O contrabando de CDs é conhecido. O de componentes de informática também já fez fama no mercado. Os piratas, agora, estão se aventurando em outros mares: o comércio de óculos. Segundo cálculos da Associação Brasileira de Produtos e Equipamentos Ópticos (Abiótica), um terço do faturamento do setor no ano passado foi abocanhado pelo comércio ilegal. Neste ano a situação ficou ainda pior. Entre janeiro e maio, segundo levantamento da entidade, 67% das armações de grau e de sol vendidas no Brasil eram de origem duvidosa, em torno de R$ 100 milhões. Nesse mesmo período, a Receita Federal deixou de arrecadar R$ 200 milhões e 2.700 trabalhadores foram mandados embora por causa do encolhimento do setor.

Segundo o presidente da Abiótica, Synésio Batista da Costa, o contrabando de óculos vem aumentando por causa da repressão da Receita Federal em setores como o de informática. Em outras palavras, os piratas estão migrando para atividades mais simples. E se a Abiótica está preocupada com o contrabando feito em ?malas carregadas por chineses?, como conta Costa, não esconde também a apreensão com lojistas, fabricantes e distribuidores do setor envolvidos com irregularidades.

A operação de subfaturamento de compras é uma das mais comuns. E é bem simples ? até que seja flagrada. As guias de importação são falsificadas e um óculos que vale de US$ 30 a US$ 40 a unidade, passa a custar incríveis US$ 3 a dúzia, ou até menos. Esse mesmo modelo poderá ser encontrado nas lojas por até R$ 800. Em duas das principais apreensões feitas pela Receita Federal no primeiro semestre no Aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP), os funcionários encontraram 42,5 mil óculos subfaturados ou que passaram por um esquema chamado de drawback. Nele, o importador declara estar trazendo peças de óculos, cujo imposto é bem mais baixo do que o cobrado pelo acessório acabado. Na verdade eles estão inteiros e serão mais tarde distribuídos no mercado interno e exportados como se tivesse sido montado no Brasil. A Receita investiga no momento um grande fabricante do Estado de São Paulo, conhecido no mercado por trabalhar com grifes famosas e que foi flagrado na operação de drawback.

Nas duas apreensões em Viracopos, segundo o inspetor de alfândega Marcos Bessa Nisti, a sonegação de impostos estaduais e federais foi de aproximadamente R$ 100 mil. ?A desvalorização cambial fez com que o contrabando de informática diminuísse e surgiram outros produtos. No caso do óculos, é um produto pequeno, fácil de transportar?, explica Nisti. Em uma pequena mala de viagem, segundo o presidente da Abiótica, é possível transportar 2 mil armações, suficientes para abastecer uma ótica durante um mês inteiro. No ano passado, 25,5 milhões de óculos foram vendidos nas 18 mil óticas brasileiras. Na Fotóptica, a maior rede do setor no País com 110 lojas, não há cálculos de quanto se perde com o contrabando, mas a empresa também sentiu a retração do mercado no primeiro semestre. ?Na primeira compra as pessoas costumam se impressionar com o preço e acabam levando um produto pirata?, diz Mauro Motta, diretor comercial da Fotóptica. ?Depois começam a ter problemas e recorrem às empresas sérias?. A Abiótica calcula que pelo menos 60 contrabandistas estejam agindo no País, trazendo mercadoria da China, Itália, Coréia, Taiwan. Quem é associado à entidade e é pego envolvido com contrabando é excluído das reuniões da categoria. ?Claro que não pode participar. Não admitimos quem joga nos dois times?, explica Synésio da Costa, que aposta em uma recuperação das vendas no segundo semestre. A própria contratação de Synésio para a presidência da Abiótica já é uma forma de a entidade reagir à pirataria. Também presidente da Associação dos Fabricantes de Brinquedos, ele tem experiência no combate ao mercado clandestino. No mês que vem acontece em São Paulo a principal feira do setor, a Óptica. Além dos novos contratos ? os negócios durante o evento devem chegar a R$ 240 milhões ?, os expositores vão incluir na pauta os estragos causados pelo contrabando.