A presidente da República afastada, Dilma Rousseff, afirmou nesta  segunda-feira, 27, que a perícia feita pelo corpo técnico do Senado  atesta a inexistência de crime de responsabilidade nos atos que embasam o  pedido de impeachment em tramitação no Congresso. “Hoje ficou  caracterizado que os motivos pelos quais eles me acusam não caracterizam  crime. Nós viemos dizendo isso há muito tempo, mas agora a própria  perícia constatou isso”, disse em entrevista concedida à Rádio Guaíba,  do Rio Grande do Sul.

A perícia realizada pelo corpo  técnico do Senado veio a público hoje com a divulgação do laudo do  trabalho. O documento responsabiliza a petista pela liberação de  créditos suplementares por meio de decreto, sem o aval do Congresso, mas  isenta Dilma da atuação nas pedaladas fiscais. Sobre os decretos, ela  disse que não foi constatada nenhuma participação dolosa de sua parte.  ”Não há, em nenhum momento, um alerta ou um parecer técnico que diga  ’presidenta, se você assinar este decreto estará comprometendo a meta  fiscal’. Por isso fica cada vez mais claro que este processo de  impeachment não tem base legal, não tem fundamentação”, afirmou.

Na  entrevista, Dilma reafirmou que está trabalhando para reverter o  processo de afastamento no plenário do Senado, na votação que deve  ocorrer em agosto. “Não só tenho esperança como tenho sistematicamente  feito tratativas nesta direção, conversando com senadores e discutindo  também com os movimentos sociais”, falou.

A presidente  afastada também disse que, caso seja absolvida no processo de  impeachment, ela ainda não sabe se chamaria um plebiscito para a  convocação imediata de novas eleições presidenciais. “Ainda não há  consenso entre as diferentes forças que me apoiam”, disse. Segundo ela, a  certeza que se tem no momento é que a volta “plena e irrestrita” de seu  mandato é condição essencial para a manutenção do processo democrático.  ”Caso contrário estaremos sempre na ilegalidade, que é a ruptura  democrática sem causa. É como rasgar a Constituição.”

Dilma  comentou que não sabe se vai pessoalmente defender seu mandato na  Comissão Especial do Impeachment no Senado. Segundo ela, esta questão  está sendo avaliada. “Teria oportunidade de falar ao Senado em duas  circunstâncias: uma delas é na comissão, mas creio que seria mais solene  falar ao plenário, a todos os senadores”, citou.

Ao longo  da entrevista, que durou cerca de 40 minutos, a presidente afastada  voltou a denunciar “vazamentos seletivos da operação Lava Jato” com o  intuito de atingir seu governo. Ela ainda criticou medidas tomadas pelo  presidente em exercício, Michel Temer, como a extinção do Ministério da  Igualdade Racial e dos Direitos Humanos e o não pagamento do reajuste do  Bolsa Família.

Solidez

Sobre a  situação econômica, Dilma comentou que a trajetória de desaceleração da  inflação e a “robustez econômica” recentemente exaltada pelo Ministério  da Fazenda são mérito da gestão do PT. “Se a inflação hoje se projeta  para a meta, deve-se ao que nós fizemos”, disse.

Ela citou o  fato de o Ministério da Fazenda ter dito, na semana passada, por meio  de nota, que o Brasil tem uma situação econômica sólida e segura, com  fundamentos robustos, e que, portanto, está preparado para atravessar  com segurança períodos de instabilidade externa, referindo-se às  possíveis consequências da decisão dos britânicos de deixar a União  Europeia. “Quem é que construiu esta robustez? O governo provisório,  interino e ilegítimo nos último mês e meio ou nós nos últimos anos? Nós  nos últimos anos”, ressaltou a presidente afastada.

Na  entrevista, Dilma afirmou também que o Brasil teria saído “mais  facilmente” da crise econômica que atravessa se, em 2015, os opositores  ao seu governo “não tivessem criado junto uma crise política”. Ela  lembrou a atuação do então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo  Cunha (PMDB-RJ). “Ele não só barrava a reforma fiscal como fazia com que  tivéssemos obrigações, as chamadas pautas-bomba”, falou. “Criaram  empecilhos para uma reforma que, naquele momento, em 2015, teria sido  mais suave.”

Sobre o sistema político brasileiro, Dilma  opinou que é impossível governar um país com a quantidade de partidos  que existe hoje no Brasil – que, segunda ela, leva a uma inevitável  fragmentação. “No período FHC, se fazia maioria simples com três  partidos. No governo do presidente Lula, eram necessários oito partidos.  No meu governo, 14 faziam maioria simples”, falou.

Dilma  ainda admitiu que pode ter cometido erros no diálogo com o Congresso.  Ela ponderou que fez o possível para tratar com os parlamentares temas  de interesse nacional, mas que não se arrepende de ter evitado “certo  tipo de conversa” com políticos. “Uma certa conversa que leva a  negociações que muitas vezes não são republicanas de fato eu não gosto.  Podem me chamar de dura ou do que for. Não faço esse tipo de conversa  porque eu acho que não é correto”, destacou.