14/07/2001 - 7:00
Entre as atividades do secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Paul O?Neill, duas interessam particularmente os brasileiros. Por um lado, ele encabeça um movimento nacionalista em prol do cartel do aço ? intervencionismo puro, de olho nos votos dos trabalhadores de uma indústria que, nos EUA, é tradicionalmente ineficiente. Na outra ponta, o ex-executivo da multinacional Alcoa lança olhares siderúrgicos aos países emergentes e defende a redução da verba americana para o FMI, no caso de ajuda a economias em crise, como a argentina. ?Deve-se zelar pelo dinheiro feito por carpinteiros que ganham US$ 50 mil por ano?, afirma O?Neill.
Aos 66 anos, o homem do cofre de George W. Bush já teve sua experiência como executivo estudada pela Harvard Business School, por conta do sucesso na passagem pela Alcoa, com lucros sucessivos, da velha para a nova economia. Como homem público, O?Neill oscila entre o intervencionismo e o laissez faire. Ele tem uma visão gélida da ajuda do Fundo Monetário Internacional a países em crise. Por suas declarações, a inclusão de mercados emergentes na economia mundial não é uma tarefa para o governo americano. Ao contrário do que ele prega para as várias siderúrgicas em concordata nos EUA, cada país deve andar ao máximo com as próprias pernas ? ainda que cambaleantes, como as argentinas e turcas. ?Por que devemos intervir nas crises??, pergunta. ?As crises são alimento para os meios de comunicação. Não têm a ver com falhas do capitalismo, mas com sua ausência.? O FMI e o Banco Mundial, compara O?Neill, só deveriam aparecer na hora de reais emergências. Ele se preocupa com o ?risco moral?, quando os investidores comportam-se irresponsavelmente porque sabem que haverá ajuda internacional. ?Sem risco associado ao investimento, não há capitalismo, mas uma loteria socializada?, afirma.
Do lado do aço, a situação é inversa. A blindagem protecionista da siderurgia americana, em crise desde os anos 60, foi reforçada nos últimos meses. Trata-se de um afago nos democratas, principais interlocutores dos sindicatos e indústrias siderúrgicas. A proposta de O?Neill que mais ganhou repercussão ? a de criar um cartel no estilo Opep, para diminuir a produção mundial e favorecer a americana ? na prática é a que o mercado menos acredita. Como CEO da Alcoa, o atual secretário liderou um movimento semelhante para os preços do alumínio, na década de 90, com sucesso. Mas a grandiosidade da indústria do aço, na visão de inúmeros analistas, impossibilitará a coordenação feita no caso do alumínio. O arsenal protecionista, porém, vai mais além. Por exemplo, no poder judiciário, com a profusão de processos antidumping contra outros produtores. Segundo o professor Germano Mendes de Paula, da Universidade Federal de Uberlândia, o último sinal foi um processo movido este mês, contra China e Japão, por suposto dumping na venda do coque, um produto preliminar da indústria siderúrgica. Antes os EUA só moviam processos relativos ao produto final, laminado. Depois foi a vez dos produtos semi-acabados ? mercado onde o Brasil atua. Agora, chegaram à fase inicial da cadeia produtiva. O Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS) observa tudo com apreensão. Trinta por cento das exportações brasileiras são para os Estados Unidos. Segundo o diretor-técnico Rudolf Buhler, ainda não se sabe a extensão do estrago das medidas. ?O processo está apenas se iniciando.? Para o Japão e a União Européia, apenas parte da indústria americana é competitiva. Bertus Van Barlingen, da União Européia, diz que importações não são o problema da siderurgia dos EUA: o que falta é modernizá-la.