O silêncio do Espaço Raymundo Magliano Filho, da BM&FBovespa, onde as empresas promovem a festa da estreia de suas ações, deve ser quebrado na sexta-feira 17, depois de 315 dias de marasmo. Nesse dia, as luzes do palco e o tradicional toque da campainha às 10 horas voltarão a comemorar a chegada de uma nova empresa ao pregão. A responsável por reabrir a nova temporada será a Ourofino Saúde Animal, de Cravinhos, no interior paulista, que faturou R$ 384 milhões em 2013 e espera captar R$ 356,7 milhões. Esse intervalo só é menor do que os 379 dias entre a abertura de capital (IPO, na sigla em inglês) da OGX, em junho de 2008, e a oferta da Cielo, em junho de 2009.

O último ato havia sido com a operadora de viagens CVC, que promoveu sua abertura de capital em 5 de dezembro do ano passado. Nesse período, importantes empresas sinalizaram que fariam uma oferta pública, como Votorantim Cimentos, Azul Linhas Aéreas, Ouro Verde, Sascar e JBS Foods. Nenhuma delas, porém, deu prosseguimento ao plano. A primeira abertura de capital de 2014 vem na esteira das novas regras para as pequenas e médias empresas, que faturam até R$ 500 milhões. As novas diretrizes, aprovadas no fim de setembro pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), permitem ofertas de ações dessas empresas sem a necessidade de pedido de registro prévio, como acontece com empresas maiores ou até mesmo com as pequenas e médias que pretendem fazer ofertas com captação maior.

“Companhias menores poderão captar com menos custo e mais velocidade”, afirma Flávia Mouta, superintendente de mercado da CVM. A medida visa acabar com casos como o da empresa de tecnologia Senior Solution, que tentou abrir capital durante seis anos e esbarrou na morosidade legal. “Por duas vezes, perdemos a janela de oportunidade pela demora do processo. Conseguimos concluir a operação somente em 2013”, diz Bernardo Gomes, cofundador e presidente da Senior Solution. Nesses 20 meses desde que fez seu IPO, as ações da empresa recuaram 24,1%, um desempenho pior que o do Ibovespa, que no mesmo período tem perdas de 2,4%.

Das 353 empresas listadas na BM&FBovespa, menos de 20 são pequenas e médias. A mais conhecida é a Nutriplant, que rejeitou uma oferta de um fundo de private equity para apostar na bolsa em 2008. “Buscamos um caminho onde nossa empresa receberia o valor correto pelas ações e levantamos R$ 20 milhões”, diz Ricardo Pansa, CEO da produtora paulista de fertilizantes. Os analistas veem com bons olhos a chegada da Ourofino. No prospecto divulgado pela empresa no dia 30 de setembro, as ações estão sendo oferecidas entre R$ 26 e R$ 27, em uma operação que inclui como subscritores de ações nomes de peso como o BNDESPar e o fundo americano General Atlantic, que detém participações em empresas como o programada de fidelidade Smiles e a agência de viagens online Decolar.com.

“A empresa tem apresentado crescimento e está em um País com vocação para o agronegócio”, diz Valter Bianchi, analista da corretora gaúcha Fundamenta Investimentos. Diferentemente de gigantes como Vale e Petrobras, as PMEs lutam para figurar na carteira dos investidores. Elas podem oferecer boas oportunidades, apesar dos riscos. Das nove empresas que compõem o Bovespa Mais, apenas quatro possuem ações negociadas. Delas, três vão muito mal no ano. A Biomm recua 31,3%; a Senior Solution, 19,3%; e a Jereissati Participações, 20%. Apenas a Nutriplant avança, com 18,4%.

Essas quedas se refletem no Índice Small Caps, que agrupa 75 empresas pequenas e médias, provocando perda de 7,3% no ano. Apesar dos vários pontos positivos envolvendo o IPO da Ourofino, os analistas alertam para um detalhe: 85% do valor captado com a oferta de ações vai para o bolso dos acionistas vendedores, Jardel Massari e Norival Bonamichi, e não para o caixa da empresa. Embora não estejam passando por um bom momento, elas estão no radar dos analistas. No fim de setembro a Coinvalores passou a cobrir a Senior Solution, enquanto a XP começou a acompanhar os papéis da Renar Maçãs. Daniel Liberato e Felipe Silveira, analistas da Coinvalores, explicam que, conforme essas empresas melhoram seus resultados, recebem a confiança dos especialistas e consequentemente dos investidores.

A catarinense Renar Maçãs tem procurado reduzir os ruídos na comunicação, facilitando a cobertura dos analistas. Com faturamento de R$ 44,2 milhões em 2013, a companhia vem tomando algumas medidas para qualificar seu investidor. Na semana passada, sua diretoria anunciou o agrupamento de 151,8 milhões de ações ordinárias em 7,593 milhões de ações em circulação. O objetivo foi valorizar o papel, que estava valendo centavos na bolsa. “Esse movimento é para atrair mais investidores qualificados e nos adequarmos às recomendações da bolsa”, diz Henrique Roloff, diretor de relações com investidores da Renar Maçãs.