O dia 25 de maio, o presidente do Paraguai, Fernando Lugo, desembarcou no bairro da Bela Vista, região central de São Paulo, para fazer um check-up no Hospital Sírio-Libanês. Foi mais uma das suas visitas à instituição onde se curou de um câncer linfático, descoberto em 2010. Lugo é uma autoridade e como tal desperta a atenção por onde passa. Contudo, é crescente o número de cidadãos comuns, vindos de outros Estados brasileiros e de países dos quatro cantos do planeta, que desembarcam em busca de tratamento de saúde em São Paulo. 

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Corredor da vida: nos arredores da avenida Paulista está grande parte dos melhores hospitais do País

 Nos últimos anos, o chamado turismo de saúde vem se tornando uma importante fonte de ganhos para grandes hospitais e redes de laboratórios baseados na cidade. Anualmente, são 900 mil pacientes, dos quais 50 mil são estrangeiros. Em termos globais, esse nicho movimenta cerca de US$ 60 bilhões por ano, segundo a consultoria Deloitte. Um dos indicativos da sua importância para São Paulo é o volume investido na ampliação da rede hospitalar local.  

Até 2014, serão desembolsados R$ 2,5 bilhões no incremento da infraestrutura do setor, contemplando desde novos e moderníssimos centros cirúrgicos, a compra de equipamentos de última geração e o investimento pesado na chamada hotelaria hospitalar, que transformou instituições como o Albert Einstein e o Sírio-Libanês em verdadeiros cinco-estrelas médicos. 

 

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Com isso, as empresas brasileiras de saúde esperam atingir o status alcançado por competidores da Índia, Tailândia, Costa Rica e de Cingapura que se firmaram como os principais destinos de pacientes internacionais. Mas por que um número cada vez maior de pessoas vem a São Paulo para fazer tratamento de saúde? No caso dos brasileiros, uma das explicações é a existência de diversos centros de excelência na cidade. 

 

O Sírio-Libanês é um dos seis hospitais que receberam esse selo do Ministério da Saúde. A lista inclui, ainda, o Albert Einstein, o Hospital do Coração (Hcor), o Hospital Alemão Oswaldo Cruz e o Hospital Samaritano. “Nossos hospitais não devem nada aos principais centros do mundo”, diz Sérgio Lopez Bento, superintendente-geral de operações do Hospital Samaritano. Foi nele que o médico alagoano Petrúcio Bandeira passou pela segunda cirurgia de transplante de rim. 

 

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Qualidade reconhecida: hospitais paulistas não devem nada aos melhores do mundo,

diz Sérgio Bento, superintendente do Samaritano

 

Depois de sofrer a rejeição do primeiro órgão, doado por um familiar, ele não encontrou nenhum hospital de sua região apto a fazer a operação a partir de rim de pessoa falecida. “Não havia a medicação atualizada para isso”, afirma Bandeira, que precisava se deslocar três vezes por semana de sua cidade, Delmiro Gouveia (AL), para Paulo Afonso (BA). 

 

Para quem mora no Exterior, outro fator de atração é o custo competitivo em relação ao valor cobrado pela medicina privada nos países desenvolvidos. “Uma cirurgia cardíaca que custa cerca de US$ 300 mil nos Estados Unidos não passa de US$ 90 mil por aqui”, afirma André Osmo, superintendente comercial e de marketing do Hospital Sírio-Libanês. Para quem vive em países como Canadá e Reino Unido, a dificuldade é de outra natureza: a longa fila de espera para conseguir atendimento pelo sistema público. 

 

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Hotelaria: o 9 de Julho, de Luiz DeLuca (à esq.), criou um andar para pacientes VIP.

Petrúcio Bandeira veio de Alagoas para se tratar no Samaritano 

 

Foi exatamente para receber os forasteiros que a direção do Oswaldo Cruz criou, no ano passado, uma estrutura especial formada por enfermeiros que dominavam os idiomas inglês, espanhol, alemão e japonês. “Há três anos, notamos um aumento no número de pacientes estrangeiros e procuramos facilitar a vida deles”, afirma Paulo Bastian, superintendente operacional do Oswaldo Cruz. “Desde então, durante a realização da prova de Fórmula 1 na cidade, os dirigentes e outros membros das equipes marcam hemodiálise e check-ups aqui.” 

 

Os integrantes do circo da F-1 são uma pequena porção das pessoas que desembarcam na cidade em busca de tratamento médico. As especialidades mais procuradas são ortopedia, cardiologia, neurologia, odontologia, além de cirurgias plásticas e bariátrica (recomendada para quem sofre de obesidade mórbida). Para os hospitais, o paciente estrangeiro representa mais do que uma simples receita adicional. Com ele, é possível reduzir o atrito com os planos de saúde, cujo valor do reembolso se tornou um campo de batalha. “Além de gastar cerca de 35% a mais, o estrangeiro costuma pagar em dinheiro”, diz Mariana Palha, organizadora do evento Medical Travel Meeting Brazil, que está criando uma ONG para fomentar o turismo médico.

 

Ao investir numa aproximação com essas empresas estrangeiras, o Brasil se credencia para ampliar sua participação também no PIB turístico global. É que os viajantes em busca de tratamento geram, ainda, benefícios que se espalham para além dos corredores assépticos dos estabelecimentos de saúde. Muitos deles vêm acompanhados de um ou mais familiares, que se acomodam na rede hoteleira local. Esses pacientes representam cerca de 18% do movimento internacional nos hotéis de São Paulo e permanecem em média 3,3 dias na capital.

 

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Em conta: cirurgia cardíaca no Brasil custa um terço do cobrado no Exterior,

diz André Osmo, do Sírio-Libanês  

 

A experiência no Exterior mostra que esse é o caminho certo. De acordo com o órgão de fomento do turismo médico de Cingapura, para cada US$ 1 gasto com medicina, o paciente internacional desembolsa outros US$ 8 em outras atividades no país, incluindo restaurantes e locais turísticos. Os maiores contingentes que buscam a medicina brasileira vêm de países como Angola, Espanha, França, Alemanha, Paraguai e Argentina. 

 

Atento aos benefícios gerados pelo turismo médico, o governo pretende ajudar os hospitais privados no fortalecimento do negócio e estabeleceu uma meta de expansão da atividade em 35% ao ano. Os ministérios da Saúde e do Turismo se uniram para elaborar um projeto de lei que cria o visto específico para o turismo médico. A proposta será enviada ao Congresso Nacional em agosto e o objetivo é agilizar o ingresso de estrangeiros no País em busca de tratamento de saúde. O resultado parece certo: menos burocracia e mais negócios para São Paulo, a nova capital do turismo médico.