Ainda falta cerca de um ano para que o primeiro carro saia da linha de montagem da fábrica da sul-coreana Hyundai que está sendo construída no distrito industrial de Piracicaba, município do interior de São Paulo, com uma população de 365 mil habitantes. Mesmo assim, a cidade já sente os impactos econômicos e culturais da presença da montadora. Apesar de o município ter se firmado como polo agroindustrial – onde estão instaladas unidades da usina Cosan, do segmento sucroalcooleiro, e da Caterpillar, fabricante de máquinas pesadas, entre outras –, a chegada dos sul-coreanos está mexendo com o dia a dia dos piracicabanos. As principais mudanças são culturais. Para fazer com que os visitantes se sintam em casa, muitos moradores e empresas locais estão procurando se adaptar aos hábitos dos recém-chegados. Um bom exemplo é a rede de farmácias Drogal. Os funcionários das 20 unidades contam, agora, com uma nova ferramenta de trabalho: uma apostila com frases no idioma coreano.

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Para qualificar melhor seus empregados, Marcelo Cançado, diretor da rede, contratou uma consultora, Andréia Lee, formada em psicologia e pedagogia, nascida na Coreia do Sul e radicada no Brasil há 40 anos. Algumas recomendações da consultora podem soar estranhas para os brasileiros. “São consideradas ofensas graves olhar nos olhos do interlocutor ou falar com uma mulher acompanhada do marido ou namorado”, diz Cançado. O empresário acredita que é importante adaptar seu negócio a uma clientela que só tende a crescer. Hoje, há apenas 150 sul-coreanos morando na cidade. Mesmo assim, eles já se destacam na multidão. O fluxo é estimado em mil imigrantes, por ano, durante todo o período de operação da fábrica. De olho nesse contingente, outras nove empresas piracicabanas contrataram os serviços de Andréia, que até 2010  administrava uma empresa de equipamentos de segurança em, São Paulo, em parceria com o marido, Luiz.

 

Quando ficou sabendo que a Hyundai se instalaria em Piracicaba, o casal resolveu mudar-se para lá em busca de novas oportunidades de negócio. “Enxerguei um excelente nicho de mercado”, diz Andréia. Além de ajudar a desvendar a cultura coreana, Andréia dá aulas de português aos estrangeiros expatriados pela Hyundai. O casal também é dono de um restaurante especializado em comida coreana. A próxima empreitada da dupla é um hotel voltado aos compatriotas. Para atender esse público, mais outros quatro estabelecimentos de culinária típica foram abertos na cidade. O maior movimento acontece durante a noite, quando os integrantes da colônia se reúnem nesses locais para assistir  a programas da tevê coreana, transmitidos por emissoras por assinatura. Os locais são um ponto de encontro para os estrangeiros. Lá, além de desfrutar da companhia de seus conterrâneos, eles matam saudades da pátria. 

 

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Outra ação específica para os estrangeiros foi a criação de um curso de português para os trabalhadores coreanos, oferecido pelo Colégio Piracicabano, em parceria com a Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep). “É importante saber tirar proveito da ampliação dos movimentos imigratórios em direção ao Brasil”, diz o advogado Luís Renato Vedovato, doutorando em direito internacional pela Universidade de São Paulo. E é exatamente isso que o piracicabano André Hayafugi, dono da padaria Pink’s tem feito nos últimos meses. Descendente de japoneses, ele adicionou 35 produtos asiáticos ao seu estoque. “Esse se tornou o grande diferencial do meu comércio”, diz. Com a ampliação da lista de refrigerantes e guloseimas típicas, as vendas da padaria cresceram 15%. Outro empreendedor que nutre grandes expectativas com relação à nova fábrica é Beneditto Giannetti, proprietário do Esporte Clube Piracicabano de Automobilismo (ECPA), um complexo que inclui autódromo e kartódromo. 

 

Segundo ele, 40% de seu faturamento, em 2010, foi obtido com o aluguel da pista para montadoras. “Até 2014, esperamos crescer 400%, e a Hyundai será uma das responsáveis por isso”, diz. Para José Antônio Godoy, secretário do governo de Piracicaba, a presença da Hyundai na cidade  representará, ainda, um grande ganho em tributos para o município. Com os incentivos fiscais e mais o terreno cedido pela prefeitura, a Hyundai deixou de desembolsar R$ 30 milhões. “O retorno será quase imediato, pois no primeiro ano de operação da fábrica estimamos arrecadar cerca de R$ 50 milhões em impostos”, diz Godoy. O secretário, no entanto, aponta uma consequência indesejada à invasão asiática, como a especulação imobiliária. “O aluguel e os preços de venda dos  imóveis já dobraram de valor”, afirma Godoy. 

 

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