Deflagrada pela Policia Federal na manhã desta quinta-feira, 28, a operação Carbono Oculto associa fintechs e gestoras de investimentos à lavagem de dinheiro bilionária realizada pelo grupo criminoso PCC (Primeiro Comando da Capital).

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Segundo a Receita, havia o envolvimento de centenas de empresas em diversos elos da cadeia de produção e financiamento da área de combustíveis. Importadoras atuavam como intermediárias, adquirindo produtos no exterior com recursos de formuladoras e distribuidoras controladas pela organização. Ao lado de postos também vinculados ao grupo criminoso, sonegavam impostos de forma sistemática e adulteravam combustíveis.

Nas vendas com valores em espécie ou via maquininhas de cartão feitas pelos postos, os valores eram transferidos para contas vinculadas ao esquema criminoso. As fintechs eram escolhidas em vez de bancos tradicionais pois, segundo a Receita, “dificultavam o rastreamento dos valores transacionados”.

Por fim, o dinheiro lavado era reinvestido em fundos de investimento multimercado e imobiliários, utilizados para ocultar o patrimônio acumulado. A Receita Federal já identificou ao menos 40 fundos controlados pelo grupo, com um patrimônio estimado em R$ 30 bilhões.

Com tantos elos envolvidos, a Receita Federal afirma que “a organização criminosa, ao mesmo tempo que lavava o dinheiro proveniente do crime, obtinha elevados lucros na cadeia produtiva de combustíveis”.

Fintech atuava como ‘banco paralelo’

Apesar de não ter divulgado oficialmente o nome das empresas, a Receita Federal afirma que uma fintech de pagamento atuava como “banco paralelo” da organização criminosa, tendo movimentado mais de R$ 46 bilhões entre 2020 e 2024.

Chamou atenção do órgão o fato da fintech receber diretamente valores em espécie. Entre 2022 e 2023, foram efetuados mais de 10,9 mil depósitos em papel-moeda, totalizando mais de R$ 61 milhões. “Este é um procedimento completamente estranho à natureza de uma instituição de pagamento, que opera apenas dinheiro escritural”, diz a Receita.

Os criminosos também controlavam outras instituições de pagamento menores, usadas para criar uma dupla camada de ocultação.

Segundo a Receita, a “utilização de fintechs pelo crime organizado objetiva aproveitar brechas na regulação desse tipo de instituição. Essas brechas impedem o rastreamento do fluxo dos recursos e a identificação, pelos órgãos de controle e de fiscalização, dos valores movimentados por cada um dos clientes da fintech de forma isolada”.

As fintechs não são obrigadas a prestar contas à Receita Federal sobre as operações financeiras dos clientes como ocorre com os bancos tradicionais. Uma normativa no final de 2024 buscou mudar a situação, porém foi revogada no começo de 2025 após uma onda de fake news.

Em um dos métodos descritos pelo órgão, eram usadas “conta-bolsão”, contas abertas em nome da própria fintech em um banco comercial por onde transitam de forma não segregada recursos de todos os seus clientes.

Fundos de investimento com cotista único

Já os fundos envolvidos na operação tinham como característica contarem “com um único cotista, geralmente outro fundo de investimento, criando camadas de ocultação”.

Entre os bens adquiridos por esses fundos estão, segundo os auditores, “um terminal portuário, quatro usinas produtoras de álcool (mais duas usinas em parceria ou em processo de aquisição), 1.600 caminhões para transporte de combustíveis e mais de 100 imóveis, dentre os quais seis fazendas no interior do Estado de São Paulo, avaliadas em R$ 31 milhões, e uma residência em Trancoso/BA, adquirida por R$ 13 milhões”.

Ainda de acordo com o órgão, indícios “sugerem que as administradoras dos fundos estavam cientes e contribuíram para o esquema, inclusive não cumprindo obrigações com a Receita Federal”.

Adulteração de combustíveis e fraudes nos postos

Fora do campo financeiro, as importadoras, formuladoras, distribuidoras e postos de combustíveis também tinham envolvimento no esquema, segundo as informações já divulgadas.

Os criminosos importavam metanol pelo porto de Paranaguá, no Paraná, mas os destinatários do produto não eram os que constavam nas notas fiscais. Altamente inflamável e tóxica, a substância era transportada clandestinamente, desconsiderando os padrões de segurança, e destinada a postos onde era usada na adulteração do produto vendido aos consumidores.

As empresas do ramo de combustíveis vinculadas à organização também sonegavam tributos em suas operações de venda. A Receita Federal afirma que já oficializou e formalizou a cobrança de um total de mais de R$ 8,67 bilhões de tributos devidos por pessoas e empresas integrantes do esquema.

(*com informações da Reuters e do Estadão Conteúdo)