03/05/2019 - 11:00
Os nomes de pessoas ligadas a dois ex-presidentes da Câmara Municipal de São Paulo aparecem como recebedores de dinheiro da Odebrecht na planilha da transportadora de valores usada pela empreiteira para pagar propina e caixa 2 a políticos e agentes públicos na capital paulista. Os pagamentos somam R$ 1,1 milhão e teriam ocorrido em setembro de 2014, destaca o jornal O Estado de S. Paulo.
Fabiano Rosas Alonso, genro de Antonio Carlos Rodrigues (PR), é apontado no arquivo da Transnacional como destinatário de dois pagamentos de R$ 500 mil. Rodrigues, que também foi senador e ministro, hoje está sem mandato. Já Fabio Ferreira de Araújo, que é chefe de gabinete do vereador José Police Neto (PSD), teria recebido R$ 100 mil, segundo os registros obtidos pelo jornal.
Os pagamentos aparecem com as mesmas datas, valores e senhas que estão nas planilhas da Odebrecht e do doleiro Álvaro José Novis, responsável por providenciar as entregas de dinheiro da empreiteira em São Paulo e no Rio. Esses documentos, porém, não apontavam os nomes dos intermediários – salvo raras exceções -, como a planilha da transportadora.
Nem Rodrigues nem Police Neto foram citados pelos 77 delatores da Odebrecht no acordo de colaboração premiada celebrado com a Procuradoria-Geral da República e homologado em 2017 pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no âmbito da Operação Lava Jato. À reportagem, ambos negaram ter recebido dinheiro da empreiteira, assim como Alonso e Araújo.
Apartamento
O nome de Alonso e o telefone celular usado por ele aparecem na planilha da Transnacional ao lado de duas entregas de R$ 500 mil em dinheiro que teriam sido feitas no apartamento dele no Panamby, zona sul de São Paulo, nos dias 19 e 26 de setembro de 2014. As senhas usadas nos supostos pagamentos ao genro de Rodrigues estão vinculadas ao codinome “Projeto”, atribuído pela Odebrecht ao ex-prefeito e ex-ministro Gilberto Kassab (PSD), hoje secretário licenciado do governo João Doria (PSDB) no Estado.
Presidente da Câmara paulistana durante a gestão Kassab na Prefeitura (2007-2010), Rodrigues também foi presidente nacional do PR, partido que apoiou a reeleição da presidente cassada Dilma Rousseff (PT) em 2014. Naquele ano, Carlinhos, como é conhecido, era senador, na vaga aberta pela então petista Marta Suplicy. Em 2015, ele assumiu o Ministério dos Transportes, onde ficou até o afastamento de Dilma, em maio de 2016.
Em novembro de 2017, Rodrigues e o genro foram presos na Operação Caixa d’Água, acusados de intermediar repasse de R$ 3 milhões feito pela JBS via caixa 2 para campanhas eleitorais dos ex-governadores do Rio Anthony e Rosinha Garotinho, ambos do PR. Segundo o delator Ricardo Saud, que fechou acordo de delação premiada com a PGR, o pagamento da suposta propina foi feito a Alonso a pedido de Rodrigues.
Rodrigues e o genro foram denunciados pelo Ministério Público Eleitoral do Rio por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Ambos foram soltos ainda em 2017 por decisão do ministro Gilmar Mendes, do STF. A ação penal foi suspensa em 2018 pelo ministro Dias Toffoli, que viu incompetência da Justiça Eleitoral de Campos dos Goytacazes (RJ) para julgar o caso.
Os dois já haviam sido alvo da Polícia Federal em 2008, em operação que investigou suposta participação em esquema de tráfico de influência e corrupção que manteve aberto um prostíbulo usado para lavar dinheiro desviado do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Eles não foram denunciados.
Skype
No caso envolvendo o chefe de gabinete do vereador Police Neto, a indicação de um pagamento de R$ 100 mil não aparece apenas na planilha da Transnacional. Mensagens de Skype trocadas entre funcionários da transportadora no dia da suposta entrega, em 18 de setembro de 2014, mencionam o nome de Araújo e o número de telefone celular usado por ele até hoje. As informações apareceram no inquérito que investiga pagamentos a políticos do MDB feitos na mesma data.
Segundo os registros, a entrega a Araújo ocorreu no 17.º andar de um prédio empresarial na Avenida Paulista, onde hoje funcionam escritórios de coworking. O valor que teria sido pago ao assessor de Police Neto está vinculado na planilha da Odebrecht ao codinome “Remoterra”, atribuído à obra do Parque da Cidade, empreendimento imobiliário na zona sul.
Em depoimento, dois delatores afirmaram ter pago R$ 6 milhões ao ex-secretário Orlando de Almeida Filho (Controle Urbano), já falecido, e R$ 1 milhão a um arquiteto, para conseguir a aprovação na Prefeitura, na gestão Kassab. Não houve nenhuma menção a Police Neto. Vereador desde 2005, com foco em urbanismo, ele foi presidente da Câmara entre 2011 e 2012. Em 2014, ano do suposto pagamento, tentou se eleger deputado estadual, sem êxito – declarou R$ 2,1 milhões em doações, nenhuma da Odebrecht.
Defesas
Os dois supostos intermediários citados na planilha da transportadora de valores usada pela Odebrecht e os dois ex-presidentes da Câmara Municipal de São Paulo negaram ter recebido dinheiro da empreiteira.
“Pode ser que usaram esse endereço. Eu não tenho a mínima ideia e não estou sabendo. Alguém usou meu nome”, afirmou Fabiano Alonso, genro do ex-ministro Antonio Carlos Rodrigues e morador do apartamento citado como endereço de duas entregas de R$ 500 mil.
“Se tem uma empresa que não tenho nada é essa daí (Odebrecht). Não tive contato nenhum com esse pessoal. Não posso falar por ele (genro)”, afirmou Rodrigues. “Nunca recebi dinheiro deles e estou disposto a fazer uma acareação.”
O chefe de gabinete do vereador Police Neto (PSD), Fabio Ferreira, afirmou que não recebeu recursos da Odebrecht. “Não sei como esse telefone está nessa planilha. Nunca recebi nenhum valor”, afirmou.
Já o vereador disse ter “confiança absoluta” no assessor, afirmou que não recebeu “nenhum centavo da Odebrecht” e ressaltou que ambos não são investigados. “Ainda que não exista nenhuma investigação ou indício envolvendo a mim ou a Fábio Ferreira, estou à disposição para quaisquer esclarecimentos e espero que eventuais dúvidas sejam resolvidas.”
A assessoria de Gilberto Kassab disse que ele “desconhece os fatos” e “reafirma que as doações recebidas obedeceram à legislação vigente à época”. A Odebrecht afirmou apenas que “tem colaborado de forma eficaz com as autoridades em busca do pleno esclarecimento dos fatos narrados pela empresa e seus ex-executivos”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.