Inglaterra e País de Gales.
“Não existe nenhuma homenagem a O’Connell no Reino Unido ou na Irlanda. Esperamos que esta campanha sirva para que as pessoas saibam quem foi e que seja erguido um monumento à altura dos seus feitos”, explicou o irlandês Fergus Dowd, um dos idealizadores da campanha Patrick O’Connell Fund (www.pocfund.com).
Dowd e seus amigos conseguem arrecadar fundos ao leiloar camisas autografadas de craques como Johan Cruyff, Franz Beckenbauer, Paolo Maldini ou Andrea Pirlo.
A ideia é organizar um evento em cada cidade vinculada com a carreira de O’Connell, com o objetivo de arrecada 5 mil libras (cerca 8 mil dólares) até o fim do ano.
O Betis, clube tradicional que amarga hoje a segunda divisão espanhola, vem contribuindo bastante para o sucesso da campanha.
Em dezembro, realizou uma homenagem antes de uma partida contra o Racing Santander, 80 anos depois da vitória por 5 a 0 sobre esta mesma equipe, que deu ao time andaluz o título da temporada 1934-1935 da Liga Espanhola, o único da dua história.
“Muitos anos se passaram, mas todos os torcedores do Betis sabem perfeitamente quem é O’Connell”, explicou à AFP Julio Jiménez Heras, diretor de comunicação do clube.
“Ganhamos apenas uma Liga. As novas gerações não se lembram dos jogadores daquela equipe, mas sabem que é O’Connell”, insistiu.
“Ele gostava de andar pelas ruas de Sevilha (sede do Betis), tinha uma frase muito boa: ‘é uma cidade onde se vive como se fosse morrer na mesma noite'”, completou.
Em 1935, depois de conquistar título inédito com o Betis, foi contratado pelo presidente Josep Suñol para assumir o comando do Barcelona.
No dia 6 de agosto de 1936, menos de um mês depois do início da guerra civil, Suñol, que era deputado do partido nacionalista catalão ERC, foi fuzilado pelos franquistas.
A guerra civil obrigou O’Connell a levar os jogadores numa turnê por todo continente americano. A maioria dos atletas ficou por lá, mas o irlandês voltou, e treinou a equipe catalã até 1940.
Naquela época, ele já havia deixado de enviar dinheiro à sua primeira família irlandesa, que não tinha mais notícias dele.
Sue O’Connell, esposa do neto Mike, relatou à AFP como foi o reencontro. “No dia 12 de junho de 1949, a seleção espanhola foi jogar em Dublin, capital da Irlanda, e o filho de O’Connell, Daniel, foi ver os jogadores para perguntar se tinham notícias do pai”, explicou.
Os atletas espanhóis conheciam muito bem o treinador e explicaram a Daniel que seu pai vivia em Sevilha.
“Os tempos eram duros nesta época. Ele poupou dinheiro durante um ano para poder viajar à Espanha. Acabou encontrando com o pai, mas não se deram bem. Por vários motivos, ele o apresentava ás pessoas como seu sobrinho”, contou Sue, que está procurando uma editora para publicar o livro que escreveu sobre o avô do marido.
O’Connel casou-se outra vez na Espanha, com uma espanhola, mas não teve outros filhos. Mesmo assim, não existem rancores na família. “Todos têm orgulho pelo avô. Nunca o viram, mas não param de falar sobre ele”, completou Sue.
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