29/05/2025 - 7:51
A Polícia Federal (PF) deflagrou nesta quarta-feira, 28, nova fase da Operação Sisamnes, que apura a suspeita de venda de sentenças judiciais, e prendeu cinco investigados por envolvimento no assassinato do advogado Roberto Zampieri, apontado como “lobista dos tribunais”. Segundo a PF, a partir do homicídio, ocorrido em dezembro de 2023, em Cuiabá, foi descoberto um grupo que seria especializado em espionagem e execução de autoridades.
Procuradas pelo Estadão, as defesas de todos os detidos não haviam se manifestado até a noite de ontem.
Uma lista com nomes de parlamentares e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) foi encontrada com investigados por ligação com o suposto grupo de extermínio autodenominado C4 (Comando de Caça a Comunistas, Corruptos e Criminosos), de acordo com a PF. Na lista constariam nomes como os do ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e dos ministros Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin. Pacheco cobrou ontem a apuração do caso (mais informações nesta página).
Ainda de acordo com a PF, o grupo tinha uma tabela de preços por execução. Os valores chegariam a R$ 250 mil – no caso de senadores, eram R$ 150 mil e de deputados, R$ 100 mil. As informações constam de anotações encontradas com investigados. A PF apura agora se houve, de fato, alguma articulação de atentado.
Crime
Roberto Zampieri foi executado na porta de seu escritório, na capital mato-grossense. O advogado foi atingido por oito tiros à queima-roupa. Ele foi o pivô da investigação sobre suspeita de negociação de decisões no Tribunal de Justiça de Mato Grosso e no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Mensagens encontradas no celular do advogado levantaram a suspeita de compra e venda de sentenças judiciais e deram início ao inquérito.
Em 2024, a Polícia Civil de Mato Grosso já havia apontado que os suspeitos fariam parte de uma “rede organizada, voltada para a execução (homicídios) de terceiros, mediante a contratação e financiamento por parte de seus respectivos mandantes, conforme restou cristalino no caso da morte do advogado Roberto Zampieri”.
Um dos alvos da operação de ontem, o fazendeiro Aníbal Manoel Laurindo é suspeito de ser o mandante do homicídio do advogado. Ele alega inocência. Para os investigadores, o crime teria sido motivado por disputa fundiária em torno de uma fazenda de 5 mil hectares em Ribeirão Cascalheiras, a 960 km de Cuiabá.
Disfarce
Preso e indiciado como o pistoleiro que matou Zampieri, o pedreiro Antônio Gomes da Silva confessou a execução e relatou aos investigadores que receberia R$ 40 mil pelo serviço. Para se aproximar do advogado e armar a emboscada, afirmou, se apresentou como capelão e usou boina e bengala como disfarces. Testemunhas o reconheceram e imagens de circuito de segurança o flagraram.
O instrutor de tiro Hedilerson Fialho Martins Barbosa foi identificado como o dono da pistola 9 milímetros usada no crime. A arma teria sido descartada em lixeira de uma parada de ônibus em Rondonópolis, a cerca de 200 km de Cuiabá, segundo a versão do atirador. Em depoimento à Polícia Civil da capital de Mato Grosso, o instrutor admitiu que “indicou” o pistoleiro para o serviço e afirmou que não recebeu nada para emprestar a pistola.
Já o coronel reformado do Exército Etevaldo Caçadini de Vargas foi citado pelo pistoleiro como a pessoa que pagou um sinal de R$ 20 mil pelo assassinato de Zampieri. À Polícia Civil, Caçadini negou envolvimento na execução.
Frente Patriótica
Caçadini é dono do canal Frente Ampla Patriótica, criado após o 8 de Janeiro. Além de grupos no WhatsApp, há um canal no YouTube para, segundo ele, reunir “patriotas e conservadores do Brasil”. O coronel publicou uma centena de vídeos na plataforma desde então em que defende abertamente ideias golpistas. Outro preso pela PF, ontem, é Gilberto Louzada da Silva, que se apresenta como sargento reformado, consultor de segurança patrimonial e privada, especialista em armas e instrutor de tiro certificado pelo Exército.
‘Senhas’
As primeiras suspeitas sobre o grupo de extermínio surgiram há mais de um ano. Mensagens encontradas no celular de um dos investigados acenderam o alerta. As conversas abordavam “missões” e “festas” que, segundo os investigadores, seriam planos de execução sob encomenda.
Os diálogos estão transcritos em um relatório da Polícia Civil de Mato Grosso ao qual o Estadão teve acesso. O documento analisa mensagens trocadas pelo detidos ontem pela PF. Naquele momento, a Polícia Civil afirmou: “Pelo que restou evidente dos diálogos, Hedilerson Barbosa, Etevaldo Caçadini, Gilberto (a investigar) e Antônio Gomes possivelmente fazem parte de uma rede organizada, voltada para a execução de terceiros, mediante a contratação e pagamento de seus respectivos mandantes”.
Com a apreensão do celular de Hedilerson Barbosa, dono da arma usada no crime, a Polícia Civil concluiu que o assassinato de Zampieri não foi isolado. Nas conversas, segundo os policiais, o grupo usava codinomes. Caçadini era “engenheiro” e Antônio Gomes, “empreiteiro”. Também se valiam de senhas para se referir aos crimes, como “missões”, “festas” e “reza”, sustenta a polícia.
Peritos da Polícia Civil destacaram no relatório conversas entre Barbosa e Louzada sobre Antônio Gomes. “Frio e calculista. Excelente aquisição ao pelotão. Só pelo último serviço já tem minhas recomendações”, disse Louzada. “Ele é top”, afirmou Barbosa.
Os diálogos analisados ocorreram entre setembro e dezembro de 2023.
‘Como se o País fosse terra sem leis’, diz Pacheco
O ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) classificou como “fato estarrecedor” seu suposto monitoramento e de outras autoridades por um grupo de extermínio. Em nota, o senador disse que o caso sob investigação da Polícia Federal é grave e que espera o andamento das apurações para uma possível responsabilização dos envolvidos.
“Externo meu repúdio em razão da gravidade que representa à democracia a intimidação a autoridades no Brasil, com a descoberta de um grupo criminoso, conforme investigação da Polícia Federal, que espiona, ameaça e constrange, como se o País fosse uma terra sem leis”, diz o comunicado divulgado por Pacheco.
Apreensão
Além dos cinco presos preventivamente na operação de ontem, quatro investigados vão ser monitorados por tornozeleira eletrônica. A PF fez buscas em seis endereços em Mato Grosso, São Paulo e Minas Gerais. Foram apreendidos fuzis e pistolas com silenciador, munição, lança-rojão, explosivos com detonação remota, carros e placas frias. A nova fase da Operação Sisamnes foi autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cristiano Zanin.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.