O relatório preliminar do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), da Força Aérea Brasileira (FAB), apontou que o ATR-72 da Voepass, que caiu em 9 de agosto em Vinhedo, no interior de São Paulo, perdeu o controle durante o voo em condições de gelo severo. O sistema de gravação de voz, um dos dispositivos da “caixa-preta”, registrou o comandante relatando, ainda durante a subida, uma falha no dispositivo que retira a camada de gelo formada nas asas da aeronave. A investigação ainda deve demorar mais de um ano.

A falha no sistema de degelo, contudo, não foi vista entre os dados caixa-preta, segundo o chefe do Cenipa, brigadeiro do ar Marcelo Moreno. “Até o momento, temos uma fala em que um dos tripulantes indica que tem uma falha no sistema ‘de-icing’, mas essa informação não foi confirmada no gravador de dados. Isso será matéria de análise futura”, afirmou.

A formação de gelo nas asas desse modelo não é considerada incomum, dependendo das condições meteorológicas, e a aeronave tem mecanismos de detecção e acionamento para retirada da camada. A permanência de gelo pode afetar o controle do avião e a sua sustentação. O voo decolou de Cascavel (PR) em direção a Guarulhos (SP) às 11h58.

A investigação preliminar apontou que o chefe da tripulação comentou sobre uma falha no sistema de degelo às 12h15, durante o procedimento de subida. A aeronave alcançou os 17 mil pés previstos, o equivalente a 5.181 metros, às 12h21.

Mais tarde, às 13h20, o copiloto diz: “bastante gelo”. Os comentários foram registrados pelo mecanismo que grava as conversas da cabine do avião, um dos dispositivos da caixa-preta. Um minuto depois, a aeronave saiu do controle até se chocar contra o chão, às 13h22. “Durante a subida ainda, o comandante comenta, através do (registrado) no CVR (Cockpit Voice Recorder, gravador de voz do cockpit), que existia ali uma possível falha no sistema de degelo. Já (com a aeronave nivelada), o copiloto comenta ‘bastante gelo’. Foram esses os dois comentários sobre gelo e a falha de sistema”, disse o investigador encarregado, o tenente-coronel aviador Paulo Mendes Fróes.

O botão que aciona o sistema de degelo das asas foi acionado três vezes pela tripulação. Contudo, técnicos afirmam que não é possível dizer até o momento se o mecanismo foi desligado por piloto ou copiloto ou se foi uma falha do sistema da aeronave. O acionamento ocorreu após alertas automáticos do avião, que detectaram velocidade reduzida e performance afetada como efeito do gelo nas asas.

O gelo nas asas de aeronaves como o ATR-72 pode afetar a sustentação, como especialistas haviam cogitado anteriormente, fazendo com que o avião perca controle e altitude, o que aconteceu no caso do voo da Voepass. O órgão da FAB destacou ainda que a tripulação não declarou emergência às autoridades durante o problema, que se agravou em um curto intervalo de tempo.

CONDIÇÕES DE VOO

A investigação preliminar aponta que a aeronave tinha condições de voo na situação de “gelo severo”, que era amplamente conhecida no dia do acidente, e piloto e copiloto possuíam o treinamento necessário para voar em condições como aquela. Além disso, segundo o Cenipa, a aeronave estava com os procedimentos necessários de manutenção em dia.

O tenente-coronel Mendes Fróes começou a apresentação detalhando informações sobre a aeronave e o plano de voo. Detalhou ainda o trajeto feito pela aeronave de Cascavel até a queda em Vinhedo e, na sequência, elencou a sequência de medidas adotadas pela FAB assim que houve a comunicação da ocorrência.

“Era previsto gelo severo na rota e previsão de formação de gelo entre 12 mil pés e 21 mil pés. Essas informações meteorológicas estavam disponíveis via internet”, disse o oficial. O investigador detalhou os mecanismos de proteção contra gelo no avião da Voepass.

A aeronave completou cinco voltas antes da queda no solo, em um condomínio residencial em Vinhedo, segundo o que foi apontado pelos dados das caixas-pretas. A investigação exibiu ainda um vídeo que simulou as condições nos minutos finais do trajeto, a partir dos dados recuperados.

SEM RESPONSABILIZAÇÃO

O avião, de matrícula PS-VPB, caiu no interior de São Paulo durante o trajeto que fazia de Cascavel, no Paraná, até Guarulhos. Os peritos do Cenipa trabalham para descobrir as causas da queda desde o dia do acidente. De lá para cá, passos importantes foram dados para a construção do relatório que, como afirma a FAB, não tem o objetivo de apontar culpados ou responsabilidades, mas de investigar o caso tecnicamente de modo a prevenir novas ocorrências semelhantes.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.