No fim da manhã da terça-feira 31, durante uma viagem a São Paulo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, atende seu celular. O interlocutor é um irritado Luiz Inácio Lula da Silva. O presidente estava incomodado com o número de pessoas que o vinham procurando para cavar uma informação de bilhões: o preço do barril de petróleo que a Petrobras pagaria à União em seu processo de capitalização. O número já estava definido, e Lula queria impedir um vazamento da informação que resultou de uma disputa ferrenha entre governo e Petrobras.

 

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Apetite de leão: caso os investidores minoritários não exerçam o direito de

preferência, a União vai aumentar a sua participação na Petrobras 

 

A estatal tinha interesse em pagar o menor valor possível pelo petróleo, enquanto o governo queria elevar o valor para aumentar sua participação na empresa. No fim, encontrou-se uma solução de meio termo. 

 

O preço médio dos cerca de cinco bilhões de barris, que serão cedidos pela União à Petrobras, foi fixado em US$ 8,51, o que vai representar um montante de US$ 42,5 bilhões. Em troca, a União vai receber ações da empresa. Quantas? Isso vai depender do interesse dos demais sócios, os acionistas minoritários. 

 

Se eles não exercerem seu direito de preferência e adquirirem as ações oferecidas, vão sobrar mais papéis para ser comprados pela União, que pode usar recursos do Fundo Soberano, papéis públicos e participações em outras empresas para isso.

 

Brasília tem apetite para todas as ações que o mercado não quiser. Mantega vem dizendo que a maior vantagem é que o governo começará a se apropriar da riqueza do pré-sal. 

 

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Todo cuidado é pouco: o presidente Lula e Sérgio Gabrielli precisam fazer uma bem-sucedida

captação para cumprir investimentos de US$ 224 bilhões até 2014

 

“A participação da União vai aumentar, o que é muito bom, porque a Petrobras vai ganhar dinheiro quando começar a explorar petróleo e a União vai se beneficiar com os dividendos”, diz. Ele já declarou em entrevistas que a ideia da União é elevar sua participação na Petrobras dos atuais 40% para cerca de 60%.

 

A operação, que terá de ser completada até o dia 30 de setembro, pode levantar um máximo de R$ 150 bilhões, a maior capitalização de todos os tempos em qualquer mercado do mundo. O dinheiro tem destino certo: a Petrobras tem um plano de negócios ambicioso que prevê investimentos de US$ 224 bilhões até 2014. 

 

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O aumento de capital permitirá que a estatal também tome novos empréstimos sem ultrapassar o limite de 35% de endividamento que poderia fazê-la perder a atual classificação de risco. Hoje,as agências de classificação de risco atribuem à Petrobras o grau de investimento,  o que a torna apta para receber dinheiro dos grandes investidores internacionais, como os fundos de pensão, por exemplo.

 

O que fazer? Até o fechamento desta edição, o tamanho da oferta e o preço por ação ainda não tinham sido divulgados, o que dificulta as interpretações.

 

Os especialistas afirmam que os minoritários não devem ficar fora da capitalização, para evitar que suas participações sejam diluídas, o que reduziria seus dividendos. “Quem tem o papel deve participar da operação. O movimento de alta vai ser natural”, diz Ivan Kraiser, diretor de renda variável da Legan Asset Management. 

 

A recomendação é cautela. “O investidor deve fugir do tiroteio que está ocorrendo com o papel”, diz Rodrigo Menon, da Beta Advisors. “É importante dividir a compra. 

 

Colocar um terço agora e guardar o restante para a capitalização.” Quem investiu parte de seu Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) nas ações da Petrobras no ano 2000 e não resgatou poderá usar recursos do Fundo para participar do aumento de capital.

 

Quem não tem ações e não está disposto a especular no curtíssimo prazo deve aguardar mais detalhes antes de tomar sua decisão. Apesar de todas as boas perspectivas, os acionistas da Petrobras têm motivos de sobra para ficar de mau humor.  A indefinição fez as ações da estatal recuar mais de 20% este ano, o que a coloca em segundo lugar entre os piores desempenhos do setor no mundo, perdendo apenas para a British Petroleum, que devastou o Golfo do México. 

 

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Os especialistas acreditam em uma recuperação no curto prazo. As ações da Petrobras subiram mais de 7% em dois dias. Para os analistas, o preço “justo” para o papel seria R$ 32, o que representa uma valorização aproximada de 16% em relação ao fechamento da quinta-feira 2 de setembro.

 

Daí em diante, é só incerteza. As ações vão oscilar em função dos ganhos da extração do óleo no pré-sal, e eles não são esperados para o curto prazo. “É preciso pensar em um prazo de cinco anos para obter os ganhos com a extração do petróleo”, diz Menon. 

 

Mais de um especialista considera que esse prazo é muito longo, e há riscos muito grandes na exploração do petróleo do pré-sal, um desafio tecnológico enorme para a Petrobras. 

 

A estatal tem uma tradição de explorar petróleo em águas profundas e poderá tornar-se a líder na exploração em águas ultraprofundas, o que deverá triplicar seu tamanho. No entanto, esses resultado só virão no longo prazo, e com um razoável grau de incerteza.

 

(com reportagem de Denize Bacoccina, Juliana Schincariol, Márcio Kroehn e Rodolfo Borges)