A Petrobras decidiu avançar com o projeto UFN-III, uma fábrica de fertilizantes. A decisão foi tomada pelo Conselho de Administração, comunicada ao mercado ainda na última sexta, 25, e recebida pelo mercado com ‘ceticismo’. O investimento estimado para o projeto é de cerca de R$ 3,5 bilhões e a previsão de início de operação é em 2028.

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Embora a decisão de investimentos da Petrobras não se traduza em um impacto financeiro volumoso e implique em uma drenagem do caixa da empresa, o mercado não esconde que não vê com bons olhos o caminho que a estatal está decidindo trilhar.

O aporte em fertilizantes em si não assusta, já que em ocasiões passadas a companhia já havia revelado que olhava para o setor – considerado de retornos baixos pelos analistas.

“A decisão de investir em fertilizantes é controversa por causa de seus retornos mais baixos, mas não é totalmente inesperada. A Petrobras assegurou aos investidores que a decisão de investimento segue diretrizes de governança muito rígidas para garantir a criação de valor para os acionistas”, dizem os analistas Regis Cardoso e Helena Kelm, da XP.

Os especialistas observam que o projeto não é relevante para o caso de investimento da Petrobras, com Capex remanescente estimado em R$ 3,5 bilhões até 2028, mas a decisão em si ‘levanta preocupações sobre a futura alocação de capital no próximo plano de negócios’.

A recomendação da XP é de compra para os papéis PETR4, com preço-alvo de R$ 45,10.

João Daronco, da Suno Research, comenta que o volume financeiro é baixo e não assusta, mas é preciso monitorar os próximos passos das companhia nos planos seguintes.

“Entendo que não seria surpresa a companhia continuar investindo em verticais fora do seu core business [negócio principal], até porque já tivemos alguns comunicados acerca disso ao longo dos últimos anos. O grande ponto é entender qual o tamanho desses investimentos e o prazo, sendo esses dois pontos os principais que tenho aguardado no planejamento estratégico 2025-2029”.

Analistas do Citi, da mesma forma, apontam que enxergam a decisão ‘com certo ceticismo’.

Os analistas da casa, Gabriel Barra, Andrés Cardona e Pedro Grama, observam que o mercado brasileiro de fertilizantes é atraente, mas questionam se a Petrobras conseguiria ser competitiva atuando nesse setor, especialmente considerando o alto preço do gás natural.

A projeção da casa é de que, com a conclusão do projeto e das outras três unidades de fertilizantes, a estatal deve deter uma fatia de 35% do mercado de ureia no Brasil.

Assim, o Citi defende que a empresa deveria alocar seu capital em projetos de upstream, visando uma Taxa Interna de Retorno (TIR) maior – além do fato de ser o setor que a petroleira já tem expertise.

Projetos de upstream são o primeiro estágio da cadeia de fornecimento de petróleo, focando na exploração e produção de petróleo bruto e gás natural em reservatórios subterrâneos.

A recomendação da casa é neutra para os American Depositary Receipts (ADRs) da Petrobras, com preço-alvo de US$ 15.

‘Decepção da ANSA’

Mesmo o BTG Pactual, que está otimista com a companhia, destacou ‘os desafios que o setor de fertilizantes já apresentou para a Petrobras’, citando os resultados da ANSA, que segundo a casa foram ‘evidentemente decepcionantes’. A ANSA é uma fábrica de fertilizantes da empresa que fica localizada em Araucária, no Paraná.

A ANSA teve suas atividade retomadas em meados de agosto deste ano – estava hibernada desde 2015 – e os investimentos previstos para reabertura da unidade são de R$ 870 milhões, com expectativa de retomada da produção no segundo semestre de 2025.

“Acreditamos que os investidores trarão justificadamente um alto grau de ceticismo aos retornos esperados desses empreendimentos. Dito isso, assumindo que o investimento de R$ 3,5 bilhões seja feito ao longo de 2025-2028”.

Assim, o BTG aponta que em termos de influência nos dividendos da Petrobras, o impacto esperado do UFN-III no rendimento de dividendos (dividend yield) é de apenas 10 pontos base (bps) por ano.

A casa tem recomendação de compra para os ADRs da Petrobras, com preço-alvo de US$ 19.

Fertilizantes são tema na discussão de soberania

Analistas do Citi, em seu parecer, também apontaram que há uma dependência do mercado externo para o abastecimento de fertilizantes NPK.

Recentemente a presidente da Embrapa, Silvia Maria Fonseca Silveira Massruhá, declarou em entrevista ao Dinheiro Rural que esse é um tópico central na discussão do futuro da agricultura sustentável e da soberania nacional.

“Discutimos também a questão dos bioprodutos porque isso acaba sendo fertilizantes. O Brasil hoje importa 85% dos fertilizantes usados, uma dependência grande. Então tem também a questão de soberania nacional de como diminuir essa dependência. Temos ainda parceria com a Petrobras para discutir alternativas ao que hoje é uma das maiores emissões de gases de efeito estufa, que é a aviação”, disse.

“É um desafio porque biocombustível pode ser uma alternativa, mas temos que dar escala a isso. E o Brasil pode ser protagonista nisso. Seriam alternativas para não dependermos só do petróleo”, completou.

Daronco, da Suno Research, explica que o mercado tem tamanho, porém é pulverizado, o que seria um problema para a estatal brasileira.

“O mercado de fertilizantes no Brasil é gigante, isso é inegável, entretanto é extremamente competitivo e com grandes players tendo o controle. Ao longo das últimas décadas, não foi um mercado que trouxe grandes retornos para seus investidores, por isso não me faz brilhar os olhos”.