Depois da celeuma em torno da criação de uma nova CPMF para transações eletrônicas, entra em cena a tributação de dividendos pagos pelas empresas a seus acionistas. Das várias hipóteses consideradas pelo governo para a reforma tributária, a que parece ter mais chance de passar em uma votação no Congresso é a alíquota de 15% de Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). A princípio, isso vai prejudicar principalmente aqueles investidores que compram ações de companhias que pagam dividendos. Alguns, inclusive, têm nessa estratégia sua principal fonte de renda e, certamente, terão seus ganhos reduzidos. Os especialistas de mercado concordam que, de imediato, haverá perdas, mas avaliam que não se pode considerar apenas essa situação. Analista de ações da Spiti, Gustavo Almeida afirmou à DINHEIRO que “é preciso olhar para outras perspectivas, pois se trata de uma mudança estruturante”. Para ele, a proposta inicial prevê cobrança da alíquota sobre pagamento de dividendos provenientes também de fundos de investimento imobiliário e títulos de letra de crédito, além de revogar a isenção da tributação do mercado financeiro de capitais relativo à venda de ações no valor de até R$ 20 mil. “Mas, na outra ponta, haverá redução da carga tributária sobre as empresas e sobre os trabalhadores que ganharem até R$ 4.999”.

A perda para o investidor seria maior se o governo mantivesse a carga tributária das empresas e ainda tributasse os dividendos. Mas, como a intenção é reduzir a alíquota do imposto de renda para pessoa jurídica dos atuais 34% para 20%, as empresas pagarão menos impostos, passarão a ter mais capacidade de investir e, consequentemente, de obter melhores resultados. Ao lucrar mais, pagam mais dividendos, compensando a perda inicial.

“Pode não ser positivo de imediato, mas será lá na frente”, afirmou Almeida. Se a regra for aprovada do jeito que foi apresentada, poderá até haver uma pequena vantagem para o investidor. O gestor da Infinity Asset, Victor Hasegawa, fez as contas para demonstrar esse possível ganho. Se um empresa que lucra R$ 100 milhões paga 34% de imposto, fica com R$ 66 milhões. Se ela resolver distribuir 50% do valor que sobrou, então pagará R$ 33 milhões de dividendos a seus acionistas. No modelo proposto, com imposto de 20% e mesmo percentual de distribuição do lucro, os acionistas receberiam R$ 34 milhões, já descontada a alíquota. “Mas não acredito que fique dessa forma. O governo não quer perder. No máximo, vai fazer empatar para desonerar as empresas”, afirmou Hasegawa.

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“O cenário de juros baixos, inflação controlada e, possivelmente, empresas com tributação menor será vantajoso para reinvestir o capital” André Pimentel, performa partners.

LETÔNIA E ESTÔNIA A cobrança de impostos sobre dividendos não é novidade. Ela ocorria no Brasil até 1995 e era de 15%. A alíquota deixou de ser cobrada após aprovação da Lei 9.249/1995, que entrou em vigor em janeiro de 1996. A medida também contribuiu para atrair mais investidores para a bolsa, numa época em que a economia brasileira tinha fundamentos menos sólidos. Um estudo da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco), com base em informações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), aponta que, de todos os membros da entidade internacional, apenas Letônia e Estônia não taxam dividendos. Nesses países, porém, a carga de impostos sobre as companhias é de 20% (ver tabela).

Justamente pelo fato de a maioria dos países cobrarem alíquotas dos dividendos, os especialistas não acreditam que os investidores se afastem do mercado brasileiro. “Além disso, o cenário de juros baixos, inflação controlada e, possivelmente, empresas com tributação menor será vantajoso para reinvestir o capital”, afirmou André Pimentel, da Performa Partners. Uma das preocupações expostas pelos especialistas é em relação à estratégia para aprovar a reforma. O governo costuma fatiar o projeto para aprovar partes menos polêmicas e depois tentar passar as outras propostas. O perigo, avaliam, é a tributação dos dividendos ser aprovada, mas a redução dos tributos das empresas ficar para outra etapa. Nesse caso, perderemos todos.